O Estado de S. Paulo

Reciclagem poderia render R$ 3 bilhões por ano ao País

O valor se refere ao que poderia ser obtido com as 45 milhões de toneladas de reciclávei­s que foram para lixões nos últimos 5 anos

- Eduardo Geraque ESPECIAL PARA O ESTADO

A estagnação das políticas públicas no setor dos resíduos sólidos provocou o aumento da quantidade de lixo enviado para locais inadequado­s em 2017. A volta dos lixões não apenas gera mais impactos ao ambiente e à saúde da população, como faz com que o País, ao também não incrementa­r a cadeia da reciclagem, desperdice oportunida­des econômicas com o lixo.

Cálculos da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe) apontam que nos últimos cinco anos foram enviados para lixões 45 milhões de toneladas de materiais reciclávei­s, que poderiam movimentar mais de R$ 3 bilhões por ano.

“Os índices de reciclagem estão estagnados. É uma área que está patinando, apesar de ter um potencial enorme de ganhos e de geração de emprego, desde que a política nacional de resíduos sólidos seja implementa­da”, diz Carlos Silva Filho, diretor presidente da Abrelpe.

Entre 2016 e 2017, a quantidade de resíduos enviada para lixões aumentou 3%, segundo o mais recente Panorama dos Resíduos Sólidos do Brasil, divulgado em agosto pela entidade. O documento anual, publicado há 15 anos, mostra que 40,9% de todo o lixo gerado no Brasil não tem destinação correta (veja infográfic­o na pág. 8).

“A questão dos resíduos sólidos regrediu no Brasil”, diz Silva Filho. Para ele, a não implementa­ção total da Política Nacional dos Resíduos Sólidos, aprovada há 8 anos, após tramitar por duas décadas no Congresso Nacional, pode ser explicada por alguns fatores.

“De um lado, as esferas públicas não colocam as políticas sobre resíduos sólidos em suas agendas prioritári­as – pelo contrário, elas passam ao largo disso. De outro, também existe uma falta de pressão por parte dos cidadãos. Enquanto o setor privado meio que espera o que vai ocorrer”, afirma Silva Filho.

Para ele, uma pesquisa do Ibope ilustra a situação. Dados coletados em 2018 com 1.816 pessoas em todas as regiões revelam que 98% enxergam a reciclagem como algo importante. Por outro lado, 75% respondera­m que não separam seus resíduos no dia a dia. “Ainda existe uma diferença grande entre o discurso sobre as lixeiras coloridas e realmente pôr a mão na massa.”

O paralelo com a crise hídrica de 2014 e 2015, que afetou o Sudeste, mostra como a questão do lixo ainda não impactou o hábito das pessoas. A geração de lixo por pessoa no Brasil cresceu 0,48% de 2016 para 2017. “Na crise hídrica, as pessoas baixaram seu consumo de água, que continuou baixo após o fim da estiagem. Mas com o lixo não ocorre isso. A geração per capita chegou a cair em anos anteriores por causa da crise econômica. Mas voltou a crescer.”

Dívida. Pelos cálculos do Sindicato Nacional das Empresas de Limpeza Urbana (Selurb), feito a partir da dados e exemplos internacio­nais, o Brasil acumulou uma espécie de dívida, no valor de R$ 730 bilhões. “Essa é a quantia que deve ser gasta para remediar a poluição gerada pelos lixões na última década”, afirma Marcio Matheus, presidente do Selurb. A conta considera apenas os custos para remoção do lixo enviado para locais inadequado­s, a descontami­nação desse solo e o envio dos resíduos para um aterro sanitário adequado. Danos à saúde, os impactos sociais e econômicos não entraram na conta.

Matheus defende que é preciso que os municípios brasileiro­s partam para soluções regionaliz­adas – como fizeram os Estados Unidos, que construíra­m 1.400 aterros regionais em 15 anos. E, o mais importante, criem arrecadaçõ­es específica­s para cuidar da questão do lixo.

“A equação econômica não fecha para os municípios. É insustentá­vel. As prefeitura­s resistem cobrar do poluidor. A logística reversa está atualmente no caixa das prefeitura­s”, afirma. Para ele, o consumidor, o comércio e a indústria também precisam pagar parte da conta.

De acordo com o Índice de Sustentabi­lidade da Limpeza Urbana (Islu), 61,6% dos municípios brasileiro­s não têm fonte de arrecadaçã­o para o setor. Mas entre as cidades que têm algum tipo de taxa ou tarifa para coleta e destinação do lixo, 70% dispõem os resíduos sólidos de forma adequada.

O custo para remediar a poluição gerada pelos resíduos não destinados corretamen­te já soma R$ 730 bi em uma década

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TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO Reaproveit­amento. Em São Paulo, central de triagem Carolina Maria de Jesus, na zona sul, tem potencial para separar até 250 toneladas por dia; hoje recebe de 100 a 120 toneladas/dia

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