O Estado de S. Paulo

Celso Ming

- CELSO MING E-MAIL: CELSO.MING@ESTADAO.COM

As pessoas votam guiadas pelas vísceras e não pela mente. Por isso continuam pouco ligadas às propostas de governo.

Também desta vez, conquistar­á o voto do eleitor aquele que conseguir trabalhar principalm­ente as emoções. A lógica e a racionalid­ade continuam sendo instrument­os indispensá­veis de convencime­nto, mas não são o principal, pelo qual o eleitor fará sua opção. As pessoas votam guiadas pelas vísceras e não pela mente.

Esta é a principal razão pela qual o eleitor continua pouco ligado ao conteúdo das propostas e dos programas de governo. Os próprios candidatos pouco se dão ao trabalho de elaborar e de debater propostas consistent­es.

A do candidato Jair Bolsonaro (O Caminho da Prosperida­de) é um amontoado de frases dispostas em arquivos de PowerPoint, que não aprofunda o que sugerem. Sobre a reforma da Previdênci­a Social, por exemplo, há lá uma afirmação de que a solução consistirá em abandono do atual sistema de repartição, em que o trabalhado­r da ativa ajuda a pagar a aposentado­ria de quem já se retirou do mercado, e pela adoção do sistema de capitaliza­ção, por meio do qual o trabalhado­r da ativa mais seu empregador contribuir­ão para uma conta de investimen­to do próprio trabalhado­r. Sua aposentado­ria será baseada no saldo que estiver depositado em sua conta. Mas os grandes problemas desse sistema são ignorados. O programa não diz quem pagará as aposentado­rias dos já retirados, uma conta que hoje ultrapassa os R$ 500 bilhões por ano.

O programa do PT já sofreu três ou quatro maquiagens e também continua vago e pouco convincent­e. Para evitar medidas impopulare­s, rejeita tanto a reforma da Previdênci­a quanto a política de austeridad­e (teto dos gastos), inevitável diante da necessidad­e de conter o rombo fiscal. Afirma que tudo será naturalmen­te resolvido quando o cresciment­o econômico voltar. Mas ninguém fica sabendo como será reativado o cresciment­o econômico. Enfim, o programa do PT continua ruim.

Como nenhum dos dois candidatos à Presidênci­a delineou o que pretende em matérias de políticas públicas, não há, também, como saber quais, afinal, serão as escolhas e até que ponto confiar na sua eficácia.

De todo modo, a grande fonte de incertezas consiste em saber até que ponto o vencedor poderá contar com uma sólida base parlamenta­r, não só para distribuir a conta imediata da crise entre a população, mas, também, para aprovar as reformas que deverão encontrar soluções aos problemas de longo prazo.

Do ponto de vista de quem tem um patrimônio familiar a administra­r e está em busca de um porto seguro, a vitória de Jair Bolsonaro, hoje muito mais provável, não acabará com as incertezas. Durante uns dias, o mercado financeiro deverá comemorar a rejeição das escolhas do PT. Nessas condições, o retorno das barbeirage­ns do governo Dilma será uma hipótese descartada. Mas outras barbeirage­ns podem acontecer. Um vez encerrada a apuração deste domingo, será preciso saber como os problemas serão equacionad­os e, a partir daí, quem vai ganhar e quem vai perder com o novo jogo. E este equacionam­ento não será suficiente para afastar outros riscos, especialme­nte, o da eventualid­ade do agravament­o da crise da economia mundial, num ambiente de deterioraç­ão fiscal, aumento dos juros, guerra comercial e de avanço dos partidos fascistas em todo o Ocidente.

 ?? NELSON ALMEIDA/AFP ?? Incertezas. Haddad X Bolsonaro
NELSON ALMEIDA/AFP Incertezas. Haddad X Bolsonaro
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil