O Estado de S. Paulo

Polêmicos, três filhos replicam o estilo do pai

Carlos, Flávio e Eduardo não externavam linha política radical nem eram religiosos na juventude

- Constança Rezende Roberta Pennafort / RIO

Tal pai, tal filho. As bandeiras e comportame­nto de Jair Bolsonaro (PSL) serão replicados no Congresso por Flávio Bolsonaro, eleito senador pelo Rio, e Eduardo Bolsonaro, reeleito deputado por São Paulo. Iniciados cedo pelo pai na política, garantirão a continuida­de do estilo do pai no Legislativ­o, onde o presidente eleito ficou por 27 anos. Terão a legitimida­de de quem alcançou votações expressiva­s, alavancada­s pelos discursos que mimetizam o do mentor.

Polêmicos como ele – e como o irmão Carlos, vereador no Rio –, com histórico de declaraçõe­s controvert­idas e forte participaç­ão nas redes sociais, Flávio, de 37 anos, e Eduardo, de 34, ganharão novo papel no governo Bolsonaro, para além de suas funções parlamenta­res. Terão a função de auxiliá-lo em suas pautas e de serem seus conselheir­os; por outro lado, precisarão moderar discursos e ações.

Na corrida presidenci­al, o mais chegado ao pai, e único que não disputou eleição este ano, Carlos, o filho do meio, de 35 anos, seu vizinho na Barra da Tijuca, no Rio, foi o que mais participou. Estava com Bolsonaro quando ele foi ferido a faca em Juiz de Fora (MG), em setembro. Para isso, tirou licença não remunerada da Câmara de Vereadores do Rio em agosto e, desde então, não voltou à Casa.

Flávio e Eduardo cuidaram mais de suas próprias candidatur­as, e marcaram presença em sessões na Assembleia Legislativ­a do Rio (Alerj) e na Câmara dos Deputados. Os três são filhos de Rogéria Bolsonaro, a primeira mulher do presidenci­ável, com quem, segundo ela, o presidente eleito mantém “ótima relação até hoje, de respeito e carinho”.

A personalid­ade dos três difere. Carlos, vereador eleito aos 17 anos (foi o mais jovem da história do Brasil), é considerad­o “pavio curto” por interlocut­ores da campanha e o menos vocacionad­o à política. Sua atuação como vereador é tímida e ele não gosta de dar entrevista­s.

Único casado, pai de duas filhas, Flávio, que já se candidatou a prefeito do Rio, é o mais “moderado e progressis­ta” – embora já tenha louvado o período da ditadura militar – e também o mais afastado do pai, contam interlocut­ores. Teria embates com Bolsonaro sobre questões ideológica­s. Costuma ter vida política independen­te do pai. Fez campanha, por exemplo, ao lado do candidato ao governo do Rio Wilson Witzel (PSC), ainda que Bolsonaro tivesse orientado que nenhum postulante ao cargo tivesse apoio.

Eduardo (eleito deputado federal com a maior votação já registrada, 1,8 milhão de votos) é tido como o mais propenso a ser o herdeiro político de Bolsonaro, e também o mais astuto.

Classe média. Alunos de um colégio de militares na Tijuca, bairro residencia­l e conservado­r da zona norte do Rio, moradores de um prédio numa rua tradiciona­l do bairro e formados em direito (Flávio e Eduardo) e ciências aeronáutic­as (Carlos), os três cresceram num ambiente típico de classe média. Tinham interesses corriqueir­os: churrascos, futebol com amigos, surfe, shows de rock e namoradas.

Amigos de juventude contaram que eram rapazes simples, que não externavam posicionam­entos políticos radicais, tampouco demonstrav­am ser muito religiosos. Entraram na vida partidária instados pelo pai, há quase 30 anos no Legislativ­o, e passaram a reproduzir sua retórica, calcada no militarism­o e no slogan “o Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”.

Hoje, as controvérs­ias se acumulam. Em uma de suas agendas de campanha, Flávio percorreu as ruas de Nilópolis, na Baixada Fluminense, acompanhad­o de nomes ligados ao jogo do bicho. Também teve ajuda, em suas caminhadas, dos policiais Alex e Alan Rodrigues de Oliveira, presos na Operação Quarto Elemento, que investiga uma suposta quadrilha de policiais especializ­ada em extorsões.

Eduardo afirmou num vídeo que só era preciso “um cabo e um soldado” para fechar o Supremo Tribunal Federal, gerando forte mal-estar na campanha. O pai reagiu dizendo que repreendeu “o garoto” e que “quem fala isso tem que buscar um psiquiatra”. Em abril, Eduardo foi denunciado pela Procurador­ia Geral da República por ter ameaçado a jornalista Patricia Lélis, ex-namorada por quem foi criticado em redes sociais. “Se você falar mais alguma coisa eu acabo com sua vida”, disse ele, em mensagens de telefone.

Por sua vez, Carlos compartilh­ou, em setembro, imagem de uma pessoa torturada com um saco plástico na cabeça, tendo no peito a inscrição “ele não”, referência ao movimento de mulheres contra Bolsonaro. No passado, debochou de indígenas e defendeu o fim do Estatuto da Criança e do Adolescent­e. Outros presidente­s já tiveram filhos com mandatos simultâneo­s ao presidenci­al, como José Sarney (19851990) e Getúlio Vargas (1951-1954). Bolsonaro, caso se eleja, será o primeiro com a prole nas duas casas legislativ­as federais.

O cientista Ricardo Ismael, da PUC, não vê indícios de que os filhos terão papel de destaque na nova gestão. “Bolsonaro já declarou que eles não serão ministros. Se eleito, ele não terá maioria na Câmara nem no Senado, e os filhos vão ajudá-lo a formar base, como o pai já está fazendo, com o DEM”, avalia.

O cientista político João Trajano Sento-Sé, da Universida­de do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), vê no fato de Bolsonaro ter filhos na política uma parte da tradição brasileira. “A singularid­ade deste caso é que os filhos seguem a trajetória do pai ocupando mais ou menos a mesma persona pública”, analisa. “Mas eles não têm luz própria.”

Procurados pelo Estado, os filhos de Bolsonaro não quiseram se pronunciar.

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Em família.O vereador Carlos (E), o senador eleito Flávio e o deputado federal Eduardo deverão aconselhar o pai

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