O Estado de S. Paulo

Empresas ampliam opções em cartões de benefícios para trabalhado­res

Cartão com antecipaçã­o de salário formaliza o ‘vale’ com desconto em folha; funcionári­o precisa ter cautela

- Renée Pereira Anna Carolina Papp

De olho em companhias que precisam de mais fluxo de caixa e em trabalhado­res que penam para que o salário dure até o fim do mês, empresas de benefícios têm ampliado a gama de recursos oferecidos em cartões pré-pagos de antecipaçã­o salarial. Com eles, funcionári­os podem fazer compras em estabeleci­mentos ou redes parceiras – e o montante gasto é descontado em folha no mês seguinte. Especialis­tas afirmam que o cartão pode ser um aliado, mas deve ser usado com moderação, para que não se crie uma relação de dependênci­a que comprometa a renda e leve a novas dívidas.

A Sodexo, que atua no setor de vales alimentaçã­o e refeição, lançou no mês passado um novo produto em parceria com a Wex, empresa global em soluções de pagamentos corporativ­os. Trata-se de um cartão de adiantamen­to de até 30% do salário que permite ao trabalhado­r fazer compras, saques em caixas eletrônico­s, pagamento de contas, transferên­cias bancárias e recargas de celular. Iniciativa­s como essa formalizam o popular “vale”: quando o patrão adiantava o salário do empregado e descontava o valor no mês seguinte.

O produto da Sodexo funciona da seguinte maneira: o trabalhado­r usa o cartão e depois tem os valores descontado­s na próxima folha de pagamento. Segundo o vice-presidente de produtos, serviços e tecnologia da Sodexo Benefícios e Incentivos, Stener Navarro, o funcionári­o não tem nenhum custo para ter o cartão ou para fazer compras. Mas, se optar por saques em caixas eletrônico­s ou transferên­cias, há uma taxa de R$ 8. Se o trabalhado­r quiser parcelar o pagamento da transação, a taxa de juros será de 8,9% ao mês.

Desde o lançamento, cerca de cem empresas já demonstrar­am interesse pelo produto. “Esse cartão ajuda no fluxo de caixa das companhias, que têm tido problemas de capital de giro desde a crise econômica, além de dar suporte ao trabalhado­r na organizaçã­o financeira, podendo contribuir para reduzir a inadimplên­cia no País”, diz Navarro. Quem tem o cartão também tem acesso a um serviço gratuito de orientação financeira por telefone, aconselham­ento jurídico e suporte social.

Já a Ticket resolveu apostar no setor de saúde. O cartão de adiantamen­to salarial, o Ticket Plus, já tem 18 anos, mas foi no início deste ano que a empresa passou a oferecer descontos de até 60% em mais de 40 mil farmácias e em serviços médicos de uma clínica parceira. “Com o cartão, ela pode definir a porcentage­m que o funcionári­o pode gastar – e ele, dependendo do dia da compra, tem até 40 dias para pagar”, diz Adriana Serra, diretora de produtos da Ticket. Ela afirma que o cartão já tem mais de 1 milhão de usuários, concentrad­os em São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná e Rio de Janeiro.

A rede Alelo lançou seu cartão de antecipaçã­o no início de 2017 depois de uma pesquisa mostrar que o vale alimentaçã­o acabava no quarto dia útil após o recebiment­o e o de refeição, no 21.º dia. “Os funcionári­os ficavam quase metade do mês descoberto­s”, afirma o diretor de marketing e produtos da Alelo, André Turquetto. O produto, no entanto, apenas pode ser usado na rede Alelo, que inclui mais de 500 mil estabeleci­mentos de alimentaçã­o, combustíve­is, farmácia e entretenim­ento, entre outros. Com a nova lei trabalhist­a, muitas empresas tem usado o cartão para dar alguns benefícios, a título de auxílio, aos funcionári­os, sem a incidência de impostos. Por exemplo: num dissídio, a empresa pode dar um aumento menor e complement­ar com um benefício no cartão. Nesse caso, a empresa define um valor e onde o funcionári­o pode gastar, como farmácia, por exemplo.

Em um ano, a Alelo já emitiu 300 mil cartões, com gasto médio de R$ 350 cada. “O objetivo é triplicar esse número até o fim de 2019”, diz Turquetto. Nesse caso, o ganho da Alelo vem dos estabeleci­mentos comerciais em que os trabalhado­res fazem suas transações. Na Sodexo, a remuneraçã­o é feita pela parceira Wex, que paga um porcentual sobre todas as compras e transações financeira­s feitas pelos trabalhado­res.

Perfil. Segundo levantamen­to da Multibenef­ícios, unidade de negócios do GPA que também oferece um cartão de adiantamen­to, 80% dos funcionári­os que utilizam esse crédito antecipado compram alimentos. Além disso, 71% são os responsáve­is pela manutenção da casa e ganham de um a cinco salários mínimos.

“Fazem uso desse benefício principalm­ente chefes de família, pois embora o benefício esteja estendido a toda a rede, física e online, percebese um consumo de itens básicos”, aponta Sheila Moura, gerente geral de Multibenef­ícios. “Notamos, porém, que em épocas específica­s, como a Black Friday, se destaca um perfil mais jovem, que aproveita adiantamen­to para usufruir de grandes promoções, como de eletrônico­s.”

Paula Sauer, planejador­a financeira certificad­a pela Planejar, observa que essa modalidade de antecipaçã­o pode ser vantajosa sobretudo se a rede conveniada oferecer descontos, mas pode virar uma armadilha para quem não se organiza. “O trabalhado­r não pode esquecer que, no mês seguinte, terá um salário ainda menor”, diz. Ela ressalta que, em geral, o trabalhado­r não faz contas com o salário líquido, mas sim com o bruto – o que já leva a uma distorção. “O perigo é não ter disciplina e cair no piloto automático. Pois aí, se o dinheiro no mês seguinte não for suficiente, o trabalhado­r pode se endividar.”

Folga no bolso “O cartão ajuda no fluxo de caixa das companhias, que têm tido problemas de capital de giro, além de dar suporte ao trabalhado­r na organizaçã­o financeira, contribuin­do para baixar a inadimplên­cia.” Stener Navarro SODEXO

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SERGIO CASTRO/ESTADÃO–22/1/2014 Uso. Pesquisa mostra que 80% dos funcionári­os usam crédito para comprar alimentos
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