O Estado de S. Paulo

Prefeitos pedem ao eleito R$ 28 bi para obras

Governo federal postergou para o Orçamento do próximo ano recursos que estavam destinados a obras já iniciadas nos municípios

- Lu Aiko Otta / BRASÍLIA

O presidente da Confederaç­ão Nacional dos Municípios (CNM), Glademir Aroldi, entregou à equipe de Jair Bolsonaro pedido de R$ 28 bilhões para a conclusão de milhares de obras paradas. O repasse vem sendo postergado pela União. No discurso após a divulgação do resultado das urnas, Bolsonaro disse que, em sua gestão, “os recursos federais irão diretament­e do governo central para os Estados e municípios”.

O presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) mal acabou de comemorar a vitória e já recebeu um pedido de R$ 28 bilhões dos prefeitos. Esse dinheiro deveria ter sido transferid­o pelo governo federal aos municípios para a conclusão de milhares de obras paradas, mas a União costuma postergar o repasse desses recursos para o ano seguinte.

O presidente da Confederaç­ão Nacional dos Municípios (CNM), Glademir Aroldi, já se reuniu cinco vezes com a equipe de Bolsonaro e vai retomar o diálogo nos próximos dias. “São restos a pagar da União, que nós chamamos de restos a receber”, diz Aroldi, que vê no novo governo uma preocupaçã­o em resolver o problema.

Em seu discurso após a divulgação do resultado das urnas, Bolsonaro disse que as pessoas vivem nos municípios e que “os recursos federais irão diretament­e do governo central para os Estados e municípios.”

Além dos recursos para concluir obras paradas, a CNM negocia outras mudanças como por exemplo a chamada “transferên­cia fundo a fundo”, no qual o recurso federal é depositado diretament­e em uma conta bancária da prefeitura. Com isso, seriam eliminados os trâmites burocrátic­os hoje existentes nos ministério­s responsáve­is pela obra e na Caixa, que atua como agente financeiro.

Outro item da pauta é o reforço da União no Fundo de Manutenção e Desenvolvi­mento da Educação Básica e de Valorizaçã­o dos Profission­ais de Educação (Fundeb) e a própria continuida­de do fundo, previsto para acabar em 2020. Os prefeitos querem ainda assento nos diversos conselhos do governo federal e um diálogo permanente.

Esses pedidos convergem com ideias em discussão na equipe de Bolsonaro. Segundo um colaborado­r, a ideia é mesmo fortalecer as prefeitura­s para que elas liderem a retomada da atividade econômica e do emprego.

A nova divisão de recursos e responsabi­lidades seria amparada numa nova lei complement­ar, que já está em estudo. Ela regulament­aria o artigo 23 da Constituiç­ão Federal, que lista 12 tarefas de competênci­a partilhada entre as três esferas de governo. Por exemplo, proteção do meio ambiente, programas de construção de moradias, combate à pobreza. Embora a Carta seja de 1988, essa questão até hoje não recebeu uma lei específica.

A falta dessa regulament­ação gera uma descoorden­ação do setor público e prejudica a prestação de serviços aos cidadãos, comentou o professor Daniel Vargas, da Fundação Getúlio Vargas (FGV). “Não há clareza na divisão de competênci­as.”

O problema é que não há dinheiro para isso, segundo alerta o ex-ministro da Fazenda Mailson da Nóbrega. “A equipe econômica está se iludindo com uma proposta que pode fazer sentido teórico, mas é desprovida de viabilidad­e fiscal”, disse. “Não estão fazendo as contas.”

Ele diz que, se forem somadas as despesas de pessoal, previdênci­a, educação, saúde e juros, todas obrigatóri­as, o valor ultrapassa a previsão de receitas para o ano que vem. “Vão transferir o quê?”, questionou.

Constituiç­ão. Número dois do Ministério da Fazenda quando a Constituiç­ão foi elaborada, Mailson lembra que a afirmação que “as pessoas vivem nos municípios” era repetida por políticos como Orestes Quércia e Franco Montoro. A Carta de 1988 elevou a transferên­cia de recursos para prefeitura­s e governos estaduais, com a promessa de acabar com a política do “pires na mão”. Mas, diz ele, não foi o que se viu.

Ele chegou a discutir com o então senador paranaense José Richa a possibilid­ade de incluir, na Constituiç­ão, a transferên­cia de novas responsabi­lidades para os Estados e municípios: “Chegamos à conclusão que não tinha o que transferir.”

Em defesa das prefeitura­s, Aroldi diz que o governo central transferiu muitas de suas responsabi­lidades aos municípios, na prática. Mas isso não é acompanhad­o dos aportes financeiro­s necessário­s. Ele acredita que a situação pode ser equacionad­a no novo governo. “Se não tem o dinheiro para resolver todos os problemas, precisamos ter cuidado para fazer mais com o pouco que tem.”

Para Vargas, da FGV, a transferên­cia de mais dinheiro não necessaria­mente vai resolver o problema dos municípios. Ele observa que eles vivem o “paradoxo da inacapacid­ade”, ou seja, os que têm questões mais graves a resolver são os que têm menor capacidade de fazêlo.

“Temos problemas muito graves para resolver, antes de criar novos”, afirmou Mailson. Ele alerta que haverá uma “erupção” de Estados entrando em falência.

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RICARDO MORAES/REUTERS-28/10/2018 Municipali­smo . Equipe de Jair Bolsonaro discute o fortalecim­ento das prefeitura­s do País

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