O Estado de S. Paulo

Definidas as primeiras viagens

Últimos presidente­s eleitos mantiveram tradição de viajar inicialmen­te à Argentina; sinais indicam que Mercosul deixa de ser prioridade

- / CONSTANÇA REZENDE, LUIZ RAATZ, LUCIANA DYNIEWICZ e LU AIKO OTTA

Chile, EUA e Israel serão os primeiros países a ser visitados por Jair Bolsonaro após assumir a Presidênci­a, segundo Onyx Lorenzoni.

O presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) escolheu Chile, EUA e Israel como os destinos de sua primeira viagem internacio­nal. Mesmo sem ter anunciado o futuro chanceler, o roteiro indica a preferênci­a por parceiros comerciais que compartilh­am sua visão de mundo. Bolsonaro prometeu durante a campanha adotar uma política externa não ideológica.

O Chile, governado pelo empresário Sebastián Piñera, será o primeiro destino do presidente eleito. A escolha rompe uma tradição recente de idas dos chefes de Estado à Argentina, o principal parceiro do Brasil no Mercosul, visitado por Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva. Michel Temer foi à China após herdar o cargo de Dilma, enquanto Fernando Henrique Cardoso visitou o Uruguai em 1995 e Portugal em 1998.

Segundo o deputado federal Onyx Lorenzoni (DEM-RS), que deverá ser o ministro da Casa Civil, o país transandin­o foi escolhido por ser “a grande referência latino-americana”.

“Quem deu certo nos últimos 20 anos, aumentou a renda de sua população, tem boa educação, gera tecnologia e hoje comerciali­za com o mundo todo? O Chile. Então, tem que ter humildade de ver esse exemplo com atenção”, disse. O economista Paulo Guedes, cotado como ministro da Fazenda, lecionou na Universida­de do Chile durante a ditadura de Augusto Pinochet, que concretizo­u privatizaç­ões e mudanças radicais no sistema de previdênci­a chileno. Os EUA são uma escolha natural, pela proximidad­e do presidente eleito com a linha política de Donald Trump (mais informaçõe­s nesta página). A relação de Bolsonaro com Israel ficou mais próxima desde que se tornou evangélico – ele tem entre seus apoiadores empresário­s da comunidade judaica.

Para o diplomata Rubens Barbosa, ex-embaixador em Washington, a escolha dos destinos de Bolsonaro é natural. “A gente vai ter que se acostumar no Brasil que na política brasileira a gente tem um grupo que é de direita. A gente nunca teve no Brasil um grupo que se assume de direita como ideologia, tanto na política interna, externa, nos costumes e na economia”, disse ao Estado. “Então, dentro do que ele vem pregando, é o normal.”

Na noite de domingo, Guedes disse a uma repórter do jornal argentino Clarín que o Mercosul não estava em primeiro plano. “Não, a Argentina não é uma prioridade. O Mercosul também não é prioridade. É isso que você queria ouvir? Você está vendo que esse meu estilo combina com o do presidente, não é o que você quer ouvir, é a verdade. A gente não está preocupado em te agradar”, afirmou, exaltado.

Ontem, Bolsonaro comentou o episódio. “Ninguém quer implodir o Mercosul, mas queremos dar a devida estatura para ele. Queremos nos livrar de algumas amarras do Mercosul”, afirmou em entrevista à TV Record, ao ser questionad­o sobre o tom de Guedes.

A amarra imposta pelo formato do Mercosul era uma crítica feita pelo senador José Serra (PSDB-SP) antes de se tornar chanceler do governo de Michel Temer. Serra defendia que o bloco sofresse uma espécie de “downgrade” e deixasse de ser uma união aduaneira, como é hoje, para ser uma zona de livre comércio.

O governo argentino recebeu com cautela a escolha do Chile como primeiro destino de Bolsonaro. “Precisamos esperar que os ministros designados assumam seus cargos, comecem a trabalhar, tomem medidas e façam declaraçõe­s oficiais”, disse ao Estado o ministro de Produção e Trabalho da Argentina, Danta Sica. Questionad­o se o Chile poderia roubar o protagonis­mo da Argentina como parceira política comercial histórica, Sica respondeu “acho que não”.

“Ninguém quer implodir o Mercosul, mas queremos dar a devida estatura para ele, está supervalor­izado. Queremos nos livrar de algumas amarras do Mercosul.” Jair Bolsonaro

PRESIDENTE DA REPÚBLICA ELEITO

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CARLO ALLEGRI/REUTERS–27/9/2018 Anfitrião. Conservado­r Sebastián Piñera receberá Bolsonaro, a quem elogiou na campanha
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