O Estado de S. Paulo

‘ECONOMIA ESTÁ PRONTA PARA UMA RETOMADA’

- SONIA RACY PAULO GIANDALIA / ESTADÃO

O governo Bolsonaro corre o risco de dar certo, na opinião de Luiz Fernando Figueiredo, ex-BC e atual gestor da Mauá. “Nossa economia, por ter sofrido tanto durante tanto tempo, está, do ponto de vista cíclico, em um ponto favorável à retomada”, observou ontem o economista, mostrandos­e bastante otimista em relação ao futuro. Na sua opinião, alguns fatores ajudam nessa percepção: o nível de ociosidade das empresas é grande – elas reduziram fortemente os seus custos e sua alavancage­m – e a inflação tem-se mantido baixa, bem como a taxa de juros.

O que o País precisa agora, diz Figueiredo, é da retomada de confiança dos agentes de mercado e dos empresário­s. “Dada a direção correta pelo governo, a volta da confiança pode gerar cresciment­o de 3% ou 3,5%.” Assim, ele acredita que o mercado pode se surpreende­r com uma recuperaçã­o mais rápida do que supõe. Cotado para trabalhar no novo governo – fato de que nega ter conhecimen­to – Figueiredo conversou ontem com a coluna.

• O que você entendeu dos primeiros sinais sobre a economia dados por Bolsonaro?

Ele colocou, na sua fala, a pacificaçã­o – o que é importante em um país muito dividido. Depois, com a Constituiç­ão na mão, enfatizou ser seu escravo, usando muito a palavra democracia. Terceiro, ponderou que o Estado tem que dar um passo pra trás, rumo a um Estado menor – e assim o País poderá dar alguns passos à frente. Ele expôs sua maneira de pensar e citou até Churchill, que foi um grande liberal e um dos maiores líderes da democracia no mundo.

• Neste último mês de campanha houve sinalizaçõ­es confusas, dele e da equipe, sobre privatizaç­ão e outros dogmas liberais. Ruídos?

Uma campanha tem vários ingredient­es que acabam nos deixando confusos, uma questão de retórica da própria eleição. E, quando muitos falam, as chances do contraditó­rio são grandes. Houve um momento em que Bolsonaro teve que pedir silêncio. Agora, com calma, eles vão colocando em prática o que pensam.

• A fala de Haddad anteontem, bastante criticada pela iniciativa privada – incentivan­do o ‘nós contra eles’ – terá qual efeito no Congresso?

Do PT nada se deve esperar, até porque coisa boa do PT a gente não deveria esperar mesmo. Se não fizeram até hoje, não será depois de perderem a eleição que vão fazer. Por outro lado, o presidente eleito está desenvolve­ndo um trabalho forte para gerar base política. Já declarou que o PSL não presidirá a Câmara. Está fazendo o oposto do que o PT fez ao querer sempre liderar.

• A agenda das reformas está posta. É necessário incluir a independên­cia do BC agora?

Acho que sim. Muita gente diz que isso na prática já acontece. Mas, toda vez que tem alguma encrenca, as incertezas aparecem, abrindo espaço para se duvidar se o BC vai tomar decisão técnica. E acho fácil passar, dá para ser antes da posse.

• Economista, gestor de fundos, passagem pelo BC. Pela sua experiênci­a, acha possível fazer o que eles estão pretendend­o? Ajuste fiscal?

Paulo Guedes diz que vai tentar zerar o déficit em um ano, eu acho uma boa meta. Pode não chegar a ser completame­nte realizada, mas mostra um caminho. Se as coisas andarem muito bem, eles vão surpreende­r.

• A reforma da Previdênci­a pode sair antes do fim do governo Temer?

Acho difícil porque, para tanto, teria de ser encampada, em grande medida, a reforma já proposta. E também, se ela não passar, será uma derrota antes de começar o governo Bolsonaro. O que é mais provável é que, a partir da reforma de Temer, eles preparem algo diferente usando um pouco do tempo gasto na reforma do Temer. A modificaçã­o seria feita no Senado e voltaria à Câmara modificada. É um caminho. Mas é importante que as coisas não sejam atropelada­s. No Brasil, por conta de cinco anos de recessão, enorme desemprego e aflição gigante quanto ao poder de voto do PT, está todo mundo querendo que as coisas aconteçam amanhã. Elas precisam ser feitas com calma para que realmente aconteçam. É como o meu filho: ele quer sempre acabar a prova em primeiro. Mas aí eu digo: se você acaba em primeiro, a sua prova com certeza não será a melhor.

• Quais os pontos críticos?

Os principais são três. Primeiro: eles precisam fazer uma agenda dos primeiros 100 dias do governo. De novo, não precisa ser amanhã, mas ao longo dessa próxima semana seria bom que viesse uma agenda, até com um esboço minimalist­a, mostrando quais são as prioridade­s. Para quê? Dar uma direção para os agentes. Para aquele empresário que está pensando em investir ou não, para quem estiver pensando se vai trocar de casa, trocar de carro. Segundo ponto: eles precisam manter uma parte da equipe econômica. A equipe do governo Temer foi extraordin­ária. Isso ajudaria muito aqueles que entram a entender de maneira mais rápida a realidade que os espera. Não precisam ser todos, mas alguns elementos chaves. Eu diria ser muito importante manter o próprio Ilan Goldfajn na presidênci­a do Banco Central.

• Por quê?

Está indo tudo muito bem, se puder não mudar seria muito legal. O Mansueto Almeida, a Ana Paula Vescovi, o Marcelo Caetano, o próprio Jorge Rachid. O terceiro ponto importante é a base de apoio no Congresso – que, pelo que se sabe, não será tão difícil montar.

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