Entidades condenam ameaça de Bolsonaro de retaliar jornais
Presidente eleito falou em cortar verba pública de veículos de imprensa que se ‘comportarem de maneira indigna’
A Associação Nacional de Jornais (ANJ) e a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) criticaram declarações do presidente eleito, Jair Bolsonaro, com ataques à Folha de S.Paulo. Em entrevista anteontem ao Jornal Nacional, da TV Globo, Bolsonaro ameaçou retirar verbas públicas de veículos de imprensa que, na sua avaliação, se comportarem de maneira “indigna”, citando a Folha como exemplo. Ele acusa o jornal de propagar notícias falsas a seu respeito.
“Eventuais inconformismos com noticiário de veículos de comunicação não podem ser confundidos com inaceitáveis retaliações a jornais por meio de uso de verbas publicitárias oficiais. Investimentos em publicidade por governos, como as demais verbas públicas, devem seguir expressamente critérios técnicos, e nunca políticos ou partidários”, diz nota assinada por Marcelo Rech, presidente da ANJ. Na sequência, ele diz esperar que “o princípio da liberdade de imprensa, saudavelmente afirmado pelo presidente eleito em seu discurso após a vitória nas urnas, se manifeste na prática, o que inclui o respeito a opiniões divergentes e à independência editorial”.
Já a Abraji disse receber com apreensão as declarações. “O respeito à Constituição – à qual o presidente fará um juramento solene de obediência no dia 1.º de janeiro de 2019 – não é pleno quando a imprensa se converte em objeto de ataques e de ameaças”, diz a entidade em nota.
O texto afirma que “fiscalizar o poder público – e, em particular, as ações do presidente – sempre foi e seguirá sendo função inerente ao jornalismo, exercida em nome do interesse público”. “Zelar por essa função é missão primordial da Abraji, assim como deve ser objeto de zelo de todo governo democrático.”
Anúncios. Na entrevista dada ao Jornal Nacional, Bolsonaro prometeu respeitar a liberdade de imprensa, mas disse que o repasse de verbas da União seria algo diferente. “Sou totalmente favorável à liberdade de imprensa, mas temos a questão da propaganda oficial de governo, que é outra coisa”, disse Bolsonaro. “Não quero que (a Folha) acabe. Mas, no que depender de mim, imprensa que se comportar dessa maneira indigna não terá recursos do governo federal. Por si só, esse jornal se acabou.”
Em outra iniciativa, a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) chamou a atenção para mensagem distribuída por um assessor da campanha de Bolsonaro com ataques a jornalistas.
Investigação. A Procuradoria da República no Distrito Federal abriu investigação por improbidade para apurar a contratação pelo gabinete de Bolsonaro na Câmara da ex-funcionária Walderice Santos da Conceição.
Conduzida sob sigilo desde setembro, a investigação busca saber se a mulher, ex-secretária parlamentar de Bolsonaro, recebia salário da Câmara e trabalhava em uma loja de açaí na Vila Histórica de Mambucaba, em Angra dos Reis (RJ), onde Bolsonaro tem casa de veraneio. A informação foi publicada pela Folha, e é base das críticas que o presidente eleito tem feito contra o jornal.
Walderice era funcionária no gabinete de Bolsonaro desde 2003 e recebia R$ 1.416,33 antes de pedir demissão, após a publicação. Ele nega que Walderice tenha sido funcionária fantasma e diz que ela trabalhava atendendo demandas da região.