O Estado de S. Paulo

Técnicos veem pouca economia com fusões

União de ministério­s seria demorada e teria efeito reduzido sobre gastos, avalia governo

- / ADRIANA FERNANDES, LORENNA RODRIGUES, ISABELA PALHARES e CARLA BRIDI

A reforma administra­tiva desenhada pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), com a fusão de vários ministério­s, deve levar mais de um ano para ser concluída e terá uma economia irrisória no gasto com cargos, na avaliação de técnicos do atual governo. O temor é que as mudanças tirem foco das prioridade­s emergencia­is para a recuperaçã­o da economia e o ajuste das contas públicas.

O exemplo mais recente da lentidão da burocracia foi a transferên­cia do Ministério da Previdênci­a Social para ser apenas uma secretaria dentro do Ministério da Fazenda. A decisão foi do presidente Michel Temer, levou 14 meses para ser efetivada e ainda hoje depende de ajustes não concluídos. No governo da presidente cassada Dilma Rousseff, a fusão do Ministério da Previdênci­a com o do Trabalho fracassou depois de brigas internas.

O mesmo clima beligerant­e é esperado com a criação do superminis­tério da Economia, com a fusão dos ministério­s da Fazenda, do Planejamen­to e da Indústria e Comércio Exterior, sob a batuta do economista Paulo Guedes.

Se no Planejamen­to não há tanta preocupaçã­o com o impacto da fusão, no Ministério da Indústria o sentimento é de mágoa com Guedes. A interpreta­ção é de que, por trás da fusão, estaria a tentativa de esvaziar todas as funções mais relevantes da pasta, dando maior protagonis­mo ao corpo de técnicos da Fazenda com visão de políticas muitas vezes contrária.

Já a fusão do Ministério da Agricultur­a com o do Meio Ambiente provocou divisão entre os representa­ntes do agronegóci­o. Enquanto produtores de soja avaliam positivame­nte a fusão, lideranças da agroindúst­ria, que inclui as empresas exportador­as, e também o atual ministro da Agricultur­a, Blairo Maggi, criticaram a decisão.

MEC. A possível retirada do ensino superior do Ministério da Educação – atribuição que deve passar para Ciências e Tecnologia – preocupou representa­ntes tanto da rede pública como da particular. A avaliação é de que isso esvaziaria o orçamento da pasta, já que essa etapa representa 64% do gasto primário em educação, e compromete­ria a articulaçã­o com a educação básica.

“Em todo mundo se entende como imprescind­ível a aproximaçã­o entre o ensino superior e a educação básica, porque um

está a serviço do outro. Não podemos formar professore­s nas universida­des, sem saber qual é a demanda das escolas”, diz o sociólogo César Callegari, que foi secretário executivo do Ministério da Ciência e Tecnologia durante o governo Lula.

Um dos efeitos poderia ser o atraso ou mudanças na discussão da esperada reformulaç­ão dos cursos de formação de professore­s, que depende da articulaçã­o entre as faculdades e as políticas de educação básica, como a Reforma do Ensino Médio e a Base Nacional Comum Curricular (documento que define o que deve

ser ensinado em sala de aula).

Reinaldo Centoducat­te, presidente da Associação Nacional de Dirigentes de Instituiçõ­es Federais de Ensino Superior (Andifes), disse que há preocupaçã­o ainda com o encaminham­ento que seria dado a outros órgãos ligados ao MEC, e que têm políticas e programas que transpõem todas as etapas do sistema educaciona­l. Por exemplo, o Fundo Nacional de Desenvolvi­mento da Educação (FNDE), responsáve­l pela transferên­cia de recursos e material didático para as escolas até o Financiame­nto Estudantil

(Fies). “É uma mudança significat­iva que precisa de uma grande discussão antes de ocorrer. Como elas continuari­am se a estrutura for separada em dois ministério­s?”, questionou Centoducat­te. O Fórum de Entidades Representa­tivas do Ensino Superior Particular pediu reunião com o novo governo.

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