O Estado de S. Paulo

Elza Soares, um tornado direto do ‘planeta fome’

‘My Name is Now’, da diretora Elizabete Martins, prefere a linguagem alegórica à realista para tratar da cantora que fez sua própria revolução

- Luiz Zanin Oricchio

Em My Name is Now – Elza Soares, a diretora mineira Elizabete Martins tem o desafio de mostrar ao público alguém que dispensa apresentaç­ões. Elza, a grande cantora, sambista, companheir­a de Mané Garrincha, musa de tantas gerações. Elza, que atravessou tragédias e soube, como poucas, se reinventar e reencontra­r a alegria, do outro lado do rio.

Essa é a Elza que aparece no filme, num estudo de rosto, sofrido, marcante, marcado, porém tão expressivo. Elza que, apresentan­do-se no programa de Ary Barroso, e indagada pelo ácido apresentad­or de onde viera, respondeu, de bate-pronto: “Venho do país da fome”.

Essa mulher, que conheceu tantas vitórias e derrotas, é associada ao mito do Fênix, ave que renasce das próprias cinzas. Essa referência mítica dá o tom a um filme que prefere a linguagem alegórica à realista. Evita assim o que seria uma redundânci­a na caracteriz­ação da personagem pública que Elza, desde o início da carreira, nunca deixou de ser.

A cantora magnífica, que usava o gogó e empunhava o microfone com a ginga que o morro lhe deu, não cessou de mudar e se refazer. Poderia ter ficado na, como hoje se diz, zona de conforto, mas inovou na vida, no repertório e no público, hoje dirigindo-se à nova geração e tornando-se musa da vanguarda.

Elza também que é dona de uma pegada jazzística e foi comparada, por Louis Armstrong, a outra diva, Billie Holiday. Vê-la e ouvi-la, dominando a arte do scat singing dos grandes mestres negros norte-americanos, é um prazer incomparáv­el.

O filme passa por tudo isso, e, com a câmera colocada rente ao rosto da artista, em super close, conta o que ela mesma tem a dizer sobre si. Como essas palavras duras: “Aprendi a cantar carregando lata d’água na cabeça, subindo o morro”.

Elza Soares é mais do que uma cantora, mais ainda que uma artista no completo domínio de sua arte. É expressão de um Brasil que podia ser pobre, miserável mesmo, mas era um país talentoso. Bem diferente da vulgaridad­e atual.

 ?? DUDA LAS CASAS My Name is Now, Elza Soares (Brasil, 2017, 73 min.)
Dir. de Elizabete Martins Campos ?? Elza. Filme dá dimensão da força indomável
DUDA LAS CASAS My Name is Now, Elza Soares (Brasil, 2017, 73 min.) Dir. de Elizabete Martins Campos Elza. Filme dá dimensão da força indomável

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