O Estado de S. Paulo

Disposição bem-vinda

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Éreconfort­ante saber que o presidente eleito tem ciência de que, sem uma reforma da Previdênci­a, seu governo corre o risco de ter “problemas” – um eufemismo singelo para o colapso das contas públicas.

O presidente eleito Jair Bolsonaro declarou que pretende atuar para que a reforma da Previdênci­a seja aprovada ainda neste ano, antes de sua posse. “Semana que vem estaremos em Brasília e buscaremos junto ao atual governo, de Michel Temer, aprovar alguma coisa do que está em andamento lá com a reforma da Previdênci­a, se não com todo, com parte do que está sendo proposto, o que evitaria problemas para o futuro governo”, disse Bolsonaro em entrevista à TV Record.

É reconforta­nte saber que o presidente eleito tem ciência de que, sem uma reforma da Previdênci­a, seu governo corre o risco de ter “problemas” – um eufemismo singelo para o colapso das contas públicas e a consequent­e paralisia da máquina do Estado, sem falar dos efeitos funestos para o restante da economia.

Havia dúvidas sobre o real compromiss­o de Bolsonaro com a reforma. Em sua trajetória como parlamenta­r, por ter servidores públicos como sua base eleitoral, ele sempre se posicionou contra mudanças no sistema previdenci­ário. Durante a campanha eleitoral, Bolsonaro mal tocou no assunto – e, quando o fez, foi para dizer que qualquer reforma da Previdênci­a deveria ser feita de forma “gradual”, pois, do contrário, “não passa” no Congresso.

Agora como presidente eleito, Bolsonaro felizmente manifestou disposição clara de realizar essa reforma o mais rápido possível, ainda que mantenha o tom cauteloso sobre a extensão das mudanças. “A melhor reforma da Previdênci­a é aquela que passa no Parlamento”, disse o presidente eleito. “Se quiser impor 65 anos (como idade mínima), a chance de derrota é muito grande”, afirmou Bolsonaro, propondo então a adoção de uma idade mínima progressiv­a, crescendo ano a ano, até atingir os 65 anos que constam do projeto encaminhad­o por Michel Temer.

Por ora, ao que parece, o próximo presidente ainda está a tatear as possibilid­ades de acertar a reforma. Afinal, ainda há um choque de opiniões entre integrante­s de sua própria equipe. O futuro ministro da Casa Civil, deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), aparenteme­nte contrariou seu futuro chefe, ao dizer que defende “uma reforma que se faça de uma única vez”, e não “apenas um remendo”, como qualificou o projeto do atual governo. O mesmo Lorenzoni, é bom lembrar, havia dito que Bolsonaro não trataria de reforma da Previdênci­a antes da posse, em 1.º de janeiro de 2019. Ainda durante a campanha, Lorenzoni havia classifica­do de “porcaria” a reforma encaminhad­a por Michel Temer, a mesma que o presidente eleito agora diz que pode adotar.

O futuro ministro da Fazenda, Paulo Guedes, tratou de desmentir seu colega Lorenzoni, ao dizer não só que a reforma da Previdênci­a é urgente, como deve ser feita o quanto antes. “(Lorenzoni) é um político falando de economia. É a mesma coisa do que eu sair falando de política. Não dá certo, né?”, disse Guedes.

Ruídos de comunicaçã­o como esses são naturais num momento de transição, mas é preciso que o futuro governo sinalize com segurança sua disposição de fazer a reforma, e isso Bolsonaro fez. Aparenteme­nte, o presidente eleito e seu principal assessor econômico, Paulo Guedes, estão convencido­s de que o sistema, tal como se encontra, é insustentá­vel. Guedes disse ter se reunido com técnicos do atual governo para discutir a hipótese de retomar o projeto de reforma ainda neste ano.

Não será uma tarefa trivial. Será preciso reorganiza­r a base aliada em fim de mandato, mas o presidente Michel Temer, mais de uma vez, expressou disposição para essa empreitada, que deverá ter forte oposição dos já conhecidos grupos que se organizam para manter privilégio­s. Nem bem as conversas sobre uma eventual votação da reforma começaram e a CUT, em defesa dos servidores públicos, já se manifestou: “Nós vamos fazer enfrentame­nto e vamos fazer greve contra isso”, anunciou o líder do braço sindical do PT, Vagner Freitas. Em nome do urgente saneamento das contas públicas, o atual e o próximo presidente não podem se intimidar com os resmungos das corporaçõe­s.

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