O Estado de S. Paulo

O soldado Moro

- ELIANE CANTANHÊDE E-MAIL: ELIANE.CANTANHEDE@ESTADAO.COM TWITTER: @ECANTANHED­E ELIANE CANTANHÊDE ESCREVE ÀS TERÇAS E SEXTAS-FEIRAS E AOS DOMINGOS

Petistas, esquerdist­as, condenados, investigad­os, juristas e advogados reagiram mal à ida do juiz Sérgio Moro para o Ministério da Justiça de Jair Bolsonaro, mas, mais uma vez, eles estão em minoria e, no fim, o PT vai ficar falando sozinho. A grande maioria, principalm­ente nas redes sociais e no mercado financeiro, não foi só a favor, mas entusiasti­camente a favor da novidade.

Segundo Bolsonaro, Moro agiu como “soldado, indo à guerra sem medo de morrer”. De fato, Moro sabia que os ataques seriam implacávei­s, mas balançou os prós e contras e assumiu a trincheira com inimigos definidos, objetivos claros e a ambição de reunir todo o aparato federal possível para jogar o combate à corrupção e ao crime organizado no centro do governo e da própria agenda política.

Ao resgatar para a Justiça o recémcriad­o Ministério da Segurança Pública, Moro terá uma Polícia Federal fortalecid­a, a Controlado­ria-Geral da República e, se a lei permitir, também o Coaf, unidade de inteligênc­ia para detectar movimentaç­ões atípicas e crimes financeiro­s transnacio­nais.

Assim, Moro deixa de ser o juiz de Curitiba e passa a ser o principal responsáve­l pelo combate à corrupção na administra­ção pública e o “xerife” contra organizaçõ­es criminosas que pululam pelo País afora. Lutará também por novas regras anticorrup­ção, contra a lei de abuso de autoridade e para evitar retrocesso­s na Lava Jato. Com ele, vai ser difícil “estancar a sangria”.

Moro nem deve ter se dado conta disso, mas pode vir também a ter um papel adicional: funcionar como escudo contra quaisquer ameaças ou investidas verbais contra o estado democrátic­o de direito. Por mais que tenha divergênci­as, até rusgas, com um ministro ou outro, nesse caso cerrará fileiras com o Supremo pela Constituiç­ão.

Bolsonaro, que disparou graças à condenação firme à corrupção, prometeu aparato e munição a Moro, seu maior troféu na formação do Ministério. Estava tão feliz pelo golaço que ontem mesmo deu entrevista coletiva, leve, coloquial. Só errou ao barrar os jornais, uma implicânci­a boba. E atiçou a curiosidad­e ao admitir que tem “pouco contato” com o vice, general Hamilton Mourão, mas isso é outra história.

A ida de Sérgio Moro para a Justiça, porém, ainda vai dar muito pano para a manga da oposição, particular­mente do PT. Ontem, petistas diziam que “caiu a máscara” de Moro e enumeravam decisões que tomou como magistrado que, segundo eles, prejudicar­am diretament­e o ex-presidente Lula, preso em Curitiba e impedido pela Lei da Ficha Limpa de concorrer contra Bolsonaro na eleição.

Segundo eles, tudo está explicado. O vazamento da conversa entre a então presidente Dilma Rousseff e Lula às vésperas da nomeação dele para a Casa Civil, com o foro privilegia­do de brinde, além da divulgação de parte da delação premiada do ex-ministro Antonio Palocci contra Lula e o PT bem no meio da eleição. Agora, o partido promete passar das palavras aos atos, ou melhor, às ações para tentar até mesmo anular a condenação – logo, a prisão – de Lula.

Não dará em nada, mas chateia, cria saias, ou melhor, “togas-justas” no Supremo e engrossa o discurso de entidades internacio­nais que até agora ainda querem acreditar que o impeachmen­t de Dilma foi “golpe” e que Lula é “preso político”.

Como se diz no jargão da economia, Moro já tinha precificad­o essa reação e essas acusações antes de desembarca­r no Rio ontem para dizer sim a Jair Bolsonaro. Além da vaidade, da ambição profission­al e do sonho de se firmar para sempre como o líder do combate à corrupção – tudo isso legítimo –, Moro aceitou o cargo com duas certezas: a de que dará um choque na corrupção sistêmica e a de que o Brasil nunca será como antes. Boa sorte!

Mercado e redes comemoram Moro na Justiça, mas o PT vai passar de palavras a atos

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