O Estado de S. Paulo

Nos EUA, crianças morrem mais em Estados pró-armas

Estudo aponta que óbitos de menores de 19 anos são duas vezes maiores em Estados onde legislação é mais branda

- Fabiana Cambricoli / COLABOROU MARCO ANTÔNIO CARVALHO

Citado pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), como um dos países modelo de legislação pró-armas, os Estados Unidos registram duas vezes mais mortes de crianças nos Estados com leis que facilitam o porte de armamentos.

A conclusão é de um estudo da Escola de Medicina da Universida­de de Stanford e que será apresentad­o na próxima segunda-feira na conferênci­a anual da Associação Americana de Pediatria, em Orlando.

Para avaliar o impacto da legislação armamentis­ta na morte de crianças e adolescent­es americanos, os pesquisado­res levantaram o número anual de óbitos por disparo de arma de fogo nessa faixa etária e o cruzaram com o chamado índice Brady, que mede o grau de restrição das legislaçõe­s estaduais referentes a armamentos – nos EUA, diferentem­ente do Brasil, cada uma das 50 unidades da federação têm autonomia para aprovar suas próprias leis sobre esse e outros temas.

Os pesquisado­res verificara­m que, anualmente, cerca de 2,7 mil crianças ou adolescent­es morrem no país vítimas de disparos de arma de fogo. Fazendo ajustes estatístic­os para corrigir discrepânc­ias de renda, emprego e escolarida­de, os cientistas concluíram que, nos Estados onde a legislação de armas é mais branda, morrem o dobro de crianças em comparação ao número de óbitos nos Estados onde as leis são mais restritiva­s.

Para efeito de comparação, cerca de 9 mil crianças e adolescent­es morrem no Brasil por ano vítimas de armas de fogo, número que, segundo pesquisado­res da área, poderia ser ainda maior se as políticas de desarmamen­to fossem suspensas no País. No Atlas da Violência 2018, os analistas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) atribuem ao Estatuto do Desarmamen­to (em vigência desde 2003) a interrupçã­o

“da corrida armamentis­ta que estava impulsiona­ndo mortes violentas no País”.

Outros resultados. Os pesquisado­res americanos verificara­m ainda, em outro estudo, que o número de crianças hospitaliz­adas por ferimentos provocados por armas de fogo também é maior nos Estados com normas mais permissiva­s em relação às armas.

“Lesões por armas de fogo são a segunda maior causa de morte de crianças nos Estados Unidos, mas encontramo­s uma clara discrepânc­ia sobre onde essas mortes ocorrem, o que correspond­e à força das legislaçõe­s estaduais de armas. Em Estados com leis mais brandas, crianças morrem em taxas alarmantem­ente maiores”, declarou, em nota, Stephanie Chao, professora de cirurgia pediátrica de Stanford e uma das autoras do estudo. “Mais crianças morrem de ferimentos relacionad­os a armas de fogo do que de câncer e doenças cardíacas. Cada uma dessas mortes poderia ser evitada. Nosso estudo demonstra que a legislação estadual impede que as crianças morram por armas”, completou a pesquisado­ra.

No estudo, os pesquisado­res ressaltam que, do total de mortes de crianças e adolescent­es registrada­s no país por essa causa, 62,1% foram classifica­das como homicídios e 31,4%, como suicídios.

Polêmica. A legislação pró-armas de alguns Estados americanos já foi alvo de críticas de autoridade­s políticas, como o expresiden­te Barack Obama, e entidades de direitos humanos. A polêmica ganha força a cada episódio de massacre registrado naquele país. No mais recente ataque, registrado no último dia 27, um atirador matou 11 pessoas em uma sinagoga em Pittsburgh.

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