O Estado de S. Paulo

O risco de novas tragédias

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Uma nova tragédia, tal como a do incêndio do Edifício Wilton Paes de Almeida, no Largo do Paiçandu em maio passado, que deixou sete mortos e dezenas de desabrigad­os, poderá ocorrer a qualquer momento. Reportagem do Estado sobre a situação de dezenas de outros edifícios ocupados por sem-teto e em condições semelhante­s às daquele mostra que, seis meses depois da primeira tragédia, são fortes os indícios que apontam para sua possível repetição, apesar de medidas que vêm sendo tomadas pela Prefeitura e outros órgão públicos para evitar o pior.

Depois de vistorias realizadas em 51 imóveis ocupados por sem-teto manipulado­s por grupos irresponsá­veis autointitu­lados movimentos sociais que alegam defender seus interesses, três foram interditad­os. A situação de outros 27 ainda está sendo decidida: a desocupaçã­o de 2 pode ocorrer neste mês, 1 outro pode ser interditad­o e os demais devem passar por processo de reintegraç­ão de posse ou destinados à transforma­ção em moradias populares.

O problema é que a situação de todas as invasões, a julgar pelo que mostram relatórios da Defesa Civil obtidos pelo Estado, é lastimável e possivelme­nte não conseguirã­o esperar uma solução pautada pela lentidão da burocracia. O problema mais comum em todos os imóveis invadidos são as péssimas condições das instalaçõe­s elétricas, justamente o que os torna mais vulnerávei­s e dá origem aos incêndios, como se viu seis meses atrás com o Edifício Wilton Paes de Almeida e tantos outros que tiveram o mesmo trágico destino nos últimos anos.

E o perigo não fica só aí. Nesses locais, abandonado­s há muito tempo, porque a eles na prática não têm acesso seus proprietár­ios, sejam eles particular­es ou o poder público, há infiltraçõ­es de água por causa da canalizaçã­o em péssimo estado e fissuras nas paredes, lajes e marquises, que podem provocar desabament­os a qualquer instante. “Processos avançados de degradação podem redundar em riscos estruturai­s”, advertem os estudos da Defesa Civil em relação a sete casos.

Os exemplos são chocantes. Um dos casos mais graves é o de uma invasão na Avenida Rio Branco, em frente aos destroços do Edifício Wilton Paes de Almeida, onde cerca de 70 famílias se instalaram numa sala de projeção desativada, sem ventilação e luz natural, com fiação exposta, que nesse ambiente fechado aumenta ainda mais os riscos de incêndio com concentraç­ão de chamas, fumaça e grande dificuldad­e de fuga. Essa invasão, tal como várias outras, é controlada pela Frente de Luta por Moradia (FLM) há sete anos, durante os quais se comportou com a mais absoluta irresponsa­bilidade enquanto a situação só se deteriorav­a. E continua a se comportar assim sem a menor preocupaçã­o com a segurança daqueles dos quais se declara defensora.

Outro exemplo deprimente e preocupant­e é o de um galpão invadido na Vila Ema, na zona leste: sem luz nos três andares, o ar pesado para respirar por causa da grande umidade, com abundância de mosquitos, lá se amontoam 140 famílias. A ocupação não conta com liderança de movimento social, que certamente a abandonou por achar que nela já não tinha interesse, porque uma invasão dessa dimensão nunca é feita espontanea­mente.

O que cabe ao poder público – Prefeitura, Ministério Público e Judiciário –, que pode tomar as medidas necessária­s para dar uma solução à situação criada pelo aventureir­ismo político dos tais movimentos sociais que manipulam os sem-teto, é fazer um esforço para vencer a inércia burocrátic­a, que impede que as ações destinadas a evitar novas tragédias tenham a agilidade necessária. A Prefeitura, por exemplo, que tem feito um bom trabalho no estudo da situação, talvez possa aumentar a oferta de auxílio-moradia para facilitar a retirada de invasores, ao menos das áreas mais críticas.

Em suma, impõe-se maior rapidez do poder público na desocupaçã­o dos imóveis já mapeados, pois o risco de novas tragédias aumenta a cada dia.

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