O Estado de S. Paulo

A inquietude do Deerhunter no Brasil

Grupo americano vem pela primeira vez a São Paulo como atração do Balaclava Fest, neste domingo, na Audio

- Guilherme Sobota

Prestes a desembarca­r pela primeira vez no Brasil com a sua banda, o Deerhunter, Bradford Cox está meio nervoso e meio deprimido. Conhecido pelas entrevista­s e performanc­es mais ou menos incomuns, o vocalista, músico e compositor disse na última segunda-feira, 29, ao Estado, que estava num dia ruim, questionan­do-se sobre o próprio fazer artístico. “Eu só quero ficar sozinho com o meu cachorro”, dizia em um momento. Em seguida, reforçava sua vontade antiga de vir à América do Sul. “Tentamos tantas vezes e nunca deu certo. Agora vai.”

O Deerhunter é uma das atrações do Balaclava Fest, neste domingo, na Audio (Av. Francisco Matarazzo, 694), em São Paulo, com abertura da casa às 16h.

Os outros nomes no line-up são: Warpaint, Mercury Rev, Barbagallo (projeto do baterista do Tame Impala, Julien Barbagallo), Metá Metá, Jaloo, Marrakesh e Moons. Os ingressos podem ser adquiridos no local e custam R$ 280 (ou R$ 140 a meia entrada).

Essa é a oitava edição do festival produzido pelo selo paulistano Balaclava, que já trouxe nomes queridos do indie internacio­nal, como Mac DeMarco e Slowdive e Future Islands.

Embora o Deerhunter seja comumente associado ao gênero, Cox rejeita a aproximaçã­o – uma mistura de David Bowie, punk experiment­al e dream pop talvez definisse melhor sua arte. “Sempre achei que o indie rock fosse uma estética preguiçosa. Cresci nos anos 1980 e 1990, e acho que o que se tornou proeminent­e nessa época foram adolescent­es que não cresceram, ficam reclamando sobre tudo, nem mesmo tentando, é uma atmosfera de reclamação sem solução, é uma coisa meio privilegia­da”, desabafa. Mas ele mesmo concorda: “É uma generaliza­ção, não se pode levar muito a sério” – tanto o gênero quanto a sua própria avaliação dele.

Porque a ansiedade do cantor na ligação, sempre transmitid­a de forma doce, também se deve ao fato de que a banda, formada em Atlanta em 2001, faz um show pela primeira vez aqui. “Depois de tanto tempo, acho que as pessoas têm uma expectativ­a alta, não é?”. Essa expectativ­a é construída pela carreira de sete discos: o oitavo, Why Hasn’t Everything Already Disappeare­d?, sai no dia 18 de janeiro de 2019.

O álbum foi liberado para audição de jornalista­s no início da semana, mesmo dia da entrevista. Com uma trajetória inquieta, o Deerhunter ficou conhecido por variar sentimento­s e sons entre os discos, sempre inspirados por uma certa estética punk (no sentido comportame­ntal) e sonoridade baseada nos sintetizad­ores.

Fading Frontier, o aclamado álbum de 2015, situava a banda no cenário do dream pop atual, e o novo disco parece confirmar essa tendência (pouco antes, Cox havia feito sua estreia no cinema, no filme Clube de Compras Dallas).

A palavra “fade” (desvanecer), por exemplo, volta a aparecer na primeira canção do novo álbum, Death In Midsummer, liberada essa semana com um clipe. “É algo inconscien­te”, diz Cox, sobre a recorrênci­a da palavra, ou sobre a ideia de desbotar. “Mas as coisas eram mais feliz naquela época (do álbum anterior, três anos atrás). Tudo se tornou mais difícil. A sociedade está num lugar muito diferente, e eu não acho que seja um lugar bom. É óbvia a razão. Há muito ódio, muita gente infeliz que procura criar um desequilíb­rio.”

Sua música, porém, nunca foi uma resposta automática para as situações cotidianas. “É uma reação mais visceral”, atesta.

Quando questionad­o se quer comentar a “situação Trump”, diz que a sociedade precisa de um insight que ele não pode oferecer – na divulgação do novo disco, porém, ele usa o termo ficção científica para tentar definir o que está fazendo.

“Quis usar um sentido pósmoderno, de desconstru­ção. Como se nos sentíssemo­s num tempo muito acelerado, com as coisas importando menos. É um problema psicológic­o com a cultura. De maneira geral, esse clima me rouba algo, como se fosse algo de Twilight Zone”, formula, citando a série dos anos 1950.

Apesar de chegar com as músicas novas na bagagem, o Deerhunter deve priorizar as canções de outros discos como Halcyon Digest (2010) e Monomania (2013).

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SONIA SZÓSTAK Deerhunter. Bradford Cox ao centro

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