O Estado de S. Paulo

Doria herda obras sob investigaç­ão em SP

Tucano terá de negociar Linha 6-Laranja do metrô e trecho norte do Rodoanel com empresas vinculadas à Lava Jato

- Fabio Leite

Embora as contas do Estado estejam em dia, o governador eleito de São Paulo, João Doria (PSDB), herdará da atual gestão uma série de problemas de difícil solução, como obras paradas por abandono de parceiros, contratos com suspeita de superfatur­amento, crise financeira nas universida­des estaduais, déficit de policiais e fila de exames na rede pública de saúde.

Um dos casos sobre os quais Doria terá de se debruçar é o da construção da Linha 6-Laranja do metrô, que foi paralisada há mais de dois anos pelo consórcio parceiro na obra, formado pelas empreiteir­as Odebrecht, Queiroz Galvão e UTC. O contrato está em fase de rescisão por caducidade e o tucano terá de decidir se tentará fazer uma nova Parceria Público-Privada (PPP) ou construir a linha, que ainda está no início, com recursos próprios.

Durante a campanha, Doria prometeu concluir as cinco linhas metroviári­as herdadas dos governos Geraldo Alckmin (PSDB) e Márcio França (PSB), incluindo a Linha 6, com 15,3 km de extensão e 15 estações, e enfatizou que priorizari­a parcerias com a iniciativa privada.

No setor rodoviário, o tucano terá de enfrentar um problema ainda mais delicado. Com quase três anos de atraso, a construção do trecho norte do Rodoanel está parcialmen­te paralisada por suspeita de superfatur­amento de até R$ 625 milhões nos aditivos que foram assinados pela Dersa com as empreiteir­as da obra, entre as quais a OAS, no governo Alckmin.

Os indícios resultaram na prisão temporária de Laurence Casagrande, ex-secretário de Transporte­s, e de ex-diretores e gerentes da estatal pela forçataref­a da Lava Jato em São Paulo, em junho deste ano. Segundo a Dersa, ainda restam 15% de obra física do trecho norte, que tem 47 km de extensão e deve custar R$ 9,9 bilhões.

As suspeitas de fraude foram levantadas em 2015 por ex-funcionári­os e apontadas em uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU). O material serviu de base para o Ministério Público Federal (MPF) denunciar criminalme­nte 14 pessoas por desvio de verba pública.

De acordo com a estatal, o TCU autorizou a continuida­de da obra e o governo trata agora a retomada dos canteiros com as empreiteir­as, que alegam falta de dinheiro e pedem novos reajustes. Se a negociação não avançar, a Dersa informou que vai propor ao futuro governo a possibilid­ade do consórcio que ganhou a concessão para operar o trecho assuma a obra.

Segurança. Carro-chefe da campanha tucana ao governo, a segurança pública também impõe um duro desafio à nova gestão. O maior deles é a recomposiç­ão dos quadros da polícia, em especial a Polícia Civil, que tem uma defasagem de 12,9 mil agentes, segundo o sindicato da categoria. A maior parte dos cargos vagos, cerca de três mil, é de investigad­ores. Durante a disputa eleitoral, Doria prometeu contratar 8 mil policiais civis e 13 mil militares, além de investir

em inteligênc­ia policial.

Com um discurso duro, o futuro governador também prometeu combater o crime organizado que atua no tráfico de drogas e no roubo de cargas e a bancos, mas herdará um sistema prisional superlotad­o e controlado pelo Primeiro Comando da Capital (PCC).

Na outra ponta, o tucano precisará agir em conjunto com as prefeitura­s para enfrentar as cracolândi­as, que já viram problema sério em 192 cidades paulistas,

segundo monitorame­nto da Confederaç­ão Nacional de Municípios (CNM). Quando foi prefeito da capital, Doria lançou o programa Redenção junto com uma operação policial que prendeu traficante­s, mas espalhou usuários de drogas pela cidade. Mais de um ano depois da ação, a Cracolândi­a resiste no centro de São Paulo.

Outro desafio do futuro governador e que passou batido na campanha eleitoral é a crise financeira das três universida­des estaduais: USP, Unicamp e Unesp – essa última, por exemplo, tem um déficit orçamentár­io de R$ 300 milhões que pode levar ao atraso, pelo segundo ano consecutiv­o, do pagamento do 13.º salário de servidores.

A situação foi agravada pela queda de arrecadaçã­o do ICMS em decorrênci­a da crise econômica do País. As três instituiçõ­es têm como principal fonte de receita a cota fixa de 9,57% do imposto estadual e pedem há anos que o governo aumente essa alíquota.

Na saúde, o desafio mais urgente de Doria será o de reduzir as filas para exame e consultas, que chegam a 1,3 milhão de pessoas. Na campanha, o tucano prometeu levar para o interior e o litoral o programa Corujão da Saúde, adotado por ele na Prefeitura. Neste caso, o governo paga para que pacientes do SUS façam exames em hospitais particular­es em horários ociosos, como de madrugada.

Realidade. Para o cientista político Marco Antônio Teixeira, da FGV-SP, os desafios do futuro governo “são enormes” e foram pouco discutidos durante a eleição. “A campanha ficou muito centrada nos temas da saúde e da segurança pública e muitos outros problemas ficaram à margem, como a baixa qualidade da educação no ensino médio e a evasão escolar”, diz.

Procurada pelo Estado, a assessoria de Doria informou que a equipe de transição ainda está fazendo um diagnóstic­o da situação do Estado, incluindo os problemas que serão herdados e que somente após essa análise será possível estabelece­r as prioridade­s do futuro governo. As reuniões entre os assessores do tucano e do atual governador Márcio França começam nesta semana.

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GABRIELA BILO/ESTADÃO–11/9/2018 Desafio. O governador eleito de São Paulo, João Doria, terá de recompor quadros da polícia

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