O PLANETA AZUL, EXAMINADO POR DENTRO
Cientistas fazem 1.ª tomografia da Terra, usando partículas que não interagem com a matéria
Os neutrinos são as únicas partículas elementares conhecidas capazes de atravessar a Terra. Essa “virtude” permitiu que uma equipe de cientistas fizesse a primeira tomografia do planeta com essas partículas, o que ajudará a saber mais sobre sua densidade e seu núcleo.
O trabalho, publicado ontem na revista especializada Nature Physics, foi realizado por Andrea Donini e Sergio Palomares, pesquisadores da Universidade de Valência, juntamente com Jordi Salvadó, da Universidade de Barcelona, ambas na Espanha.
Os neutrinos, também conhecidos como “partículas-fantasma”, são uma das partículas mais abundantes e evasivas do universo, que dificilmente interagem com a matéria. “Para capturá-los, são necessárias enormes quantidades de matéria, como o IceCube da Antártida, um experimento projetado por um consórcio internacional que utiliza um pedaço de gelo de um quilômetro cúbico para detectar neutrinos de origem cósmica”, disse Donini.
Em 2011, o IceCube permitiu determinar com precisão a quantidade de neutrinos atmosféricos que surge do choque entre os raios cósmicos e a atmosfera, e que são absorvidos pela Terra. E, como a distribuição de neutrinos a partir de um ponto da atmosfera para baixo é igual em todo o planeta, “é possível calcular os que chegam de todas as partes, o que seria o mesmo que fazer uma radiografia a partir de todos os pontos possíveis, ou como uma ressonância nuclear na qual o feixe de luz dá voltas para fazer uma reconstrução em todas as direções”, detalhou o físico.
A partir desses dados, os cientistas mediram quantos neutrinos são produzidos na atmosfera e quantos chegam à Terra. “E os que não chegaram é porque se encontraram com matéria, com massa, e, com essa informação, fizemos um mapa de como a massa se distribui em toda a Terra”, acrescentou Donini.
O estudo ajudará a entender melhor como se distribui a matéria no núcleo terrestre, o que é fundamental para aumentar os conhecimentos sobre o interior do planeta. O núcleo tem uma parte interna sólida e outra externa líquida. “Quando a Terra gira sobre seu eixo, seus componentes internos também fazem o mesmo. De fato, o campo magnético terrestre é criado pelo atrito entre o núcleo sólido e o líquido que, por terem densidades distintas, giram em velocidades diferentes”,
“Os neutrinos atravessam tudo, oferecendo informação valiosa sobre o desconhecido núcleo da Terra.” Andrea Donini
CIENTISTA DO INSTITUTO
CORPUSCULAR DA UNIVERSIDADE
DE VALÊNCIA (ESPANHA)
lembrou Donini.
“Conhecer como a matéria está distribuída no núcleo é importante para entender o geomagnetismo, a dinâmica do campo magnético terrestre e como ele funciona.”
Plano antigo. A ideia de usar neutrinos para estudar o interior terrestre surgiu há quase 50 anos, mas, até a implementação do IceCube, não havia instrumento capaz de detectar neutrinos de alta energia em número suficiente para o teste. /AGÊNCIA EFE