O Estado de S. Paulo

O desnecessá­rio processo burocrátic­o

- JOSÉ RICARDO RORIZ VICE-PRESIDENTE DA FIESP

OBrasil é, de longe, no quesito burocracia, o país mais kafkiano entre aqueles com que costuma ser comparado. O Institute of Managerial Developmen­t (IMD) diz que, entre as 61 nações avaliadas, somos o país onde a burocracia mais prejudica a atividade econômica.

Nos últimos dez anos, o Brasil tem ficado entre a 116.ª e a 130.ª posições no ranking do Banco Mundial que mede a facilidade oferecida para fazer negócios em 190 países. Neste ano, caiu da 123.ª para a 125.ª na pesquisa Doing Business.

Estamos atrás dos Brics. Empresário­s da Rússia, Índia, China e África do Sul estão menos soterrados por papeladas do que seus colegas brasileiro­s. A situação também não é favorável ao Brasil na comparação regional. Em vizinhos como Chile (55.ª), Peru (58.ª) e até a conturbada Argentina (117.ª), o peso do Estado no cotidiano das empresas é bem mais leve.

Não estou entre os que defendem a ausência total do Estado ou fazem objeções a normas e regras rígidas para os negócios. Muitas delas são necessária­s para que se garantam a saúde da população, a segurança dos trabalhado­res, os direitos do consumidor e a concorrênc­ia entre as empresas.

O problema são as regulações excessivas que tendem a minar a competitiv­idade das empresas. Ao contrário de seus pares na grande maioria dos países, os empresário­s brasileiro­s enfrentam um emaranhado de regras injustas, caras e contraditó­rias entre si.

Engana-se quem acha que se trata apenas de uma questão econômica. Pesquisa realizada pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) mostra que, na opinião de mais de 90% dos donos das indústrias, o excesso de burocracia abre espaço para a corrupção. Prevalece o vício antigo – e que já deveria ter sido erradicado do País – de criar dificuldad­e para vender facilidade.

Alguns números seriam dignos de figurar na ficção do autor de O Processo, tal o absurdo que encerram. As empresas no Brasil gastam, em média, quase 2 mil horas por ano (1.958, para ser exato) com o pagamento de impostos. No conjunto, os gastos das indústrias com burocracia para o pagamento de tributos beiram inacreditá­veis R$ 25 bilhões, cifra equivalent­e à receita orçamentár­ia de um Estado razoavelme­nte rico como Santa Catarina.

Outro dado que Franz Kafka teria usado com gosto: mais de 700 normas são editadas diariament­e, obrigando as empresas a desembolsa­r estimados R$ 137 milhões apenas para acompanhar as modificaçõ­es. Esse caos normativo sufoca a sociedade, cria enorme inseguranç­a jurídica e afasta investimen­tos nacionais e estrangeir­os.

O fardo da burocracia se faz sentir em várias áreas. Os empresário­s se queixam especialme­nte dos complexos procedimen­tos para abrir ou fechar negócios, das complicada­s regras para obtenção de financiame­nto público, das exigências desproposi­tadas para tirar licenças ambientais, dos detalhados requerimen­tos para exportar.

O resultado é a competitiv­idade comprometi­da das empresas brasileira­s, com forte impacto negativo para a expansão da economia e a necessária geração de empregos.

Há muito a ser feito. Por exemplo,

A modernizaç­ão do Estado e a desburocra­tização devem ser vistas como uma agenda permanente de Estado

unificar e simplifica­r procedimen­tos e regulament­os, estabelece­r regras mais inteligent­es e eficazes, intensific­ar o uso dos meios de serviços eletrônico­s e de instrument­os tecnológic­os disponívei­s no mundo digital, simplifica­r e reduzir encargos, adotar as boas práticas internacio­nais de desburocra­tização, estimar o custo para a sociedade de novas propostas legislativ­as, estabelece­r e consolidar um canal permanente de comunicaçã­o entre sociedade e governo determinan­do metas e prazos para tratar a questão.

O Brasil está no limiar de um novo governo. O próximo presidente não pode ignorar a urgência de desatar este nó, sob pena de condenar mais uma geração a carregar nos ombros uma herança secular que oprime os cidadãos.

A modernizaç­ão do Estado e a desburocra­tização devem ser encaradas como uma agenda permanente de Estado. Só assim seremos capazes de construir um Brasil mais forte e competitiv­o.

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