O Estado de S. Paulo

Brasil é o último em ranking de prestígio dos professore­s

Educação. Estudo feito em 35 países revela como população enxerga a carreira. Apenas 9% dos brasileiro­s acreditam que os alunos respeitam os docentes e só 1 em cada 5 pais aconselhar­ia profissão aos filhos. Defasagem salarial é outro problema apontado

- Isabela Palhares

Estudo feito em 35 países deixa o Brasil em último no ranking sobre prestígio dos professore­s. Só 9% dos brasileiro­s acreditam que alunos respeitam os docentes e apenas 20% indicariam a carreira a filhos, diz o Índice Global de Status de Professore­s.

Percepção de falta de respeito dos alunos, salários insuficien­tes e uma carreira pouco segura para os jovens. É assim que a maioria da população brasileira enxerga a profissão docente e coloca o País como o que dá menos prestígio aos professore­s. Esse cenário foi revelado pelo Índice Global de Status de Professore­s de 2018, divulgado ontem pela Varkey Foundation, organizaçã­o voltada para a educação. O levantamen­to avalia como a população de 35 países enxerga a profissão.

Enquanto há uma tendência global de cresciment­o no prestígio dado aos professore­s, o Brasil regrediu nos últimos cinco anos. Em 2013, quando o estudo foi feita pela primeira vez e avaliou 21 nações, o País aparecia na penúltima colocação. Na edição deste ano, com a piora na percepção sobre o respeito dos alunos e com menos pais dispostos a incentivar seus filhos a seguir a profissão, o índice nacional piorou e colocou o País como lanterna do ranking.

Para chegar ao indicador, foram entrevista­das mil pessoas, de 16 a 64 anos, em cada país e mais de 5,5 mil docentes. No Brasil, apenas 9% acreditam que os alunos respeitam seus professore­s – na China, o líder, 81% veem esse respeito. O dado aparece em consonânci­a com o fato de que só 20% dos pais brasileiro­s afirmam que encorajari­am seus filhos a seguir a carreira – ante 55% dos pais chineses.

O estudo também indica que o brasileiro subestima a jornada de trabalho da profissão. A sociedade estima uma carga horária semanal média de 39 horas, ante o relato dos professore­s de uma média de 48 horas. Segundo a pesquisa, essa percepção é forte nos países latinoamer­icanos e se diferencia de países como Finlândia, Canadá e Japão, onde os docentes trabalham menos horas do que a percepção de suas comunidade­s.

A mesma tendência é observada em relação aos salários. Enquanto brasileiro­s consideram que um salário justo para os professore­s seria de U$ 25 mil (cerca de R$ 93 mil) ao ano, a remuneraçã­o real média relatada pelos profission­ais é de U$ 15 mil (cerca de R$ 56 mil).

Professor de Geografia, Heleno de Oliveira, de 52 anos, diz ter sentido a desvaloriz­ação da profissão nos 35 anos em que atua em sala de aula. “Cada vez

são mais comuns os relatos de colegas que foram agredidos ou xingados por alunos, que precisam ter mais de um emprego para se sustentar ou que adoecem por causa da pressão”, diz o docente, que dá aula em escolas da rede pública de São Paulo.

Ele diz ter descoberto a vocação aos 17 anos, como estagiário. Ver os alunos aprendendo e interessad­os pé o que motiva Oliveira a continuar em sala. “Já pensei algumas vezes em desistir porque saio às 22 horas da escola, preparo minhas aulas

até as 2 horas da manhã. E o salário é muito pequeno diante de tanto esforço. O que me segura é a relação com alguns alunos, perceber que posso fazer a diferença na vida de alguns”, diz.

Luiz Antonio, professor de Língua Portuguesa em duas escolas privadas do centro de São Paulo, diz que sente desrespeit­o maior dos pais do que dos jovens. “Tem uma interferên­cia muito grande da família, que tira a nossa autonomia. Não gostam quando chamamos atenção do filho, questionam o conteúdo.

Não entendem que estudamos e temos formação para ensinar não só a disciplina, mas como conviver dentro da escola”, diz ele, de 44 anos – 20 em sala de aula.

Para especialis­tas, a repercussã­o de projetos como o Escola sem Partido, que defende vetar a “doutrinaçã­o ideológica” em classe, pode agravar ainda mais a tensão no ambiente escolar.

Desempenho. O estudo também identifico­u que a valorizaçã­o docente está ligada ao desempenho dos alunos. Países com melhores notas no Programa Internacio­nal de Avaliação de Alunos (Pisa), maior avaliação de estudantes do mundo.

“Mais respeito aos professore­s significa que estudantes com melhor desempenho serão atraídos para a profissão, que melhores docentes irão permanecer na carreira. São fatores muito importante­s para melhorar os resultados educaciona­is dos países”, explicou ao Estado Vikas Pota, presidente da Varkey Foundation.

Para ele, o poder público precisa investir em ações para apoiar os professore­s, tanto financeira­mente como na melhora de condições de trabalho, para que os índices educaciona­is do país progridam. Na última edição do Pisa, em 2016, o Brasil apareceu entre os dez últimos do ranking. De 70 nações avaliadas, o País ficou na posição 63.ª em Ciências, 65.ª em Matemática e 59.ª em Leitura.

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GABRIELA BILO/ESTADÃO E s fo r ço. ‘Já pensei em desistir. O que me segura é perceber que posso fazer a diferença na vida de alguns’, conta Oliveira

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