Uma herança a preservar
Um dos melhores legados de Michel Temer será uma inflação próxima da meta de 4,50%.
Um dos melhores legados do presidente Michel Temer a seu sucessor será uma inflação moderada e próxima da meta de 4,50%, resultado muito provável, segundo analistas do setor privado e também do Banco Central (BC). Se os preços continuarem bem comportados em 2019, o próximo governo poderá concentrar-se em tarefas essenciais para a consolidação de uma nova fase de prosperidade. Essa agenda inclui a estabilização das finanças públicas e a promoção de reformas necessárias a uma economia mais segura e mais dinâmica. Afetada por fatores externos e pela incerteza política interna, a inflação oficial chegou a 3,81% neste ano, até outubro, e a 4,56% em 12 meses. No mês passado, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ainda subiu 0,45%. Pouco menor que o de setembro (0,48%), o aumento foi, no entanto, o maior para o mês de outubro desde 2015, quando chegou a 0,82%. O último bimestre deste ano, segundo economistas do mercado, deve ser bem mais tranquilo.
Há vários argumentos a favor da aposta em preços mais comportados em novembro e dezembro. Cerca de 70% da alta do IPCA em outubro foram determinados por apenas dois dos nove grandes itens – alimentação e transportes.
O principal componente deste último item, o preço dos combustíveis, subiu 2,44% no mês e contribuiu sozinho com quase um terço do aumento geral de 0,45%. Em novembro, o já anunciado aumento do gás de botijão deve ser mais que compensado pelo corte do preço da gasolina. A energia elétrica, segunda maior fonte de pressão inflacionária em 12 meses, com alta acumulada de 16,69%, deve pesar menos, com a troca da bandeira tarifária vermelha pela amarela.
As maiores pressões sobre o custo de vida têm ocorrido nos itens monitorados, como combustíveis, energia elétrica, transporte aéreo e transporte municipal. O mercado tem menor influência na determinação desses preços. Nas áreas onde a influência do consumidor é considerável a maioria dos preços tem sido mais estável – e este dado constitui um argumento considerável no exame das perspectivas de curto e de médio prazos.
Dois dados muito significativos são ressaltados pelo economista Fernando Gonçalves, gerente da Coordenação de Índices de Preços do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A inflação de serviços, bom reflexo do impacto da demanda do consumidor, ficou em 0,17% em outubro e em 3,03% em 12 meses, a menor taxa da série iniciada em 2012.
O outro dado é a desocupação. O desemprego tem diminuído, mas a taxa de 11,9% é muito alta e, além disso, a maioria das contratações tem sido sem carteira assinada. Quem conseguiu emprego nos últimos meses continua inseguro e, por isso, cauteloso nas despesas, comenta o gerente do IBGE. As condições de emprego ainda ruins devem, portanto, continuar freando por algum tempo a demanda e a alta de preços ao consumidor.
A curto prazo, portanto, há condições para o Banco Central (BC) continuar mantendo em 6,50% a taxa básica de juros, como ocorreu na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) no fim de outubro. Com muita mão de obra desocupada ou subutilizada e ampla ociosidade no parque de máquinas e equipamentos, há espaço para alguma recuperação da economia sem forte pressão inflacionária. Na fase seguinte o avanço dependerá de ganhos de produtividade.
Essa perspectiva, desenhada na ata da reunião do Copom, é sustentada por alguns pressupostos. O mais importante é a confiança dos mercados na política econômica. Confiança pode ser uma barreira a pressões inflacionárias. Cotações internacionais de produtos básicos, alta dos juros americanos e tensões comerciais têm pressionado o câmbio e afetado os preços por atacado, mas até agora com pouco efeito no varejo.
Também esse fator, a ancoragem das expectativas, tem sido mencionado nas atas do Copom. Mas expectativas podem ser prejudicadas até antes da posse do governo, pela repetição de atitudes e falas desastradas. Sob alguns aspectos, o novo governo já começou.