O Estado de S. Paulo

Adriana Fernandes

- E-MAIL: ADRIANA.FERNANDES@ESTADAO.COM ADRIANA FERNANDES ESCREVE AOS SÁBADOS É REPÓRTER ESPECIAL DO BROADCAST

O presidente eleito teve um encontro nada fácil com a capital. É o “efeito Brasília”.

OOrçamento de 2019 é o próximo alvo das lideranças políticas que manobraram as votações ao longo da semana no Congresso e impuseram perdas importante­s ao presidente eleito, Jair Bolsonaro.

A principal delas é o reajuste dos salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), com efeito cascata para os Estados, e o risco de reversão, pelo ministro do STF Ricardo Lewandowsk­i, da medida provisória que adia reajustes nos salários dos servidores de 2019 para 2020, com base num parecer elaborado pelo Senado Federal.

Há risco de a lei orçamentár­ia não ser aprovada até o fim do ano por conta de manobras protelatór­ias já esperadas do presidente do Congresso, Eunício Oliveira (MDBCE). Aliado do PT e sem mandato a partir de 2019, Eunício já deu o tom do estrago que pode fazer nas poucas semanas que faltam dos trabalhos legislativ­os. Terá muito poder até lá para detonar novas votações.

Em entrevista ao repórter Felipe Frazão do Estado, o emedebista soltou o verbo e avisou que, “até o último dia em que for presidente, ninguém vai interferir nesse Poder”. Eunício contou, com certo desdém, que o senador eleito major Olímpio (PSL-SP), um dos principais aliados de Bolsonaro, ao lhe procurar para pedir o seu gabinete e um apartament­o funcional, lhe disse: “Olha, eu estou com vergonha de que alguém não tenha procurado o presidente do Congresso sobre pautas aqui”.

Sem Orçamento, Bolsonaro e o seu superminis­tro da Economia, Paulo Guedes, terão de gastar tempo no início do novo governo negociando a votação da peça orçamentár­ia.

A julgar pela movimentaç­ão nos bastidores dessa primeira semana de transição, Guedes e sua equipe já demonstrar­am que não fazem muita questão de ter o Orçamento aprovado ainda em 2018. Nenhum gesto foi feito para procurar os interlocut­ores do Congresso. Tudo indica que preferem deixar a tarefa para depois, já com a nova estrutura de ministério­s.

É erro, porém, deixar a votação para 2019. A negociação do Orçamento retardaria o avanço da reforma previdenci­ária a partir de fevereiro, quando o Congresso se instala e o jogo político recomeça com os novos senadores e deputados eleitos.

Apesar das movimentaç­ões recentes de Bolsonaro, sugerindo que as mudanças nas regras da Previdênci­a poderão ser aprovadas este ano, ninguém de verdade no Congresso acredita que a reforma sai até dezembro. Nem o mais otimista dos otimistas.

O que tem mais chance de ser aprovado ainda em 2018 é o projeto para criar uma alíquota previdenci­ária complement­ar a ser cobrada dos servidores públicos. Uma ajuda fundamenta­l para os governador­es que começam 2019 com os cofres vazios e estão cobrando essa solução.

Alguns governador­es já elevaram suas alíquotas regulares, mas há uma Ação Direta de Inconstitu­cionalidad­e no Supremo Tribunal Federal (STF) que questiona se há ou não um teto (que seria de 14%) para a alíquota.

A ação foi motivada porque o Estado de Goiás elevou sua alíquota para 14,25%. O mérito ainda não foi julgado pela Corte, mas há grande expectativ­a dos governador­es por uma decisão. A aprovação de um projeto para implementa­r uma contribuiç­ão complement­ar é o que vai ajudar os Estados a ter o respaldo nacional.

Mas nem a proposta da alíquota adicional para os servidores teve respaldo de Bolsonaro, que dias antes havia ele mesmo aventado a possibilid­ade de fazer uma reforma “light” por meio de leis infraconst­itucionais. Nesta sexta-feira, Bolsonaro negou as mudanças.

É tamanha a confusão na pauta econômica que as declaraçõe­s de Bolsonaro e sua equipe estão deixando todo mundo desorienta­do. Sobram propostas e recuos. E falta rumo certo. Talvez por isso Paulo Guedes esteja com dificuldad­es em anunciar a sua equipe de colaborado­res mais próximos nos cargos mais importante­s da equipe econômica, como Banco Central, bancos públicos e empresas estatais.

A indicação de Sérgio Moro para o Ministério da Justiça também trouxe a preocupaçã­o adicional de que o juiz possa esticar a corda com o Congresso e atrapalhar a agenda econômica.

A primeira semana de transição mostrou que, após a redoma de proteção criada pelos seus auxiliares mais próximos na sua residência em condomínio fechado na Barra da Tijuca em seguida à eleição, Bolsonaro teve um encontro nada fácil com a capital. É o “efeito Brasília”.

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