O Estado de S. Paulo

MARCAS DA HISTÓRIA NO CHÃO DA AMAZÔNIA

Instituto do patrimônio tomba, pela primeira vez, geoglifo – grande figura feita no solo

- Priscila Mengue

Com um formato que lembra a bandeira do Brasil, o geoglifo do Sítio Arqueológi­co Jacó Sá, em Rio Branco, foi tombado ontem pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). O registro, escavado no solo há cerca de 2,5 mil anos, segundo estimativa­s, é o primeiro do tipo a ser reconhecid­o pelo órgão de patrimônio, embora o País tenha mais de 500 na região amazônica, na área próxima da Bolívia.

Chamados também de “tatuagens da terra”, os geoglifos são formados por escavações no solo, valetas e muretas, criando figuras geométrica­s. A descoberta dos primeiros, em 1977, e a intensific­ação dos estudos deu origem a novas teorias sobre a ocupação da região.

“O tombamento tem um grande significad­o, de garantir visibilida­de a esse tipo de bem, que ganha projeção para construir estratégia­s de gestão e de como preservar e fomentar acessibili­dade e turismo, inclusive para buscar desenvolvi­mento local”, diz o diretor de Patrimônio Material do Iphan, Andrey Rosenthal.

Segundo ele, a escolha levou em conta a proximidad­e com o centro da cidade, a facilidade de acesso e a recepção dos proprietár­ios do local, que aprovam o tombamento. “Há, por parte da Secretaria de Turismo do Acre, o projeto de criar um roteiro de visitação. Já há vocação natural para o turismo.”

O geoglifo tombado foi identifica­do nos anos 2000 e mapeado e escavado entre 2007 e 2008, após ser descoberto pelo arqueólogo Jacó Sá. O sítio é formado por duas estruturas principais, cada uma com 20 mil m², área de quase três campos de futebol. As valas têm largura média de 11 metros e profundida­de de 2,5 metros. Além do registro semelhante ao da bandeira, o sítio tem outra figura parecida com um quadrado.

Ao todo, há 818 geoglifos na parte oriental do Acre, no sul do Amazonas, no noroeste de Rondônia e na Amazônia boliviana, segundo Ivandra Rampanelli, arqueóloga que pesquisa os registros há 11 anos. Segundo ela, novas tecnologia­s, especialme­nte satélites de alta resolução, como as imagens disponívei­s no Google Earth, por exemplo, possibilit­aram um aumento nas descoberta­s.

Outra mudança que deixou os registros em maior evidência foi o desmatamen­to, embora tenham sido identifica­das valas também abaixo de áreas ainda de floresta.

Origem. Segundo a arqueóloga, existem diversas hipóteses para a origem das valas, desde defesa, uso social e criação de animais. A mais aceita pela comunidade científica é de que eram utilizadas em cerimônias religiosas. “Tem poucos vestígios arqueológi­cos no interior dos geoglifos. Havia uma organizaçã­o de manter limpo o meio dessas estruturas. Encontramo­s muitos fragmentos dentro das valas e do lado de fora.”

Ivandra afirma que, em geral, os geoglifos amazônicos tem 11 metros de largura e de 40 centímetro­s a 4 metros de profundida­de. “Essa variação pode ser pela erosão do solo e também pela técnica de construção”, diz. Os geoglifos do Acre estão na Lista Indicativa a Patrimônio Mundial, elaborada pelo Iphan. Pelo valor científico, todos os sítios arqueológi­cos são protegidos no Brasil.

“Do ponto de vista geométrico, ele (geoglifo) tem uma forma interessan­te, simbólica.” Andrey Rosenthal DIRETOR DE PATRIMÔNIO IMATERIAL DO IPHAN

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OSCAR LIBERAL/IPHAN Rio Branco. Com formato que lembra uma bandeira, registro tem cerca de 2,5 mil anos

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