Reino Unido faz pacto sobre Brexit com UE
Dificuldades. Reino Unido e União Europeia chegam a um acordo preliminar; detalhes não foram divulgados, mas conservadores são contra a adoção de um mecanismo que na prática impede que exista uma fronteira efetiva entre a Irlanda e a Irlanda do Norte
Acordo preliminar prevê livre trânsito entre Irlandas e união alfandegária. Aprovação será desafio para a primeira-ministra Theresa May.
O Reino Unido e a União Europeia chegaram ontem a um acordo preliminar sobre as bases para o Brexit. O esboço prevê livre trânsito entre as Irlandas e uma união alfandegária que inclui, pelo menos inicialmente, Inglaterra, Escócia, Gales e Irlanda do Norte. A aprovação será um desafio para a primeira-ministra Theresa May, que se reúne hoje à tarde em Londres para discutilo. No Parlamento, oposição e aliados da coalizão e membros do Partido Conservador têm ressalvas ao projeto.
Após meses de impasse sobre em que termos o Reino Unido abandonará a União Europeia, o esboço do acordo, com mais de 400 páginas, dá à premiê a chance de evitar um Brexit não amigável, o que seria, em sua visão, caótico e desordenado.
O respaldo de integrantes anti-UE de seu gabinete ao que foi negociado com Bruxelas é incerto. Mesmo que ela convença seus ministros, ainda terá de obter o apoio do DUP – partido unionista irlandês crucial para a maioria conservadora no Parlamento – e talvez do Partido Trabalhista, também com ressalvas ao acordo para aprová-lo na Câmara dos Comuns. No pior cenário para May, seus ministros podem desertar do gabinete e uma rejeição mais ampla ao acordo pode até ameaçá-la no cargo.
Os detalhes do pacto não estavam disponíveis até a noite de ontem, mas o foco das conversas entre Londres e Bruxelas nos últimos dias tem sido a fronteira entre a Irlanda e a Irlanda do Norte. A adoção de um mecanismo chamado “backstop”, que na prática impede que exista uma fronteira efetiva entre os dois países e favorece trocas comerciais entre Irlanda e Reino Unido, desagrada aos conservadores mais eurocéticos.
O ex-chanceler Boris Johnson qualificou o acordo de “inaceitável” e disse que não aceitará um pacto que torne o Reino Unido um “Estado vassalo” da União Europeia. O deputado conservador Iain Duncan Smith, por sua vez, disse que se o acordo evitar o retorno de controles aduaneiros entre as duas Irlandas, o chamado backstop, “os dias do governo May estão contados”. Estima-se que 50 deputados conservadores de um total de 315 possam se opor ao projeto.
O líder dos trabalhistas, Jeremy Corbyn, prometeu “examinar os detalhes do acordo quando estiverem disponíveis”, mas garantiu que votará contra ele caso não esteja de acordo com as diretrizes do partido, que prezam a manutenção das benesses comerciais de que o Reino Unido hoje desfruta dentro da UE. Para o deputado trabalhista Keir Starner, dificilmente o pacto será o mais apropriado para o país.
O líder do DUP, Nigel Dodds, disse que “um acordo ditado por Bruxelas seria inaceitável”, em referência a um pacto que permita o livre trânsito na Irlanda do Norte. “Vamos esperar para ver. Parece que a premiê está desesperada por qualquer acordo”, afirmou.
O Reino Unido deve deixar a União Europeia em 29 de março. Caso não haja um acerto entre as duas partes, autoridades em Londres e Bruxelas temem um cenário caótico, com congestionamento de portos e até escassez de remédios e alimentos importados.
Se o gabinete de May endossar o acordo, chanceleres europeus devem referendá-lo no fim do mês. Em seguida, o projeto parte para aprovação na Câmara dos Comuns e no Parlamento Europeu.
Os britânicos aprovaram o Brexit num plebiscito em 2016 sem detalhes de como seria negociada a saída da União Europeia. Desde então, o governo de Theresa May tem se dividido entre os que querem manter os laços econômicos com o continente e os que querem uma ruptura.
Nas últimas semanas, o tema da fronteira irlandesa ampliou os temores dos eurocéticos de que a ausência de controle migratório na Irlanda do Norte una o Reino Unido indefinidamente às regras alfandegárias europeias, dificultando acordos de livre-comércio com outros países.
Na sexta-feira, o ministro de Transportes, Jo Johnson, irmão do ex-chanceler Boris Johnson, renunciou repentinamente, dizendo que o acordo Brexit que estava sendo finalizado “seria um erro terrível”. Ele defendeu a realização de um segundo plebiscito.
No fim de outubro, mais de meio milhão de pessoas fizeram um protesto ruidoso em Londres para solicitar uma nova votação sobre os termos do acordo final, algo que é improvável.