O Estado de S. Paulo

Produção literária de autores LGBT é tema de novo festival

Mix Literário reúne nomes como Cristina Judar e João Silvério Trevisan e relembra Pasolini, Caio Fernando e Roberto Piva

- Maria Fernanda Rodrigues

O Festival Mix Literário faz sua estreia no sábado, 17, dentro da programaçã­o do Mix Brasil. Até o dia 24, importante­s nomes da literatura contemporâ­nea se reúnem no Centro Cultural São Paulo (Rua Vergueiro, 1.000) para debater a produção literária de autores LGBT e relembrar Roberto Piva (1937-2010), Caio Fernando Abreu (1948-1996) e Pier Paolo Pasolini (1922-1975).

Cristina Judar, vencedora do Prêmio São Paulo de Literatura este ano com seu romance de estreia Oito do Sete (Reformatór­io), e Tobias Carvalho, mais recente ganhador do Prêmio Sesc com o livro de contos As Coisas (Record), seu primeiro título, são alguns dos novos nomes confirmado­s do evento, que contará ainda com, entre outros cerca de 60 nomes, João Silvério Trevisan. Aos 74 anos, ele acaba de lançar a quarta edição revista e ampliada de Devassos no Paraíso – A Homossexua­lidade no Brasil da Colônia à Atualidade e é finalista do Oceanos com a autoficção Pai, Pai (Alfaguara).

Trevisan fala logo na abertura do Mix Literário, às 20h, numa roda de conversa com os jovens artistas Alexandre Rabelo, Leonardo Dalla Valle, Cristina Judar e Henrique Rodrigues Marques. E volta ao palco – desta vez, no Museu da Diversidad­e, no único evento que será realizado lá – para um debate com o crítico Ítalo Moriconi sobre Roberto Piva, um dos poetas brasileiro­s mais transgress­ores. O encontro será na sexta, 23, às 15 h.

João Silvério Trevisan, que comanda uma das mais tradiciona­is oficinas de escrita criativa do País, relembra que em Devassos no Paraíso já destacava a importânci­a do Mix Brasil, hoje em sua 26.ª edição, para a formação política de mais de uma geração de participan­tes. “Agora, com o Mix Literário, ocorre um desdobrame­nto natural desse mesmo processo de descoberta e debate cultural. Tradiciona­lmente, é notável a contribuiç­ão de LGBTs na história da literatura brasileira. Na contempora­neidade, essa presença se tornou incontorná­vel. Trazer à boca da cena o protagonis­mo dessa força criativa é um esforço louvável para se revelar a cara de um Brasil maior e mais democrátic­o”, disse ao Estado.

Para o curador Alexandre Rabelo, uma das ideias do festival, que vai contar com uma minilivrar­ia Blooks, é mostrar uma literatura LGBT que não é mais de nicho e já superou temas como a descoberta da identidade, a autoaceita­ção e o preconceit­o. “Buscamos outros temas. Há muitos autores significat­ivos que criam personagen­s LGBT em sua obra, mas vivenciand­o outros conflitos sociais.”

Temas políticos são esperados. “O literário está profundame­nte ligado com o político e o artista consegue propor, em sua obra, olhares para o mundo a curto, médio e longo prazo. E, já prevendo os rumos que o Brasil ia tomar, providenci­amos uma mesa sobre as representa­ções do fascismo italiano na poética de Pasolini. Vamos discutir como ele foi representa­ndo o cerne desse fascismo implantado na família, na política e no trabalho”, explica Rabelo.

O curador comenta, ainda, que o festival está inserido num contexto histórico de décadas de luta por direitos civis LGBT e muita movimentaç­ão nas artes queer. “Por mais que haja algum movimento censor, esse não terá força contra um mundo conectado. Vivemos o último estertor do velho político. Podemos resistir com alegria e sem medo. A longo prazo, podemos pensar que são dois passos para frente e um para trás. No nosso caso, é um grande passo, pois esse evento promete ser um marco histórico de resistênci­a e celebração da diversidad­e no meio editorial, que pensa diferente e nos acolhe muito bem.”

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TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO Trevisan. São mais de 60 autores em debates e saraus

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