O Estado de S. Paulo

Argentina descarta retirar submarino do mar por falta de recursos técnicos

Juíza responsáve­l pelo caso decide analisar as 67 mil imagens feitas pela empresa que encontrou o ARA San Juan e criar maquete para determinar o que levou ao acidente; desconfian­ça a partir de depoimento­s é de antiga falha mal reparada

- MAR DEL PLATA, ARGENTINA

O governo da Argentina reconheceu ontem que “não há meios técnicos ou recursos” para retirar o submarino ARA San Juan do oceano. Ele foi encontrado na sexta-feira, após um ano e um dia de buscas, em uma área de cânions marítimos, a 907 metros de profundida­de. A admissão da impossibil­idade frustrou algumas das famílias dos 44 tripulante­s que tinham esperanças de recuperar os corpos dos seus parentes.

“Eu não vou criar a expectativ­a de que se pode desencalha­r o submarino, porque não pode”, disse o ministro da Defesa da Argentina, Oscar Aguad, à Rádio Mitre. “Não temos meios nem recursos para resgatá-lo. Aliás, não deve existir no mundo tecnologia capaz de trazer à superfície uma massa de 1.300 toneladas presa a 907 metros de profundida­de.”

As palavras do ministro revoltaram parentes das vítimas que aguardaram 367 dias por informaçõe­s. Luis Tagliapiet­ra, pai do tenente de corveta Alejandro Tagliapiet­ra, um dos tripulante­s do San Juan, resumiu em uma mensagem divulgada pelos meios de comunicaçã­o os sentimento­s das famílias. “Não tenho palavras para descrever, sinto uma profunda dor e angústia, mas, ao mesmo tempo, sabemos onde estão e é o primeiro passo para saber a verdade e o que aconteceu”, declarou.

A juíza federal encarregad­a da investigaç­ão, Marta Yáñez, também afirmou que não pretende pedir a remoção do submarino. “Estamos falando de um barco que pesa 2.500 toneladas com água, então não vou arriscar perder vidas humanas para resgatálo”, disse ontem.

Ela pretende analisar, com peritos, todas as imagens registrada­s pelo navio Seabed Constructo­r, da empresa americana Ocean Infinity, que localizou o submarino. “São 67 mil fotografia­s e filmes que serão enviados nos próximos dias para análise”, disse. A partir das análises, a ideia é criar uma maquete em solo que possa auxiliar no trabalho de investigaç­ão sobre o que levou ao acidente.

Para a juíza, só se justifica tentar retirar o submarino do fundo do mar se for essencial para determinar o que aconteceu há um ano. “Se com o que conseguirm­os reconstrui­r com as imagens e vídeos, entendermo­s que existe a necessidad­e de retirar o submarino da água, seria preciso um estudo para corroborar se é factível economicam­ente e tecnicamen­te”, acrescento­u a juíza ao jornal La Nación.

A empresa informou que levaria entre quatro e cinco dias para analisar as 67 mil imagens e entregar o relatório final da descoberta com análise de especialis­tas, conforme estabeleci­do no contrato. “As imagens precisas do submarino serão prova no processo, e garantem um grau muito mais alto de certeza sobre o que aconteceu e quais as causas do acidente do que com depoimento­s de pessoas que não estavam no local e suporte documental”, explicou Marta.

Ao jornal Clarín, ela afirmou que vai começar a chamar os parentes da tripulação para depoimento­s, e já tem evidências das causas do acidente, deixando em aberto a possibilid­ade de negligênci­a.

Quase 80 depoimento­s já foram colhidos no caso, entre eles os de ex-tripulante­s e autoridade­s da Marinha. “Em julho de 2017, quatro meses antes da última viagem, o submarino havia tido um incidente parecido com a válvula do snorkel. É preciso determinar se isso ocorreu de novo”, afirmou a juíza Marta.

O último contato com o submarino ocorreu em 15 de novembro de 2017, quando ele voltava de Ushuaia, no extremo sul da Argentina, e se dirigia para o Mar del Plata. Segundo uma comissão investigad­ora do Ministério da Defesa, uma série de eventos levou o submarino a sofrer uma implosão.

Tudo teria começado com um incêndio no tanque de bateria localizado na proa após a entrada de água através do snorkel. O fogo forçou a ARA San Juan a emergir, à noite e no meio de uma tempestade. Tirar a fumaça e o hidrogênio pode ter levado horas, no escuro e com clima hostil.

 ??  ?? Luto O presidente da Argentina, Mauricio Macri, decretou luto oficial de três dias e prometeu uma investigaç­ão profunda para descobrir “a verdade” sobre a tragédia com a embarcação
Luto O presidente da Argentina, Mauricio Macri, decretou luto oficial de três dias e prometeu uma investigaç­ão profunda para descobrir “a verdade” sobre a tragédia com a embarcação

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil