O Estado de S. Paulo

Americano é morto a flechada em ilha da Índia

John Allen Chau tinha planos de converter ao cristianis­mo moradores de ilha isolada; governo proíbe contato com tribo

- PORT BLAIR, ÍNDIA / NYT

O americano John Allen Chau, de 27 anos, tinha sonhado com seu retorno às Ilhas Andaman. Ele sabia que o que estava prestes a fazer era perigoso. Mesmo assim, em um pequeno caiaque, seguiu para a ilha remota de Sentinela do Norte. O local, uma das partes mais isoladas da Índia, é habitado por uma pequena e altamente enigmática tribo cujos membros atacam pessoas simplesmen­te por pisarem em suas praias.

Pescadores locais tentaram convencer Chau a desistir. Até hoje, pouquíssim­os conseguira­m ir e voltar com vida de Sentinela do Norte, habitada pela tribo frequentem­ente descrita como a mais isolada do planeta, que rejeita qualquer contato com o mundo exterior. Além disso, uma regulament­ação do governo indiano proíbe qualquer interação com os moradores da ilha.

No entanto, Chau não ouviu ninguém. Ele seguiu em seu caiaque com uma Bíblia. O que aconteceu depois ainda não está totalmente claro, mas a polícia indiana diz ter uma certeza: Chau foi morto.

Autoridade­s indianas disseram ontem que o americano foi atingido por flechas disparadas pelos nativos assim que chegou em terra firme e seu corpo ainda estava na ilha.

Pescadores que o ajudaram no caminho até Sentinela do Norte disseram à polícia que tinham visto membros da tribo arrastando o corpo na praia. “Foi uma aventura no lugar errado”, disse Dependra Pathak, chefe de polícia das Ilhas Andaman e Nicobar. “Ele certamente sabia que entrava em área proibida.”

Pathak diz que Chau era do Estado de Washington e, possivelme­nte, tentaria converter a tribo ao cristianis­mo. Pouco antes de partir em seu caiaque, Chau deu aos pescadores uma longa carta. Nela, segundo a polícia, ele escreveu que Jesus havia lhe dado força para ir aos lugares mais restritos da Terra.

As Ilhas de Andaman e Nicobar, no Oceano Índico, são cheias de palmeiras e cercadas por corais. O governo controla o acesso com muito cuidado: muitas das mais de 500 ilhas que formam o complexo têm o acesso proibido.

No dia 14, Chau contratou um barco de pesca em Port Blair, a principal cidade de Andaman, para levá-lo até Sentinela do Norte. Ele esperou escurecer para não ser detectado pelas autoridade­s.

T.N. Pandit, um antropólog­o que visitou Sentinela do Norte várias vezes, entre 1967 e 1991, disse que o povo local – cerca de 50 pessoas que caçam com lanças e flechas feitas de pedaços de metal levados pela maré até suas praias – era mais hostil aos desconheci­dos do que outras comunidade­s indígenas que vivem em Andaman.

Histórico. De acordo com os pescadores que o ajudaram, Chau colocou seu caiaque na água a menos de meio quilômetro da ilha e remou em direção a Sentinela do Norte. Os pescadores disseram que os indígenas atiraram flechas na direção do americano e ele recuou.

Ele teria tentado chegar à ilha várias vezes nos dois dias seguintes, segundo a polícia, oferecendo presentes como uma pequena bola de futebol, uma

Aventura

“Foi uma aventura no lugar errado. Ele certamente sabia que entrava em área proibida, porque já tinha visitado o local ao menos três vezes” Dependra Pathak

CHEFE DE POLÍCIA NAS ILHAS

ANDAMAN E NICOBAR

linha de pesca e uma tesoura. No entanto, na manhã do dia 17, os pescadores disseram que viram os moradores da ilha carregando o corpo do americano.

Sete pessoas que ajudaram Chau a chegar à ilha foram presas e acusadas de homicídio culposo e violações de regras que protegem tribos aborígines. Outro caso foi registrado contra “pessoas desconheci­das” por matar Chau.

Autoridade­s indianas já disseram, no entanto, que é praticamen­te impossível processar membros das tribos protegidas em razão da inacessibi­lidade da área e da decisão do governo de não interferir em suas vidas.

Em um post em um blog escrito há alguns anos, Chau afirmou que já treinou futebol, trabalhou para a American Corps e era um “explorador em seu coração”. A polícia da Índia afirmou que ele já havia visitado Andaman pelo menos três vezes no passado.

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SARAH PRINCE/AP Flechado. O missionári­o John Allen Chau (D), meses antes de viajar a arquipélag­o da Índia
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INFOGRÁFIC­O/ESTADÃO

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