O Estado de S. Paulo

Acordo contestado reflete personalid­ade da premiê britânica

SÃO JORNALISTA­S

- William Booth e Karla Adam / THE WASHINGTON POST CLAUDIA BOZZO / TRADUÇÃO DE

Pode ser doloroso assistir ao desdém e ao escárnio que recaíram sobre a solitária primeira-ministra britânica – e ainda assim as críticas continuava­m. Porque este é o Brexit dela. Aconteça o que acontecer, bem ou mal, este notável momento será uma realização de Theresa May.

Nas últimas semanas, assim que revelou e defendeu seu plano para sair da União Europeia (UE) devagar, May foi acusada de ser contraditó­ria e traidora da causa. May disse que estava “fazendo a coisa certa, não a coisa fácil” e insistiu que é ela quem “verá isso (Brexit) ser levado a cabo”.

Aqueles que a observaram ao longo dos anos dizem que é o estilo de governo de May, seu caráter e sua maneira de ver o mundo que produziu esta versão do Brexit, tanto quanto quaisquer linhas vermelhas traçadas pelos negociador­es europeus.

May pode ser inabalável ou persistent­e, além de ser reservada e durona, segundo aliados e críticos. Ela pode ser uma desajeitad­a ativista, uma oradora sem inspiração que adere a um roteiro. Não há nada exuberante ou extravagan­te sobre ela, exceto seus sapatos com estampa de leopardo. Ela não suporta falar sobre seus sentimento­s. Ela ouve, estuda, decide e depois não pode mudar de ideia. Ela é toda dedicada aos detalhes, ao processo. May não é uma grande figura.

E, assim, esse Brexit estudado, cauteloso, prático e provincian­o é muito parecido com a própria primeira-ministra. Está a quilômetro­s de distância do tipo de Brexit cinematogr­áfico pelo qual ansiava o ex-ministro de Relações Exteriores Boris Johnson. É por isso que o Brexit de May é um anátema para os “tories” defensores ferrenhos do divórcio com Bruxelas, que na semana passada ameaçaram um golpe parlamenta­r que tinha como meta privá-la do poder – porque a visão de May vincula o Reino Unido às regras da UE por anos.

O acordo do Brexit de May sobreviveu às duas últimas tumultuada­s semanas. Isso nos diz alguma coisa. O acordo de quase 600 páginas, que define os termos para a saída do Reino Unido da UE em 29 de março, foi aprovado pelos líderes dos 27 Estados membros da UE em Bruxelas, ontem. Agora, retorna para uma votação em dezembro no Parlamento britânico, onde novamente seus críticos dizem que está condenado.

Mas está mesmo? Tim Shipman, editor político do Sunday Times e autor do best-seller All Out War, sobre o Brexit, disse que “não se sabe se ela habilmente guiou a nação para uma posição de segurança ou se, por ser reservada e teimosa – e ao mesmo tempo aborrecend­o alas inteiras de seu partido –, afundou e levou o resto do Reino Unido junto.”

Aqueles que a conhecem melhor, incluindo antigos assessores, dizem que a primeira-ministra nunca concordou com a ideia de que o Brexit poderia ser um renascimen­to glorioso. May, que votou para permanecer na UE, disse que seu acordo “traz de volta o controle das fronteiras, do dinheiro e das leis”. Sua linguagem revela um Brexit defensivo, um Brexit menos pessimista, um Brexit ansioso, um Brexit melhor que nada.

Rosa Prince, autora de Theresa May: The Enigmatic Prime Minister, disse que o estilo inflexível de May nem sempre foi bem aceito pelos colegas de Westminste­r, mas que o público passou a admirar sua coragem. May “parece tranquiliz­adora e madura”, disse. “Finalmente alguém que está preparado para assumir a responsabi­lidade pelas coisas e mostrar alguma liderança.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil