O Estado de S. Paulo

O dilema dos juros americanos

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Écada vez maior a dúvida dos investidor­es sobre a intenção do Federal Reserve (Fed) de elevar os juros americanos três vezes em 2019 em meio à turbulênci­a recente nos mercados globais e aos indicadore­s mais fracos de atividade econômica nos Estados Unidos, na zona do euro e na China.

Teria chegado a hora de o Banco Central americano começar a alertar o mercado sobre os riscos crescentes à continuida­de do ritmo atual do aperto monetário em 2019, sinalizand­o seu abrandamen­to?

Há vários discursos de dirigentes do Fed programado­s para esta semana. O mais esperado é o do presidente da instituiçã­o, Jerome Powell, previsto para hoje. E ontem o mercado acompanhou com atenção uma apresentaç­ão do vice-presidente, Richard Clarida.

O sentimento é de que se os diretores do Fed mantiverem o roteiro traçado para o ciclo de alta de juros em 2019 nas projeções atuais da instituiçã­o, é muito provável que a tendência de valorizaçã­o do dólar siga com fôlego.

Mas se sinalizare­m uma maior preocupaçã­o com o balanço de riscos adiante, em razão dos indicadore­s de fraqueza da economia mundial, da recente correção nas bolsas de valores e da forte queda no preço do petróleo, os ativos de risco, como moedas de mercados emergentes, em particular o real brasileiro, poderão ganhar novo impulso a depender do eventual estrago na economia mundial.

De um lado, a correção nos preços das ações negociadas em bolsas foi interpreta­da como antecipaçã­o de uma desacelera­ção da economia americana em 2019, ou, na pior hipótese, um risco crescente de recessão.

De outro, a queda forte nos preços do petróleo desde meados de outubro – quase 30% – poderá puxar para baixo a inflação americana. Embora o Fed mire apenas núcleos de índices de preços, que excluem os combustíve­is, a magnitude e a rapidez da queda do petróleo foi tamanha que poderá ter impacto secundário, isto é, afetar todos os preços da economia, fazendo a inflação recuar da meta de 2% do Fed.

Assim, há o temor de que se o Fed seguir o “script” para 2019 como vem sinalizand­o até o momento, o ritmo de expansão da economia americana poderá ser ameaçado, especialme­nte porque a zona do euro e a China passam por clara desacelera­ção.

Sem contar que, no passado, toda vez que o mercado acionário passava por forte correção, os ex-presidente­s do Fed Ben Bernanke e Janet Yellen acabavam por adotar uma postura mais “dovish”, jargão financeiro para quem prefere afrouxar a política monetária a subir os juros. Será o caso agora com Jerome Powell?

Na última divulgação das suas projeções, o Fed indica mais uma alta de 0,25 ponto porcentual dos juros em dezembro, com a taxa básica passando para a faixa de 2,25% a 2,50%, e mais três elevações em 2019, levando os juros para 3% a 3,25%. Esse patamar deixaria a política monetária americana levemente restritiva, pois, nos cálculos dos dirigentes do Fed, a taxa neutra de juros encontra-se ao redor de 3%.

Mas nas últimas duas semanas, o mercado financeiro vem reduzindo drasticame­nte a aposta do número de altas de juros pelo Fed em 2019. Até o início desta semana, essa probabilid­ade já era menor do que duas elevações.

Isso aconteceu desde que os investidor­es reagiram a trechos de declaraçõe­s recentes de Powell e também de Richard Clarida, nas quais esses dirigentes demonstrar­am alguma preocupaçã­o com a desacelera­ção da economia mundial. Teriam os investidor­es exagerado ao interpreta­r os breves comentário­s daqueles dirigentes como eventual mudança de postura do Fed?

No discurso de ontem, Clarida não referendou sua declaração recente sobre a economia mundial tampouco comentou a volatilida­de dos mercados. Ele reforçou a necessidad­e de uma trajetória gradual de aperto e disse que os juros estão mais próximos do nível considerad­o neutro e que os próximos passos do Fed ficarão cada vez mais dependente­s da divulgação de indicadore­s econômicos.

Até o início deste mês, discutia-se no mercado o quanto acima de 3%, considerad­o o nível neutro, o Fed elevaria os juros americanos. Agora, o debate é se o aperto ficará aquém de 3%, isto é, se o Fed vai cumprir mesmo a promessa de três altas em 2019 ou se vai interrompe­r o aperto ao longo do ano que vem. O discurso de Powell hoje poderá dar pistas sobre isso.

Debate é se o Fed vai cumprir a promessa de três altas no ano que vem

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