O Estado de S. Paulo

Verissimo

- LUIS FERNANDO VERISSIMO ESCREVE ÀS QUINTAS-FEIRAS E AOS DOMINGOS

A questão agora é saber que Bolsonaro tomará posse em janeiro, o cospe fogo ou o razoável.

Num discurso que o Fernando Henrique chamou de inacreditá­vel, transmitid­o poucos dias antes da sua eleição, o candidato Bolsonaro rugiu que no seu governo os “marginais vermelhos” seriam banidos do País e seus opositores só teriam uma escolha, aderir ou ir para a cadeia apodrecer junto com o Lula. Mesmo descontand­o-se a empolgação do momento, comum em comícios – o pessoal às vezes exagera um pouco, como disse o Sérgio Porto quando lhe contaram que andavam espalhando que ele era homossexua­l – o discurso era de preocupar, e não apenas o Fernando Henrique. Já tinha marginal vermelho fazendo as malas, ou aderindo. Mas dias depois, eleito, Bolsonaro fez um chamamento pela união nacional.

A questão é saber que Bolsonaro tomará posse em janeiro, o cospe fogo ou o razoável. O ministério já conhecido só sugere que vem aí uma pizza mezzo obscuranti­sta e mezzo imprevisív­el, principalm­ente no que toca ao comportame­nto de uma direita com raiva da esquerda, e com poder. Um dos novos ministros disse que a presença de uns poucos militares no governo não significav­a nada, muito menos uma militariza­ção sorrateira. Ok, só que quem disse isso foi o quarto militar convocado pelo Bolsonaro. Quando perguntara­m ao Sérgio Moro por que o chefe da Casa Civil da Presidênci­a não tinha sentido todo o peso da impiedosa Lava Jato no lombo pelo seu envolvimen­to com caixa dois, Moro respondeu: “Porque ele pediu desculpa”. De onde se deduz que o Lula só recebeu o rigor desproporc­ional da lei por falta de educação.

É impossível discutir com 60 milhões de votos. Bolsonaro foi eleito limpamente. Que seja e nos faça feliz, e viva a democracia. Pena que seu eleitorado não tinha como saber que um dos seus ministros seria um para o qual aqueciment­o global e ambientali­smo são coisas de comunistas, também responsáve­is pelo distanciam­ento entre os homens e Deus, que outro ministro foi imposto pelos evangélico­s, que não demorará muito para decretarem que o criacionis­mo desbanque o evolucioni­smo nos livros das crianças, e que nos livros de história os 20 anos de ditadura passem a ser chamados de movimento de tropas, segundo a teoria Toffoli.

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