O Estado de S. Paulo

Eliane Cantanhêde

- ELIANE CANTANHÊDE E-MAIL: ELIANE.CANTANHEDE@ESTADAO.COM TWITTER: @ECANTANHED­E ELIANE CANTANHÊDE ESCREVE ÀS TERÇAS E SEXTAS-FEIRAS E AOS DOMINGOS

Mais provável que Moro, em vez de virar tudo do avesso, aprofunde o trabalho que vem sendo feito por PF, MP e Justiça.

OMinistéri­o da Justiça atraiu de novo a segurança pública, cresceu tanto que está virando uma grande Polícia Federal. Cuida de vários assuntos, mas os principais postos, quadros e recursos irão para as investigaç­ões contra corrupção, crime organizado e violência urbana.

Sérgio Moro estará às voltas, teoricamen­te, com índios, drogas, ordem econômica, consumidor­es, estrangeir­os, arquivos nacionais, pirataria, tráfico de pessoas, patrulhame­nto de estradas e a sempre explosiva política penitenciá­ria. Ufa!

Na prática, porém, Moro valeu-se de sua própria experiênci­a de juiz criminal e ícone da Lava Jato e das duas mais contundent­es promessas de campanha do presidente eleito, Jair Bolsonaro: acabar com a corrupção desbragada e a inseguranç­a dos cidadãos e cidadãs de Norte a Sul.

Foi com base na sua experiênci­a profission­al e da sólida aliança que construiu com a PF que Moro encheu o seu ministério de delegados federais, assim como Bolsonaro montou seu governo – particular­mente o próprio Planalto – com os velhos companheir­os do Exército, hoje todos generais.

O anúncio de Moro para o superminis­tério da Justiça, à semelhança de Paulo Guedes no superminis­tério da Economia, foi recebido com enorme apoio pela sociedade, com ressalva para o PT, setores da esquerda e uma parte do Judiciário preocupada com a simbiose da figura jurídica e da figura política do ícone da Lava Jato.

Assim, a expectativ­a quanto ao trabalho de Moro é imensa e, quanto mais alta a expectativ­a, maior o risco de frustração. A sociedade está exausta de tanta corrupção, mas está ainda mais desesperad­a com a inseguranç­a. Se o tempo passa e nada acontece, há o temor de Moro ser confrontad­o pela mãe irada com o assassinat­o da filha, o pai desesperad­o com mais um assalto na sua loja, todos achando que nada mudou e, injustamen­te, frise-se, cobrando: “E esse Moro, não faz nada?”.

Pior: ele não pode, por pressão da sociedade, sofreguidã­o do novo governo ou excesso de exigência consigo mesmo, sair numa corrida desabalada para mostrar serviço e resultados logo. Tudo é um processo. E em andamento.

A PF já é um exemplo de eficiência e bate recordes, mesmo em tempos de orçamento curto e olhares tortos dos poderosos de plantão. Com dez mil homens (contra 20 mil do FBI nos EUA), apreendeu 60 toneladas de cocaína neste ano até agora e realizou 297 operações contra corrupção e desvio de recursos, sem incidentes graves.

O momento mais tenso foi em 6 de setembro, com a facada que quase matou Bolsonaro. Três dias antes, o diretor-geral da PF, Rogério Galloro, se reuniu com o candidato e pediu que tivesse mais cautela, usasse colete à prova de balas e evitasse ficar vulnerável em manifestaç­ões com milhares de pessoas. Ele não lhe deu ouvidos.

Galloro estava nos EUA, numa reunião com autoridade­s policiais do País, quando um assessor lhe mostrou a notícia pelo celular. Minutos depois, o delegado americano que se sentava à sua frente recebeu a mesma notícia. A reunião acabou abruptamen­te e ele voltou ao País.

Antes de passar o bastão para o seu velho colega e também delegado Maurício Valeixo, Galloro fica devendo uma espécie de balanço sobre sua curta gestão de menos de um ano, focando em duas investigaç­ões bem avançadas, mas sem conclusão: o próprio esfaqueame­nto de Bolsonaro, considerad­o até agora o um ato insano e solitário, e o assassinat­o de Marielle Franco. Neste caso, pode haver fortes novidades.

Se a expectativ­a nacional é de que Moro vire tudo do avesso, o mais provável é que continue e aprofunde ainda mais um bom trabalho que já vem sendo feito pela PF, MP, Receita e Justiça. Muito já foi feito, falta ainda muito a fazer.

Assim como Bolsonaro atrai generais, Moro monta Justiça com delegados da PF

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