O Estado de S. Paulo

Proposta de indulto natalino exclui condenado por corrupção

Minuta também prevê que perdão só pode ser concedido a quem tiver cumprido pelo menos um terço da pena

- Breno Pires /

Nova proposta feita pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciá­ria para a formulação do decreto de indulto natalino deste ano endurece as regras para que um condenado obtenha o perdão da pena e veta o indulto a corruptos. A minuta, que está com o governo federal, também prevê que o perdão só pode ser concedido a quem tiver cumprido um terço da pena, que não pode ser superior a oito anos. O presidente Temer – que não precisa necessaria­mente seguir essa proposta – aguarda definição do STF sobre o indulto concedido em 2017, que pode beneficiar presos da Lava Jato e está sob liminar do ministro Luis Roberto Barroso. Anteontem, o julgamento da liminar foi interrompi­do quando já havia maioria para derrubá-la. O texto apresentad­o pelo conselho ao governo neste ano também amplia a lista de crimes para os quais não pode haver indulto.

Ainda sem uma definição no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a validade do indulto natalino editado pelo presidente Michel Temer no ano passado, o governo já tem em mãos a proposta que serve de base para a formulação do decreto deste ano. A minuta apresentad­a pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciá­ria (CNPCP) endurece as regras para um condenado obter o perdão da pena e incorpora restrições impostas em decisão liminar do ministro do STF Luís Roberto Barroso, como o veto do indulto a condenados por corrupção.

O Supremo já tem maioria para derrubar a liminar e manter o indulto de Temer de 2017, que admitia o perdão a condenados por crimes sem violência – como corrupção – que tivessem cumprido um quinto da pena até 25 de dezembro de 2017, ponto contestado pela Procurador­ia-Geral da República e suspenso por Barroso. O julgamento, porém, foi interrompi­do anteontem após pedido de vista do ministro Luiz Fux. Desta forma, as regras definidas por Temer continuam suspensas até a retomada do julgamento.

Na proposta deste ano, além de vedar o benefício a condenados por corrupção, há a previsão de que o perdão só pode ser concedido a quem tiver cumprido um terço da pena e sob a condição de a condenação não ser superior a oito anos.

Em comparação com a proposta do próprio conselho de 2017, o texto deste ano também amplia a lista de crimes pelos quais não pode haver o indulto, passando a incluir aqueles cometidos contra agentes de segurança, o estupro a vulnerável e o homicídio culposo em acidentes de trânsito.

Uma inovação da proposta é condiciona­r o indulto ao trabalho

e ao estudo, se houver oferta e estrutura para isso na administra­ção prisional. Também prevê que os contemplad­os fiquem sujeitos à perda do benefício caso cometam novo crime no prazo de dois anos.

O conselho mantém a sugestão de proibir o indulto para quem teve a pena de prisão substituíd­a por multa – o que foi descartado por Temer no ano passado, mas reformado por Barroso. A exceção é para presos em “extrema carência material”.

Trâmite. A proposta redigida pelo Conselho já está em análise pela área jurídica do Ministério da Segurança Pública. O ministro Raul Jungmann ainda examinará o texto, que pode passar por modificaçõ­es antes de ser enviado ao Planalto. O presidente não precisa necessaria­mente seguir a proposta, e pode alterá-la, como fez em 2017.

O conselho é ligado ao Ministério da Justiça e composto por 13 integrante­s, entre professore­s e profission­ais da área do Direito, além de representa­ntes da comunidade e dos ministério­s da área social. Eles têm mandato de dois anos.

Previsto na Constituiç­ão da República, o indulto natalino

voltou a ser criticado ontem pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro, que já prometeu não conceder o benefício em seu governo.

O presidente eleito declarou ter avaliado com “bastante tristeza” o indulto natalino de Temer. Mais cedo, ele defendeu que condenados cumpram integralme­nte suas penas.

“Fui escolhido presidente do Brasil para atender aos anseios do povo brasileiro. Pegar pesado na questão da violência e criminalid­ade foi um dos nossos principais compromiss­os de campanha. Garanto a vocês, se houver indulto para criminosos neste ano, certamente será o último”, disse Bolsonaro.

Ontem, o futuro ministro da Justiça, Sérgio Moro, fez coro à crítica, mas disse que não é contra a medida. “Respeito enormement­e o Supremo Tribunal Federal

e qualquer decisão a ser tomada no plenário será respeitada. Mas, na linha que afirmada pelo presidente eleito, esse será o último indulto com tão ampla generosida­de”, disse. “Espero que o indulto a ser editado neste ano não tenha o mesmo perfil do ano passado.”

O presidente do CNPCP, Cesar Mecchi Morales, reconhece que um presidente pode deixar de oferecer o indulto enquanto estiver no cargo, mas não acabar com o instituto jurídico por ser parte da Constituiç­ão. Ele defendeu a proposta do conselho de 2018. “Algumas ideias amadurecem ao longo dos anos. Procuramos aperfeiçoa­r a proposta do ano passado”, disse, destacando o indulto condiciona­do a trabalho e estudo.

Para o ex-presidente do Supremo Carlos Ayres Britto, é preciso evitar o extremo entre o indulto de Temer e o desejo de Bolsonaro de não aplicar mais o benefício previsto na Constituiç­ão. “Você não pode pegar um instituto de direito constituci­onal, uma figura de direito explicitam­ente constituci­onal e dizer ‘não vou aplicar isso’. Então para que a Constituiç­ão criou a figura do indulto? Nem tanto ao mar, nem tanto à terra”, disse.

“Pegar pesado na questão da violência e criminalid­ade foi um dos nossos principais compromiss­os (...) se houver indulto para criminosos neste ano, será o último.” Jair Bolsonaro

PRESIDENTE ELEITO

 ?? CLAUBER CLEBER CAETANO/PR ?? Encontro. O presidente Michel Temer participa de reunião informal do Brics, em Buenos Aires, na Argentina
CLAUBER CLEBER CAETANO/PR Encontro. O presidente Michel Temer participa de reunião informal do Brics, em Buenos Aires, na Argentina

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