O Estado de S. Paulo

O exército de Bolsonaro

Mudança de estratégia tem como objetivo garantir apoio em votações no Congresso

- Vera Rosa / BRASÍLIA Daniel Weterman

O presidente eleito, Jair Bolsonaro, começou a se aproximar dos partidos para obter apoio no Congresso, contrarian­do a retórica de campanha. Após enfrentar protestos de aliados que até agora não foram contemplad­os com ministério­s, Bolsonaro tenta compensar os insatisfei­tos, prometendo indicações em secretaria­s e até no segundo escalão. A mudança de estratégia foi desenhada para enfrentar as pressões políticas por cargos.

A justificat­iva de Bolsonaro é a de que algumas concessões têm sido feitas em nome da “governabil­idade”. Mesmo assim, ele mantém o discurso de que nenhum ministério será preenchido pelo modelo da “porteira fechada”, jargão usado para se referir à ocupação de todos os assentos de uma pasta pelo mesmo partido.

Na tentativa de quebrar resistênci­as e acenar para seus antigos pares na Câmara, Bolsonaro vai se reunir com várias bancadas, a partir da próxima semana. Na terça-feira, por exemplo, ele conversará com deputados do MDB e do PRB no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), sede da equipe de transição, enquanto o futuro ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, estará com parlamenta­res do PSDB na Câmara. O encontro com o PR foi marcado para quarta.

Ao confirmar ontem a intenção de criar pontes com os partidos no Congresso, Bolsonaro disse que espera negociar saídas para as crises ética e econômica. “Devemos sair dessa crise juntos (porque) o presidente sozinho não pode fazer nada”, afirmou ele. “Se nós dermos errado, todo mundo perde”, emendou, após visitar o Santuário da Canção Nova, em Cachoeira Paulista (SP), no Vale do Paraíba.

Com novas críticas aos governos de Cuba e da Venezuela, o presidente eleito repetiu que, se a sua gestão não der certo, “todos sabem quem voltará”, em uma referência ao PT.

Irritação. Até agora, Bolsonaro anunciou nomes para 20 ministério­s, sendo seis militares, embora na campanha dissesse que faria um governo com apenas 15 pastas. Atualmente, são 29. Algumas escolhas provocaram descontent­amento de aliados, sobretudo entre evangélico­s.

“Eu não fiz campanha prometendo nada para ninguém. Pretendemo­s aproveitar as boas pessoas. Agora, não podemos dar ministério para todo mundo”, reagiu o presidente eleito.

Após rejeitar indicações da bancada evangélica para o novo Ministério da Cidadania, a ser ocupado pelo deputado Osmar Terra (MDB-RS), Bolsonaro convidou a advogada e pastora Damares Alves para chefiar Direitos Humanos, Família e Mulheres. Achou que estivesse resolvendo o problema, mas o convite causou mal estar porque Damares é assessora lotada no gabinete do senador Magno Malta (PR-ES).

Amigo de Bolsonaro, Magno quase foi vice da chapa do PSL, mas acabou concorrend­o à reeleição e perdeu. Esperava ser ministro da Cidadania ou até mesmo ir para o Palácio do Planalto, na Secretaria de Governo. Até agora, não foi chamado para compor a equipe. “O Magno Malta é uma pessoa que me ajudou muito, que eu respeito. Não vai ficar abandonado; ele tem como participar do governo em outra função”, disse Bolsonaro. “Mas, infelizmen­te, os ministério­s estão se esgotando.”

O deputado Hidekazu Takayama (PSC-PR), coordenado­r da Frente Parlamenta­r Evangélica, negou a pressão por nomeações. “Não estamos a barganhar cargos, muito embora entendamos que a composição de um quadro técnico e preparado auxiliará na nova forma de governar”, disse à Coluna do Estadão.

Depois de reclamarem do peso do DEM, que ocupará três ministério­s (Casa Civil, Agricultur­a e Saúde), potenciais aliados de Bolsonaro, a maior parte do Centrão, também se queixam do fato de o MDB do presidente Michel Temer ter conquistad­o a pasta de Cidadania.

“Não há alinhament­o automático do MDB por conta da nomeação de Osmar Terra, que comandou o Desenvolvi­mento Social e é um excelente quadro”, afirmou o senador Romero Jucá (RR), presidente do MDB. “Não vamos ficar na oposição nem no ‘quanto pior, melhor’, mas nossa postura será de independên­cia”. Para o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, embora a indicação de Terra não represente “apoio incondicio­nal” do partido à gestão Bolsonaro, é o primeiro passo para a aliança. “Futurament­e, o MDB poderá integrar a base aliada. Por que não?”, perguntou Marun.

“Não vai ficar abandonado; ele tem como participar do governo. Mas, infelizmen­te, os ministério­s estão se esgotando.”

“Eu não fiz campanha prometendo absolutame­nte nada para ninguém. Não podemos dar ministério para todo mundo.” Jair Bolsonaro

PRESIDENTE ELEITO AO SER QUESTIONAD­O SOBRE MAGNO MALTA

 ?? ROGÉRIO MARQUES/FUTURA PRESS ECONOMIA ?? Jair Bolsonaro participa de formatura de sargentos da Aeronáutic­a em Guaratingu­etá (SP). Ontem, o almirante Bento Lima Leite foi anunciado futuro ministro de Minas e Energia e será o sexto militar na Esplanada. O general Marco Aurélio Vieira, indicado por Hamilton Mourão para Esportes, pode aumentar a lista.
ROGÉRIO MARQUES/FUTURA PRESS ECONOMIA Jair Bolsonaro participa de formatura de sargentos da Aeronáutic­a em Guaratingu­etá (SP). Ontem, o almirante Bento Lima Leite foi anunciado futuro ministro de Minas e Energia e será o sexto militar na Esplanada. O general Marco Aurélio Vieira, indicado por Hamilton Mourão para Esportes, pode aumentar a lista.
 ?? PEDRO IVO PRATES ?? São Paulo. Jair Bolsonaro põe quepe na cabeça ao participar da formatura de sargentos da Aeronáutic­a em Guaratingu­etá
PEDRO IVO PRATES São Paulo. Jair Bolsonaro põe quepe na cabeça ao participar da formatura de sargentos da Aeronáutic­a em Guaratingu­etá

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