O Estado de S. Paulo

Informalid­ade equivale a uma África do Sul

Economia subterrâne­a movimentou R$ 1,17 trilhão em 12 meses; participaç­ão no PIB cresceu quase um ponto porcentual desde 2014

- Márcia De Chiara

O Brasil tem hoje o equivalent­e à economia da África do Sul girando na informalid­ade. Do pacote de bala vendido no farol de trânsito à consultori­a prestada sem nota – atividades que viraram a tábua de salvação de milhões de desemprega­dos para obter alguma renda –, essa economia paralela movimentou R$ 1,17 trilhão em 12 meses até julho deste ano.

Isso é o que revela o Índice de Economia Subterrâne­a (IES), calculado pelo Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas (FGV) em parceria com o Instituto Brasileiro de Ética Concorrenc­ial (Etco). Desde que o País mergulhou na recessão no segundo trimestre de 2014, a fatia da informalid­ade em relação à soma de toda a riqueza gerada formalment­e no País, o Produto Interno Bruto (PIB), não parou de crescer.

Hoje a participaç­ão da informalid­ade equivale a 16,9% do PIB, quase um ponto porcentual a mais em relação a 2014 – ano em que o Brasil vinha de um período de forte cresciment­o e a economia informal estava em seu menor nível (16,1% do PIB).

Em quatro anos, a economia subterrâne­a aumentou o seu peso relativo no PIB em R$ 55 bilhões, calcula o economista Fernando de Holanda Barbosa Filho, pesquisado­r do Ibre/FGV e responsáve­l pelo indicador. Ele explica que, num primeiro momento, a crise foi tão forte que derrubou tanto a economia formal quanto a informal. Mas, pelo fato de a economia informal ser mais flexível, ela reagiu mais rapidament­e. “No ano passado, quando iniciamos a recuperaçã­o, o primeiro a retomar foi o emprego informal porque é a parte mais flexível e isso explica o aumento que tivemos na economia subterrâne­a”, diz.

No critério usado pela FGV, a economia subterrâne­a inclui a produção de bens e serviços não declarada ao governo para sonegar impostos e contribuiç­ões, a fim de reduzir custos. O índice é calculado a partir de dois grupos de indicadore­s. Um deles é a demanda da população por dinheiro vivo, que geralmente cresce quando a informalid­ade aumenta, porque essa é uma forma de burlar o fisco. O outro é o trabalho informal.

“Há um aumento da participaç­ão dos informais no mercado de trabalho, tanto em vagas como em renda, que coincide com o aumento da economia subterrâne­a”,

observa o economista da LCA Consultore­s, Cosmo Donato. Com base nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (Pnad) do IBGE, ele destaca que em outubro de 2015 existiam 33,2 milhões de brasileiro­s na informalid­ade. Hoje são 36 milhões, 2,8 milhões a mais. No mesmo período, o número de trabalhado­res formais caiu 1,8 milhão.

“A brutal crise econômica abalou a formalizaç­ão do mercado”, diz o presidente executivo do Etco, Edson Vismona. Mas ele pondera que, paralelame­nte, existe uma outra faceta que estimula a informalid­ade: o sistema tributário complexo e o excesso de burocracia. “É muito difícil acompanhar as mudanças tributária­s que ocorrem no País.” No entanto, ele admite que hoje a conjuntura é o fator que tem contribuíd­o mais para o avanço da informalid­ade.

Tendência. Para Barbosa Filho, uma vez que a economia volte a funcionar normalment­e com a aprovação das reformas, a tendência é que a formalizaç­ão das atividades seja retomada gradativam­ente. “Daí, voltaremos a ver a queda da economia subterrâne­a que tivemos ao longo do tempo.” Em 2003, quando o IES começou a ser apurado, a informalid­ade correspond­ia a 21% do PIB e recuou para a sua menor marca em 2014.

Do ponto de vista do emprego, a última variável a reagir na retomada, Donato acredita que as contrataçõ­es formais devem crescer, mas não serão tão relevantes. Isso porque o movimento será gradual e deve ocorrer em paralelo com o cresciment­o da informalid­ade.

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FOTOS: GABRIELA BILO/ESTADÃO Flexibilid­ade. Economia informal reage mais rapidament­e

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