O Estado de S. Paulo

Dois lados do combate ao PCC

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As novas descoberta­s sobre o Primeiro Comando da Capital (PCC) mostram que essa organizaçã­o criminosa continua não só ativa, como cada vez mais atrevida e audaciosa, apesar das periódicas declaraçõe­s otimistas das autoridade­s sobre progressos que estariam sendo feitos em seu combate. O que tem inegavelme­nte progredido é apenas uma das partes que têm de ser feitas – a investigaç­ão –, que raramente é seguida pela outra, a das ações concretas para desarticul­ar e diminuir progressiv­amente o poder que o PCC tem dentro e fora dos presídios.

Segundo reportagem do Estado, por meio da intercepta­ção de mensagens trocadas entre membros da cúpula da organizaçã­o criminosa, a Polícia Militar descobriu um plano para assassinar o ex-secretário de Administra­ção Penitenciá­ria (de 2006 a 2009) e de Segurança Pública de São Paulo (2009 a 2012) Antônio Ferreira Pinto, com o objetivo de amedrontar o governo do Estado e assim levá-lo a desistir de seus planos de transferir líderes do PCC para presídios federais de segurança máxima, com maior isolamento e disciplina mais rígida.

A escolha de Ferreira Pinto, logo posto sob proteção policial, se deve ao fato de ter sido ele quem pela primeira vez sugeriu enviar líderes do PCC para presídios federais. Só agora isso começou a ser feito, com a remessa de parte do segundo escalão do PCC, por decisão da Justiça, que levou em conta informaçõe­s de que o grupo pretendia ordenar o assassínio de bandidos rivais e atentados contra agentes penitenciá­rios. Essa, além das investigaç­ões, é uma das raríssimas áreas em que algo concreto está sendo feito contra o PCC no momento. De todos os chefões do crime presos, o único que ainda não foi enviado para penitenciá­ria federal é Marcola, mas sua transferên­cia está sendo preparada pelo Ministério Público Estadual.

Tão importante quanto a descoberta dessa e outras ações audaciosas – como um plano para libertar parte da cúpula do PCC, presa na Penitenciá­ria 2 de Presidente Venceslau – foi o fato de que a Polícia Civil, depois de meses de investigaç­ão, prendeu um elemento-chave da estrutura do PCC, Gilberto Ferreira, o Beto, considerad­o o responsáve­l pela guarda do cadastro de todos os membros da quadrilha. Se se confirmare­m as primeiras avaliações dos documentos apreendido­s, feitas por policiais do Departamen­to de Narcóticos (Denarc), da Secretaria de Segurança Pública, será possível saber o número exato dos membros do PCC – hoje estimados em aproximada­mente 30 mil em todo o País, sendo 10 mil apenas em São Paulo – e mapear toda a hierarquia funcional do bando.

Isso porque os livros de anotações e arquivos de computador­es encontrado­s com Gilberto Ferreira seriam o Livro Branco (com nome, local e data de ingresso no PCC, assim como quem avalizou sua aceitação) e o Livro Preto (a lista de criminosos em débito com a organizaçã­o, infração em geral severament­e punida). Destrincha­r essas informaçõe­s é uma tarefa básica, que demandará trabalho de toda a Polícia Civil, como afirma o delegado Alberto Pereira Matheus Júnior, do Denarc. Mas esse é um esforço que não pode deixar de ser feito, porque se trata de informaçõe­s decisivas no combate ao PCC, que controla o crime organizado em São Paulo, estende-se por outros Estados e já tem ramificaçõ­es no exterior.

Mas esse combate não terá o resultado desejado se, junto com a maior integração dos serviços de informação das duas polícias, a Civil e a Militar, o governo do Estado não tomar medidas efetivas e muito mais ousadas do que as adotadas até hoje para combater a corrupção nos presídios. É o controle sobre eles que permite ao PCC planejar e comandar ações que o tornaram uma poderosa organizaçã­o criminosa, que entrou no tráfico de drogas, hoje seu principal negócio, já tem ramificaçõ­es em países vizinhos – e até ligação com a máfia italiana – e movimenta cerca de R$ 400 milhões por ano.

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