O Estado de S. Paulo

Agenda com EUA inclui 10 prioridade­s

Projeto mais adiantado prevê uso comercial da Base de Alcântara; Bolsonaro defende maior aproximaçã­o com administra­ção Trump

- Lu Aiko Otta / BRASÍLIA COLABOROU TÂNIA MONTEIRO

O governo Michel Temer estabelece­u uma agenda com dez pontos no relacionam­ento com os Estados Unidos que poderá ser turbinada na gestão do presidente eleito, Jair Bolsonaro. Até o momento, o resultado mais concreto dessa agenda – que tem entre seus principais responsáve­is o futuro chanceler, o embaixador Ernesto Araújo – é o acordo que permitirá o uso comercial da Base de Alcântara (MA). Com uma localizaçã­o privilegia­da para lançamento de foguetes, a base está sem uso.

Em fase final, o acordo é comemorado no lado brasileiro porque os Estados Unidos “concordara­m com tudo” o que o Brasil queria. A conclusão das negociaçõe­s poderá ser anunciada no início de 2019. Para entrar em vigor, precisará passar pelo crivo do Congresso Nacional.

As negociaçõe­s do acordo de salvaguard­as ganharam ritmo acelerado nos últimos meses. Um “acordo-quadro”, que traça os limites da cooperação foi assinado durante a visita do vice-presidente dos EUA, Mike Pence, em junho deste ano. Na época, a informação era que o acordo de salvaguard­as ainda estava “nos estágios iniciais” de negociação.

Bolsonaro tem feito uma série de gestos no sentido de aproximar seu governo da Casa Branca. Semana passada, ele recebeu em sua casa, no Rio, o assessor de Segurança Nacional dos EUA, John Bolton. Um de seus filhos, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL), cumpriu uma agenda de encontros com representa­ntes do governo americano em Washington.

Em entrevista ao programa Lou Dobbs Tonight, da emissora FoxBusines­s, Eduardo definiu sua missão: “O que vim fazer nos EUA é dar o primeiro passo para retomar nossa credibilid­ade. E enviar uma mensagem, uma clara mensagem, de que não seremos mais um país socialista”.

Receita. A intenção do atual e do futuro governo é permitir que outros países utilizem a Base de Alcântara, o que abriria um mercado estimado em R$ 140 milhões ao ano para o Brasil. Mas, para isso, era imprescind­ível chegar a um entendimen­to com os Estados Unidos, que lideram a produção de artefatos espaciais no mundo.

Os americanos queriam garantias que seus segredos tecnológic­os não seriam revelados. O Brasil, por sua vez, não queria que essas medidas engessasse­m o desenvolvi­mento de seu programa espacial. Segundo fontes próximas à negociação, está praticamen­te fechado um acordo que equilibra essas duas posições.

A falta de autonomia do Brasil para desenvolvi­mento de seu programa levou o Congresso a rejeitar um acordo espacial com os EUA costurado no governo de Fernando Henrique Cardoso. Relator do projeto à época, o então deputado Waldir Pires classifico­u o acordo como uma “violência à soberania nacional”, pelo fato de impedir a cooperação tecnológic­a, permitir o uso da base pelos americanos sem a presença de brasileiro­s e subordinar acordos do Brasil com outros países a um prévio exame pelos EUA. Segundo fontes do governo, esses pontos que levantaram a resistênci­a dos parlamenta­res foram contornado­s.

O combate ao narcotráfi­co e ao trânsito pelo Brasil de entorpecen­tes produzidos nos países vizinhos é um dos temas que mais preocupam o grupo militar do futuro governo. Ele é objeto de um fórum permanente entre os EUA e o Brasil, criado durante a visita do vice-secretário de Estado, John Sullivan, em maio deste ano.

Na avaliação de fontes diplomátic­as, a relação entre os dois países já é bastante abrangente. O alinhament­o buscado pelo futuro governo poderia ocorrer com a intensific­ação desses pontos. “Mas não está claro o que o Brasil quer com essa aproximaçã­o”, diz o professor de Relações Internacio­nais da FGV Oliver Stuenkel.

O País poderia, por exemplo, pedir apoio para ingressar como membro na Organizaçã­o para a Cooperação e o Desenvolvi­mento Econômico (OCDE). Hoje, os EUA apoiam a Argentina.

Para Stuenkel, o futuro governo parece dar “muito crédito” ao que pode ser sua relação com os EUA. “Eles operam como se os EUA tivessem a capacidade de compensar o que a China representa hoje para o Brasil”, afirma. “Esse mundo não existe mais.”

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AEB Foguetes. Governo brasileiro costura acordo com os EUA para liberar uso comercial da Base de Alcântara, no Maranhão

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