O Estado de S. Paulo

Nos EUA, analistas ainda veem um ambiente de incertezas

Para especialis­tas, não ficou claro o que China e Estados Unidos vão fazer para pôr fim à guerra comercial

- Beatriz Bulla Correspond­ente/ WASHINGTON

A trégua comercial anunciada entre China e Estados Unidos no final de semana, após encontro entre os presidente­s Donald Trump e Xi Jinping, ainda é vista com cautela por analistas. A avaliação é de que o cenário segue com incertezas sobre os detalhes do que cada um dos lados estará disposto a ceder dentro de três meses. O prazo de 90 dias é o estabeleci­do entre os dois líderes como período para negociar um acordo. Nesse meio tempo, a imposição recíproca de tarifas foi adiada, após meses de escalada na tensão entre as duas maiores economias mundiais.

“Há histórias diferentes saindo do encontro no G-20”, afirmou Jeffrey Prescott, ex-assessor do governo americano e exconselhe­iro da vice-presidênci­a em assuntos sobre Ásia. Segundo ele, não é estranho que cada um dos lados coloque luz no que é mais vantajoso ao seu país, mas os comunicado­s dos EUA e da China levantam muitas dúvidas. “Nenhum relatório sugere que tivemos um avanço concreto nas questões estruturai­s, não é claro o que mudou no final de semana”, afirmou Prescott, em evento da think tank Atlantic Council, em Washington. Trump usa tarifas para pressionar a China em questões estruturai­s como transferên­cia de tecnologia e cibersegur­ança.

Em encontro entre os líderes dos dois países na Argentina, os Estados Unidos concordara­m em não elevar mais tarifas sobre produtos chineses em 1º de janeiro enquanto a China concordou em comprar mais produtos agrícolas dos EUA. Trump usou o Twitter para comentar a reunião com Xi Jinping. Segundo ele, a China concordou em reduzir e remover tarifas hoje de 40% sobre automóveis – o que não está descrito nos comunicado­s oficiais da reunião.

A Casa Branca informou que se não houver um acordo entre os dois países no prazo de 90 dias as tarifas de 10% sobre US$ 200 bilhões em produtos chineses subirão para 25%. Trump afirmou que o encontro foi “extraordin­ário” e que a relação entre os dois países deu um grande salto. “Coisas muito boas irão acontecer”, escreveu Trump.

O assessor econômico de Trump, Larry Kudlow, disse nesta segunda-feira a jornalista­s que a China “está concordand­o em abordar” questões estruturai­s – como as relacionad­as a tecnologia. Ele também confirmou que a questão de remoção das tarifas de veículos aconteceri­a imediatame­nte.

Telefone sem fio. “Por mais que essa trégua seja dada, não fica claro o que cada lado vai ceder para se chegar a um acordo. Há o lado americano falando que a China vai aceitar conversar sobre cibersegur­ança, já a China deixa isso em aberto e fala em reconhecim­ento dos EUA em tratar ‘uma única China’ – enquanto os EUA não comentaram nada sobre isso. Ainda está um jogo de telefone sem fio, mas é positivo quando os dois lados estão dispostos a chegar a uma solução a isso”, afirmou Thiago de Aragão, diretor da consultori­a Arko Advice.

De acordo com Jeffrey Prescott, a incerteza tem sido parte do jogo do governo Trump. “Começar um fogo e depois apagálo é algo que vimos em outras áreas nesse governo”, afirmou. Segundo ele, os Estados Unidos pressionam a China por mudanças estruturai­s que, ainda que sejam acordadas, levarão tempo para serem implementa­das e gerarem efeito. O analista, que assessorou a vice-presidênci­a até 2015, afirma que Trump entrará em um período de pressão com a eleição de 2020 à vista e precisará decidir se politicame­nte usará Pequim como um inimigo ou como parte de um grande acordo comercial.

Trump também usou o Twitter para mandar recado aos produtores agrícolas do país, afetados diretament­e pela guerra comercial com os chineses após a queda no preço de grãos, como a soja. “Agricultor­es serão beneficiad­os muito e rapidament­e com nosso acordo com a China. Eles pretendem começar a comprar produtos agrícolas imediatame­nte. Nós fazemos o produto mais limpo do mundo e é isso que a China quer. Agricultor­es, eu amo vocês”, escreveu Trump. Com a imposição de tarifas pela China ao produto americano, produtores de soja passaram a estocar o grão esperando o alívio na tensão comercial. Além do problema econômico, a comunidade rural dos EUA é importante apoiadora de Trump politicame­nte.

“Agricultor­es serão beneficiad­os muito e rapidament­e com nosso acordo com a China. Eles pretendem começar a comprar produtos agrícolas imediatame­nte. Agricultor­es, eu amo vocês.” Donald Trump

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PABLO MARTINEZ MONSIVAIS/AP

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