O Estado de S. Paulo

Caminhos do reino

- Juliana A. Saad / THIMPHU ESPECIAL PARA O ESTADO

Diz a lenda que o guru Rinpoche chegou ao alto da montanha do Vale de Paro no dorso de uma tigresa, daí o nome Ninho do Tigre. Sol a pino, céu azul, bandeiras de oração coloridas e brancas dançam ao vento e rodas de oração são giradas ao longo da subida, enquanto a luminosida­de e o ar puro do Himalaia se mostram surreais. O acesso é íngreme e o ar, rarefeito, mas a paisagem é absurdamen­te bonita. Ao longo do caminho, pessoas de todas as idades e nacionalid­ades trocam olhares de camaradage­m e perguntas: “falta muito?”, “foi difícil?”, “vale a pena?”.

Muito! Mais célebre monastério do Butão (abriga sete templos), Paro Taktsang foi construído no século 8.º por Rinpoche, guia espiritual e introdutor do budismo no país. Suspenso em um penhasco de 3.120 metros de altura, requer aproximada­mente duas horas de caminhada para chegar até ele, mas parte do caminho pode ser feito em mulas. É o grande destaque do Butão.

No meio dos Himalaias. Regido pelo rei Jigme Khesar Namgyel Wangchuck, de 38 anos, o último reino do Himalaia e suas montanhas com altos picos nevados, como o Monte Chomolhari (7.314 metros), é um esplendor. O Butão tem 47 mil quilômetro­s quadrados de área e fica aninhado entre a Índia, ao sul, e o Tibete, que é território autônomo da China, ao norte. É contornado pela Cordilheir­a do Himalaia (nome que significa morada da neve, em sânscrito), com picos que espetam o céu a mais de 7 mil metros de altura nas áreas fronteiriç­as da cadeia montanhosa. Tem, ainda, planícies baixas ao sul, florestas e rios que cortam caminho por entre vales e desfiladei­ros, tornando-o um dos mais remotos e intocados lugares da Terra.

No Butão, não há como rodar sem guias (leia mais no quadro abaixo). Para nossa sorte, um cara sorridente e vestido com o tradiciona­l traje masculino do país, o gho, foi nos receber no aeroporto internacio­nal de Paro (o único), com seu espanhol perfeito e o desejo genuíno de compartilh­ar sua origem, vida e cultura no reino budista. Era Chendu, o guia que nos acompanhou nessa jornada pelo país da felicidade. Ao longo dos dias de convivênci­a com ele, mais o motorista Jogmi e ainda com Jigme Tenzin, Sonam, Yang Chen, Yanki e todas as pessoas que cruzaram nosso caminho, fomos entendendo que a gentileza em sua forma mais pura é marca desse povo adorável.

Na estrada. A distância do aeroporto de Paro até a capital do Butão, Thimphu, nosso primeiro destino, é de 50 quilômetro­s. As rodovias do Butão são ótimas, em mão inglesa. Ao longo da estrada, a paisagem revela vales recortados por rios de águas azuis claras que vêm do Himalaia e se juntam aos rios Thimphu (Wang Chu) e Paro (Pa Chu). E em Chuzom, na confluênci­a das águas, três estupas (monumentos budistas que, aqui, também são chamados chortens) em estilos diferentes – tibetano, nepalês e butanês – erguem-se na margem direita, um lugar com energia muito alta. Pouco antes de chegar a Chuzom, avistamos um templo no topo de uma colina, Tschogang Lhakhang, construído no século 13 por Thangthong Gyalpo, um belo exemplo da arquitetur­a tradiciona­l do país.

Ali, o som surpreende­ntemente calmo da revoada de bandeiras de oração é a trilha sonora para o cenário que parece intocado pelo tempo. Um fato curioso é que essas tradiciona­is bandeiras, sempre em cinco cores, são penduradas horizontal­mente. No Butão, no entanto, existem também as verticais, brancas, presas em uma longa estaca de madeira.

No centro de cada bandeira está impresso um símbolo predominan­te, o cavalo-do-vento (lungta), que, dizem, carrega a iluminação que preenche os desejos. Um pouco adiante, já de volta à estrada, um outdoor com o casal real sorridente nos dá as boas-vindas à principal cidade do país. Chegamos a Thimphu.

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 ??  ?? Tradição. À esquerda, rodas de oração e Buda sentado de 51 metros de altura; à direita, arquitetur­a típica com madeira entalhada
Tradição. À esquerda, rodas de oração e Buda sentado de 51 metros de altura; à direita, arquitetur­a típica com madeira entalhada
 ??  ?? Revoada. Bandeiras de oração, sempre em cinco cores, são vistas no trajeto até Chuzom, o encontro dos rios
Revoada. Bandeiras de oração, sempre em cinco cores, são vistas no trajeto até Chuzom, o encontro dos rios

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