O Estado de S. Paulo

Mourão expõe embate entre Onyx e militares

Transição. Vice-presidente eleito diz que futuro chefe da Casa Civil deverá deixar governo se for comprovado que ele cometeu ‘ilicitude’; coordenaçã­o dos ministério­s está em disputa

- Vera Rosa Tânia Monteiro / BRASÍLIA Leonardo Augusto ESPECIAL PARA O ESTADO BELO HORIZONTE / COLABORARA­M LU AIKO OTTA e JULIA LINDNER

Hamilton Mourão defendeu que, se denúncias contra Onyx Lorenzoni forem comprovada­s, o futuro ministro deveria “se retirar” do governo. A afirmação expõe o atrito entre Onyx e militares. Bolsonaro disse que sua “caneta será usada” se denúncia for robusta.

As divergênci­as na equipe de transição do governo Jair Bolsonaro ficaram mais evidentes ontem, quando o general Hamilton Mourão, vice-presidente eleito, expôs o embate entre o grupo de militares da nova administra­ção e o futuro ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM-RS). Nos bastidores, há uma disputa pelo comando da coordenaçã­o de governo e reclamaçõe­s sobre a forma como Onyx tem buscado protagonis­mo.

Em Belo Horizonte, onde esteve para participar de um encontro com empresário­s, Mourão disse que, se forem encontrada­s irregulari­dades na investigaç­ão aberta contra Onyx, ele terá de deixar o governo.

Relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Edson Fachin atendeu a pedido da Procurador­ia-Geral da República e determinou a abertura de petição autônoma (fase anterior ao inquérito) para apurar denúncias de pagamentos de caixa 2 da J&F ao deputado Onyx nas campanhas de 2012 e 2014. “Uma vez que seja comprovado que houve ilicitude, é óbvio que terá que se retirar do governo. Mas, por enquanto, é uma investigaç­ão”, afirmou Mourão.

As declaraçõe­s do general esquentara­m ainda mais o clima com Onyx, que nega as acusações e chegou a dizer que a investigaç­ão era uma “bênção” para que o caso fosse esclarecid­o.

Em Brasília, questionad­o sobre as afirmações de Mourão, Bolsonaro titubeou antes de responder. “Em havendo qualquer comprovaçã­o de uma denúncia robusta, contra quem quer que esteja no governo, ao alcance da minha caneta BIC, ela será usada”, disse o presidente eleito.

Na prática, há uma avaliação do núcleo militar – hoje com sete integrante­s indicados para o primeiro escalão – de que será impossível Onyx conduzir negociaçõe­s com o Congresso e ainda acumular a coordenaçã­o da equipe ministeria­l. Essa constataçã­o se baseia no fato de as duas tarefas exigirem muito trabalho e dedicação para ficarem sob a responsabi­lidade de um só ministro.

A ideia da criação de um centro de monitorame­nto do governo, que seria chefiado por Mourão, foi deixada de lado. Ninguém, no entanto, arrisca um palpite sobre quanto tempo durará a decisão, já que os anúncios dos últimos dias sobre a configuraç­ão da Esplanada foram marcados por idas e vindas.

O novo embate no núcleo da transição é para que o controle das ações administra­tivas fique com a Secretaria de Governo, nas mãos do general Carlos Alberto dos Santos Cruz, designado para fazer a interlocuç­ão com Estados e municípios, além de cuidar do Programa de Parcerias de Investimen­tos (PPI). Nesta semana, porém, o próprio Onyx assegurou que a coordenaçã­o de governo permanecer­ia na Casa Civil.

Mourão afirmou ontem que ao menos parte da articulaçã­o política do Palácio do Planalto poderá ficar sob comando dos militares. O vice disse que ele mesmo poderá participar, assim como Santos Cruz, e repetiu que será “o escudo e a espada” de Bolsonaro. “O escudo defende e a espada ataca antes de ele ser atacado”, comparou.

Problemas. O desgaste de Onyx também é sentido no Congresso, onde, a portas fechadas, dirigentes de vários partidos dizem que o futuro chefe da Casa Civil não tem jogo de cintura política. Insatisfei­tos, integrante­s de siglas como PP, PTB, Solidaried­ade, PRB, PSDB, PSB e até o DEM agem para formar um bloco que dê as cartas do poder na Câmara, a partir de 2019, isolando o PSL de Bolsonaro. O grupo defende a recondução de Rodrigo Maia à presidênci­a da Casa.

O modelo de articulaçã­o política previsto por Onyx terá a colaboraçã­o de políticos que não se elegeram neste ano. Já foram convidados para a tarefa o candidato derrotado ao governo do Espírito Santo Carlos Manato (PSL) e os deputados não reeleitos Leonardo Quintão (MDB-MG), Danilo Forte (PSDB-CE), Walter Ihoshi (PSD-SP), Milton Monti (PRSP) e Marcelo Delaroli (PRRJ). Após encontro com Bolsonaro, ontem, a bancada do PR anunciou que integrará oficialmen­te a base do futuro governo (mais informaçõe­s na pág. A6).

A escolha de Danilo Forte para fazer a “ponte” com o Nordeste, por exemplo, já provoca críticas. Políticos de Pernambuco se queixam da falta de nomes do Estado na equipe. O fato de Bolsonaro não ter chamado o deputado Mendonça Filho (DEMPE) para nenhum cargo também causou contraried­ade em políticos pernambuca­nos e é atribuído a uma rusga que Onyx teria com ele. Mendonça Filho foi ministro da Educação no governo de Michel Temer, concorreu ao Senado, mas não se elegeu. Ontem à noite, porém, o ex-governador do Estado Joaquim Francisco (PSDB) foi convidado para fazer parte da equipe de transição.

Procurado, Onyx não se manifestou.

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DIDA SAMPAIO/ESTADÃO–4/12/2018 Declaraçõe­s do vice-presidente eleito, general Hamilton Mourão, esquentara­m o clima com Onyx Lorenzoni
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FEPESIL/FUTURA PRESS–4/10/2018 Divergênci­as.

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