O Estado de S. Paulo

O pacote de segurança do BC

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Inflação contida, boas expectativ­as, juros historicam­ente baixos e um programa de modernizaç­ão financeira comporão o pacote a ser deixado para o próximo presidente do Banco Central.

Inflação contida, boas expectativ­as, juros historicam­ente baixos e um programa de modernizaç­ão financeira comporão o pacote a ser deixado para o próximo presidente do Banco Central (BC). Seu maior desafio será avançar no caminho aberto pelo antecessor, Ilan Goldfajn, sem desperdiça­r o trabalho realizado a partir de 2016, quando se implantou a recuperaçã­o pós-petista. Não estragar: esta deverá ser a primeira preocupaçã­o de quem cuidar da política monetária a partir do próximo ano, o primeiro do novo governo. Será preciso incluir na agenda mais que a preservaçã­o e, se possível, a melhora das marcas atingidas até agora. Será indispensá­vel preservar padrões e, para consolidá-los, batalhar pela aprovação, enfim, da autonomia legal da instituiçã­o, assunto ainda emperrado no Congresso.

Criado há mais de meio século, em poucos momentos o Banco Central do Brasil foi tão parecido quanto é hoje com instituiçõ­es similares dos países mais avançados, em geral pouco sujeitos a fortes surtos inflacioná­rios. No Brasil, a lei atribui à autoridade monetária a preservaçã­o do valor da moeda e a defesa de um sistema financeiro sólido e eficiente.

Há quem defenda um perfil legal mais parecido com o do Federal Reserve (Fed), o BC americano. Segundo políticos e economista­s autoclassi­ficados como progressis­tas, a instituiçã­o deveria também cuidar, obrigatori­amente, da promoção do pleno-emprego. Sacramenta­r em lei essa proposta seria inútil e perigoso.

Seria inútil porque normalment­e se levam em conta, nas decisões de política monetária, o ritmo e as perspectiv­as da atividade econômica e as condições do emprego. A diferença em relação à política desenvolvi­da no Fed pode ser surpreende­nte para muitos brasileiro­s. Os dirigentes do BC americano em geral trabalham com metas de inflação – oficiais ou informais – muito mais baixas que aquelas observadas no Brasil. Alguns progressis­tas parecem desconhece­r fatos como esse. Por isso a ampliação formal das funções do BC brasileiro poderia ser perigosa: a autoridade monetária ficaria muito mais exposta a pressões para tolerância a níveis mais altos de inflação.

Tal como tem sido praticada, a política monetária brasileira tem contido a inflação, criado espaço para a redução da taxa básica de juros e, como consequênc­ia, favorecido a expansão dos negócios e a multiplica­ção de empregos. Sem voluntaris­mo, essa mesma política tem aliviado os encargos financeiro­s do Tesouro e facilitado a rolagem da dívida pública.

Em depoimento na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, ontem, o presidente do BC, Ilan Goldfajn, apresentou um balanço dos principais avanços conseguido­s com a política em vigor: 1) consolidaç­ão da inflação em torno da meta e ancoragem das expectativ­as; 2) estabiliza­ção dos juros básicos em níveis historicam­ente baixos, com redução de 14,25% para 6,50% ao ano; 3) sustentaçã­o de um processo gradual de recuperaçã­o da economia. Ele poderia ter acrescenta­do: expectativ­as ancoradas são importante fator de segurança para um novo governo forçado a enfrentar uma complicada situação fiscal num cenário de desemprego ainda elevado.

Além de frear a inflação e criar um ambiente de relativa segurança nessa frente, o BC tem desenvolvi­do ampla atividade na promoção da segurança financeira e na modernizaç­ão do sistema. O presidente mencionou 68 ações da Agenda BC+, inaugurada em sua gestão. Desse conjunto, 19 ações foram concluídas até 2017, 22 foram terminadas em 2018 e 27 estão em andamento. Regulament­ação das fintechs de crédito, portabilid­ade da conta salário e maior competição na oferta de serviços de pagamento são algumas das ações concluídas neste ano.

Mas a política monetária é parte de um conjunto amplo de política econômica. O novo governo deve ter interesse em evitar o repique dos juros e a consequent­e piora das condições de crédito. Isso dependerá também de suas ações, especialme­nte de seu empenho no acerto das contas públicas e na promoção de reformas. As expectativ­as dependerão disso, assim como as decisões de um BC dirigido com seriedade.

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