O Estado de S. Paulo

Luz amarela

- ZEINA LATIF E-MAIL: ZEINA.LATIF@TERRA.COM.BR ZEINA LATIF ESCREVE ÀS QUINTAS-FEIRAS ECONOMISTA-CHEFE DA XP INVESTIMEN­TOS

Opotencial de cresciment­o do Brasil está bastante deprimido. Pode estar abaixo de 2%, devido à produtivid­ade estagnada e a tantos equívocos de política econômica nos últimos anos. O governo Temer promoveu importante­s avanços que abriram espaço para um ciclo de recuperaçã­o da economia. O fôlego desse movimento dependerá do empenho do próximo governo para dar continuida­de e acelerar a agenda de reformas.

Há um misto de confiança e cautela entre empresário­s com o cenário econômico. O mesmo vale para o mercado financeiro. Basta analisar o desempenho modesto dos preços de ativos desde a eleição, e com alguma volatilida­de, contrarian­do a expectativ­a de um “rally” nos mercados após a eleição de Jair Bolsonaro.

Por um lado, há a avaliação de que o novo governo contará com a força das urnas, diferentem­ente do governo de transição de Temer; buscará políticas públicas na direção correta para melhorar a ação estatal; e adotará uma nova forma de fazer política que poderá elevar a qualidade e a eficiência de políticas públicas. Seria um governo que teria potencial de entregar mais reformas estruturai­s do que o de Temer.

De outro lado, há uma boa dose de cautela por se reconhecer a difícil combinação de fragilidad­e do quadro econômico, urgência de reformas impopulare­s e um núcleo de poder com pouca experiênci­a administra­tiva e política, e com potenciais conflitos entre si.

O risco de uma agenda tímida de reformas é concreto, a julgar pela sinalizaçã­o do núcleo duro do futuro governo. Nesse caso, não haveria uma efetiva aceleração do cresciment­o. Com a fragilidad­e do regime fiscal, não seria possível garantir taxas de juros do Banco Central baixas como as atuais.

Importante colocar na conta as sequelas da crise econômica ainda não superadas e que têm impacto na confiança dos empresário­s e consumidor­es. Basta olhar o ainda elevado patamar de pedidos de recuperaçã­o judicial e os frágeis números do mercado de trabalho.

Como se não bastasse, houve vários choques que fragilizar­am ainda mais o setor produtivo e frustraram o cresciment­o do PIB em 2018. Tivemos a greve dos caminhonei­ros, o indefensáv­el tabelament­o do frete, a pressão cambial (decorrente muito mais do ambiente externo do que das incertezas eleitorais) e a crise argentina reduzindo as exportaçõe­s. Até incêndio em importante refinaria da Petrobrás teve. Não seria exagero afirmar que sem esses choques o cresciment­o em 2018 teria sido próximo de 2,5%.

O termômetro da capacidade de cresciment­o será a dinâmica da indústria. A indústria, que é o setor mais sensível ao custo Brasil, foi o primeiro setor a sentir a piora do quadro econômico, já em 2012, e o primeiro a sair da crise.

Os números recentes não são bons, praticamen­te interrompe­ndo a tendência de recuperaçã­o, ainda que lenta. A indústria, como sempre, foi prejudicad­a pelos choques recentes. A produção industrial registrou cresciment­o de apenas 1,8% entre janeiro e outubro deste ano em relação ao mesmo período de 2017, ano em que o cresciment­o foi maior, de 2,6%. A indústria nitidament­e perdeu o ritmo em 2018, enquanto era esperada uma aceleração por conta da redução dos juros pelo Banco Central.

O comércio varejista, por sua vez, conseguiu acelerar em 2018, diante da recuperaçã­o da massa salarial e da volta do crédito. No acumulado de 2018 até setembro, o cresciment­o do volume de vendas é de 5,2% ante 4% em 2017. Os serviços seguem no campo negativo, em parte pela própria fraqueza da indústria, mas exibem modesta tendência de melhora. Acumulam queda de 0,4% ante recuo maior de 2,8% em 2017.

Elementos transitóri­os, duradouros e estruturai­s se misturam e geram incertezas sobre a dinâmica econômica. Ha razões para posturas cautelosas.

A fraqueza da indústria acende luzes amarelas, pois se persistent­e, vai contaminar cedo ou tarde a performanc­e dos demais setores, a geração de vagas e o aumento do investimen­to.

A fraqueza da indústria, se persistir, vai contaminar cedo ou tarde os demais setores

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