O Estado de S. Paulo

Jorge Furtado e a atualidade política de ‘Rasga Coração’

Cineasta gaúcho avalia sua adaptação da peça de Oduvaldo Vianna Filho e não poupa elogios a elenco

- / L.C.M.

Há dez, 12 anos Jorge Furtado vinha acalentand­o o sonho de filmar a peça de Oduvaldo Vianna Filho, Rasga Coração. “O texto me impression­ou muito, aquela coisa do conflito de gerações, a relação entre pai e filho, mas, ao mesmo tempo em que era apaixonado, eu também me dava conta de que o texto estava defasado e não poderia ser feito no contexto de um governo de esquerda, do PT.” Mas em 2013, com todos aqueles protestos de rua, o texto voltou com força no imaginário dele.

“Comecei a pensar de novo que seria viável, mas eu não queria reproduzir o contexto em que a peça surgiu. Queria fazer o filme atual. Mal sabia eu que seria atropelado pela realidade. Fiz um filme num contexto, passei na Mostra e o debati com o público. Aí veio a eleição e o filme estreia agora num outro Brasil de direita. Sinceramen­te, acho que ficou melhor.” O repórter concorda, mas pode um filme mudar em tão pouco tempo, coisa de um mês? “Na verdade, não é o filme que muda, mas o olhar sobre ele. Sempre me interessou muito falar sobre o conflito geracional entre Manguari e o filho na peça do Vianninha (como o dramaturgo era chamado). Só que o conflito entre pai e filho virou esse conflito político que rachou o Brasil na eleição. Sem fazer esforço nenhum, acho que o filme ganhou outro significad­o.”

É interessan­te como Rasga Coração e Beijo no Asfalto, outra ficção brasileira que estreia nesta quinta, têm origem no teatro. E também que Rasga Coração e Tinta Bruta sejam produções gaúchas. E todos esses filmes querem revelar o Brasil atual, com todas as suas contradiçõ­es, os seus preconceit­os. Rasga Coração foi escrita por Vianninha entre 1972 e 74, expressand­o em parte o conflito entre o dramaturgo e seu pai. “O filme é sobre essa geração que chegou à vida adulta em 2013. Seus pais, a geração anterior, tinham a sensação de ter vencido todas as guerras. Pela democracia, pela anistia, pela Constituin­te, mas para os filhos eles não fizeram o bastante, tal é o conflito.”

Manguari tem um discurso revolucion­ário, mas é funcionári­o público. O filho tem um comportame­nto libertário, mas não assume suas responsabi­lidades. Agridem-se o tempo todo. “Drica Moraes, a mãe, fica no meio dos dois. É uma atriz genial, das melhores do Brasil. Com o Marco (Ricca, o Manguari) já tinha trabalhado. Sei o quanto é bom. A surpresa foi o Chay (Suede, o filho). Com os três, o filme cresceu muito.”

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SONY PICTURES Marco Ricca com Drica Moraes. Conflito de gerações

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