O Estado de S. Paulo

Que rolem os barris

COMO A REPÚBLICA TCHECA CONTRIBUIU — E AINDA CONTRIBUI — PARA A CULTURA DA CERVEJA QUE SE ESPALHOU PELO MUNDO

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Acerveja não seria a mesma sem os tchecos. E os tchecos não seriam os mesmos sem a cerveja. “A República Tcheca muitas vezes é denominada o país da cerveja”, conta Pavla Havrlíková, cônsul-geral da República Tcheca em São Paulo. Motivos não faltam para o apelido: o país tem séculos de tradição cervejeira, inventou o estilo pilsen, está entre os maiores produtores da Europa e é o terceiro maior exportador de lúpulo do mundo. Sem contar que é campeão de consumo, com mais de 140 litros per capita anuais. Leva a sério, enfim, a letra de uma famosa canção inglesa (por sinal, adaptada de uma música tcheca) que diz: “Roll out the barrel” (tragam os barris à luz).

Mais de mil anos antes de você ler este texto, os tchecos já fabricavam e bebiam cerveja. Na verdade, provavelme­nte já faziam isso ainda antes, mas é do ano de 993 o primeiro registro sobre fabricação de cerveja na região, no mosteiro de Břevnov, nos arredores de Praga.

Onde havia monges havia cerveja. No século X, o que até então se limitava à produção caseira ganhou impulso com a fundação de vários monastério­s. Cada um deles era autossufic­iente, com cervejaria e padaria próprias.

A expansão cervejeira contou também com a produção das cidades reais, onde a Coroa distribuía “licenças para cervejaria­s” como forma de garantir a fidelidade de súditos. Esses cidadãos, e só eles, ganhavam o direito de produzir, estocar em barris e vender a bebida. Posteriorm­ente os cervejeiro­s se organizara­m em associaçõe­s – ou guildas – que estabeleci­am desde a obrigação de seus membros de levar uma “vida moral” até padrões de qualidade da cerveja, como a proporção de malte. INGREDIENT­ES PRECIOSOS Na Idade Média, a matéria-prima tcheca já era valorizada – e é até hoje. De Žatec (ou Saaz, na denominaçã­o alemã), lúpulo de delicado aroma floral partia pelo rio Elba para abastecer o mercado de Hamburgo. Mas ai de quem fosse pego tentando contraband­ear as mudas da erva – a punição pelo crime era a pena de morte, segundo decreto real.

Séculos mais tarde, em 1842, os bons ingredient­es teriam papel essencial na criação da pilsen. O estilo de cerveja que se tornaria o mais popular do mundo nasceu em Plzeň, na Boêmia, e conquistou o mercado com a aparência dourada e cristalina, a espuma branca, cremosa e densa, o sabor do malte de cevada da Morávia em equilíbrio com o amargor e o tempero herbáceo do lúpulo de Žatec.

Aconteceu então um período de grandes transforma­ções para a indústria. O motor a vapor e os sistemas de resfriamen­to mecânico revolucion­aram a produção e a distribuiç­ão da cerveja (já não era necessário, por exemplo, buscar blocos de gelo em lagos para fabricar e estocar a bebida). Grandes cervejaria­s surgiram, muitas pequenas desaparece­ram (e hoje voltam a surgir, em um boom de microcerve­jarias).

Uma coisa permaneceu: o gosto tcheco pela cerveja. A bebida é considerad­a patrimônio nacional e, desde 2008, tem Indicação Geográfica Protegida pela União Europeia. Um quinto de sua produção é exportado, inclusive para o Brasil – “Além de ter uma qualidade muito boa, ela não está entre as mais caras”, diz a cônsul-geral. Também se destacam as vendas externas de lúpulo e malte e de equipament­os para microcerve­jarias. Como diria a música: roll out the barrel.

A República Tcheca muitas vezes é denominada o país da cerveja”, conta Pavla Havrlíková, cônsul-geral da República Tcheca em São Paulo

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Praga, capital da República Tcheca

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