ONG de ministra é condenada por discriminar índios
Entidade teve de retirar do ar, em 2017, vídeo considerado ofensivo à dignidade da comunidade indígena pelo Ministério Público Federal
A entidade Atini – Voz pela Vida, que tem a futura ministra Damares Alves entre os fundadores, foi condenada, a pedido do Ministério Público Federal (MPF), a tirar do ar vídeo considerado ofensivo à população indígena. Damares será responsável pela Funai. Ela não comentou o caso.
A organização não governamental (ONG) Atini - Voz Pela Vida foi condenada, no ano passado, a retirar do ar um vídeo considerado pelo Ministério Público Federal ofensivo à comunidade indígena. A entidade tem entre as fundadoras a futura ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, que também ficará responsável pela Fundação Nacional do Índio (Funai).
No pedido que sustentou a decisão judicial, o Ministério Público do Distrito Federal afirmou que o filme Hakani – A história de uma sobrevivente “gerou profunda indignação na sociedade, gerando manifestações preconceituosas e discriminatórias em face das comunidades indígenas”.
Em sua argumentação, o MPF declarou que o filme tinha o objetivo de “chamar atenção acerca do tema ‘infanticídio indígena’ e legitimar as ações missionárias no interior das comunidades indígenas”. A veiculação do filme, justificou, bem como a exposição de imagens de crianças e adolescentes indígenas, “atinge a dignidade humana deste grupo perante a sociedade”. Os procuradores pediam à época que a ONG fosse condenada a pagar R$ 1 milhão.
Ainda de acordo com o MPF, a obra foi produzida em parceria com a instituição Jocum (Jovens Com Uma Missão), nome adotado no Brasil pela organização evangélica de origem americana Youth With a Mission. Fundada em 1960, a organização iniciou as atividades missionárias no Brasil em meados da década de 1970, e hoje possui escritórios em quase todos os Estados brasileiros.
Em outubro de 2017, a Justiça do DF acatou parte dos pedidos da Procuradoria e determinou suspensão da veiculação do filme – não concedeu a indenização pedida. A Atini - Voz Pela Vida recorreu da decisão.
O Estado verificou que ainda há links disponíveis na internet com acesso ao filme, que tem 30 minutos de duração.
Procuradas, as entidades não se manifestaram até a conclusão desta edição. Ontem, Damares Alves afirmou que não tem planos de “evangelizar” os povos indígenas (mais informações nesta página).
‘Sem agressão’. Em entrevista concedida no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) quando foi anunciada como ministra, anteontem, Damares disse ser contra a política de isolamento dos índios brasileiros e que a ideia é integrá-los “sem agressão à cultura”. “Não abro mão dos meus índios”, afirmou ela ao reiterar que a Funai, atualmente no Ministério da Justiça, será transferida para sua pasta. Segundo a ministra, o plano é cuidar do índio “como um todo”, inclusive daqueles com deficiência. “Ainda temos povos que eliminam crianças com deficiência.”
A decisão do presidente eleito, Jair Bolsonaro, de transferir a Funai de ministério causou indignação entre servidores do órgão, que veem a ministra como defensora da atuação religiosa e missionária em aldeias indígenas. Damares é assessora no gabinete do senador Magno Malta (PR-ES), que, apesar de ter sido próximo de Bolsonaro na campanha, ficou fora do ministério do novo governo.
Ontem, o senador divulgou um vídeo para aliados e eleitores no qual diz não ter indicado sua assessora para o ministério e atribuiu a decisão a uma escolha pessoal do presidente eleito. “Esclareço que ela não é uma indicação minha, é uma escolha pessoal do presidente, que a convidou. Não fui comunicado, não fui solicitado, não fui eu que a indiquei como algumas pessoas pensam. Não traduz a verdade. Ela é uma escolha pessoal do presidente da República. Eu desejo toda a sorte do mundo a ela”, afirmou Malta.
“(O filme) gerou profunda indignação na sociedade, gerando manifestações preconceituosas e discriminatórias em face das comunidades indígenas.”
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL