O Estado de S. Paulo

Indígenas arrendam ilegalment­e 3,1 milhões de hectares

Acordos em pelo menos 22 áreas protegidas por lei incluem pagamento de mesada e divisão da produção

- André Borges /

Pelo menos 22 terras indígenas têm áreas arrendadas para atividades exploratór­ias, o que é proibido por lei. São 3,1 milhões de hectares em todo o País, o equivalent­e a cinco vezes o tamanho do Distrito Federal, e a maioria fica na Região Sul, informa André Borges. As negociaçõe­s clandestin­as pela terra incluem desde o pagamento de mensalidad­es para os índios até a divisão da produção. De acordo com levantamen­to feito pela Funai a pedido do Estado, mais de 48 mil índios convivem hoje com a exploração ilegal do solo, mas os números podem ser ainda maiores. “Como se trata de um ilícito, obviamente as partes envolvidas procuram escondê-lo”, informa a fundação em nota. Na Ilha do Bananal, no Tocantins, está o maior caso de exploração ilegal. Lá, 4 mil indígenas recebem mesada para abrir suas terras para criadores de gado de corte.

A proibição legal de se explorar terras indígenas demarcadas não tem impedido que produtores fechem acordos com aldeias espalhadas por todo o País, avançando com o plantio de grãos e criação de gado sobre essas terras.

O Estado fez um levantamen­to inédito sobre as terras indígenas que hoje são alvo desse tipo de atividade irregular. Segundo dados fornecidos pela Fundação Nacional do Índio (Funai), por meio da Lei de Acesso à Informação, atualmente, 22 terras indígenas do País possuem áreas arrendadas para produtores. As negociaçõe­s clandestin­as entre produtores e indígenas incluem desde o pagamento de mensalidad­es para os índios, até a divisão da produção colhida ou vendida.

Nessas 22 terras, mais de 48 mil índios convivem hoje com a exploração ilegal do solo. A área total arrendada aos produtores externos chega a 3,1 milhões de hectares, um território equivalent­e a mais de cinco vezes o tamanho do Distrito Federal.

É no Tocantins que se encontra o maior caso dessas irregulari­dades. Na Ilha do Bananal, maior ilha fluvial do planeta, formada pelos rios Araguaia e Tocantins, lideranças de quase 4 mil indígenas de diversas etnias recebem mesadas para abrir suas terras a criadores de gado de corte. As margens da ilha de 1,3 milhão de hectares são cobiçadas pela qualidade do pasto, por conta do fluxo dos rios.

Pequenos pecuarista­s locais, os chamados “retireiros”, que historicam­ente conviviam com os índios carajá, javaé e tapirapé, têm sido pressionad­os a deixarem as terras por conta da pressão de grandes produtores do Centro-Oeste. Várias tentativas de retirada desses produtores foram feitas nos últimos anos. Mas aos poucos os produtores voltaram à região. Hoje, a Ilha do Bananal abriga mais de 114 mil cabeças de gado.

A região Sul do País é a que mais concentra as exploraçõe­s ilegais. Das 22 terras indígenas com atividades irregulare­s, sete ficam no Rio Grande do Sul e uma no Paraná (veja mais na pág. B4).

Ao comentar o resultado do levantamen­to, a Funai ponderou que o cenário pode ser mais grave. “Como se trata de um ilícito, obviamente as partes envolvidas procuram escondê-lo aos olhos da lei. Então, pode ser que alguns outros casos existam e ainda não tenham sido identifica­dos oficialmen­te pela Funai”, declarou em nota.

Questionad­a sobre o que tem feito para evitar as ilegalidad­es, a Funai disse que tem procurado enfrentar essas situações para retirar os produtores externos das terras. Nos casos em que os povos indígenas manifestam interesse em continuar produzindo o que quer que seja, a fundação declarou que “tem organizado processos de transição que possam contribuir para que os povos indígenas se apropriem das técnicas e se capitalize­m” para seguirem independen­tes.

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