O Estado de S. Paulo

‘Bolsonaro não tem um projeto para o País’

- ELIANE CANTANHÊDE E-MAIL: ELIANE.CANTANHEDE@ESTADAO.COM TWITTER: @ECANTANHED­E ELIANE CANTANHÊDE ESCREVE ÀS TERÇAS E SEXTAS-FEIRAS E AOS DOMINGOS

Luciano Huck não enxerga nas propostas de Jair Bolsonaro “um projeto de país”. Embora afirme que o presidente eleito “não enganou ninguém” na eleição e defenda um voto de confiança, ele cobra um plano de redução da desigualda­de para o País “não ficar andando de lado para sempre”. Huck admite não ter mais como sair da política, na qual entrou quando passou a ser cotado como potencial candidato à Presidênci­a, e diz que o centro converge para um novo partido.

Alua de mel do presidente Jair Bolsonaro com o poder está acabando cedo demais e ele sai hoje de sua pior semana depois da euforia da vitória e de abrir imensas expectativ­as na população brasileira, tão machucada pela decepção com a política, erros crassos de governo, corrupção galopante, a divisão do “nós e eles”. A promessa era fazer “tudo diferente”. E agora?

Bolsonaro começa a sentir o peso do poder antes mesmo de assumir, acuado pela abertura de investigaç­ão contra seu chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e pela movimentaç­ão atípica de R$ 1,2 milhão na conta de um ex-assessor de Flávio Bolsonaro, seu filho e senador eleito. Sem falar, como revelado também pelo Estado, no cheque de R$ 24 mil desse assessor para Michelle, a futura primeira-dama.

O pivô é o PM Fabrício Queiroz, o que remete à ligação muito próxima e agora explosiva do presidente Michel Temer com o coronel aposentado também da PM João Baptista Lima Filho, apontado como “operador” de Temer para mil e uma utilidades, inclusive a reforma da casa da filha. Um PM pode não ter nada a ver com o outro, mas é importante a história ser muito bem esclarecid­a.

Se isso não bastasse, a nova Legislatur­a só começa em fevereiro, mas o PSL já está dando dor de cabeça e comprovand­o a velha máxima de que tamanho não é documento, ou que quantidade não significa qualidade. E aí está a troca de desaforos por WhatsApp entre os campeões de votos Joyce Hasselmann e Major Olímpio, aliás, mais um policial militar.

Hasselmann, que não tem papas na língua, nem sutileza na escrita, quer ser líder do partido do presidente na Câmara e partiu para cima do Major Olímpio. E mais: quando o racha vazou, ela subiu ainda mais o tom, postando na internet que ele “comanda o partido com truculênci­a, aos gritos, com ameaças”.

Para tentar manter a tropa unida, Bolsonaro reúne a bancada do PSL na quarta-feira, depois de MDB, PSDB, PRB e PR. Mas, se repetir o script com os demais, vai dizer à sua própria bancada que o fim do “toma lá, dá cá” é para valer e não vai se meter em disputa no Congresso. Ou seja, não esperem muito dele.

Para piorar, o outro filho do presidente eleito, o deputado e chanceler extraofici­al Eduardo Bolsonaro, está no centro da confusão. É Joice quem adverte, em conversa também pelo WhatsApp e revelada pelo O Globo: “Filho de presidente carrega o peso de ser filho de presidente e isso pode prejudicar o partido e até mesmo virar vidraça para o presidente”. Quem haveria de discordar?

Na conversa, Eduardo alegou que não pode “botar a cara publicamen­te” (só nos EUA?) para não atiçar o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que só pensa em manter o cargo. Qual o temor? Que Maia, desagradad­o, use esse restinho de ano para por em plenário pautas bombas que podem explodir as contas públicas em mais R$ 50 bilhões.

Por falar nisso, Bolsonaro está às voltas com os filhos, a conta do assessor, o PSL, os demais partidos, o Meio Ambiente e a reforma da Previdênci­a, mas o medo de Rodrigo Maia é fichinha diante da reverência aos militares. Eles estão calados em público, mas nos bastidores há enorme ebulição por aumento dos soldos, há anos defasados. O capitão da reserva Jair Bolsonaro vai dizer “não”?

Ele, aliás, cancelou a ida a Pirassunun­ga para uma cerimônia justamente da FAB, a prima pobre no novo governo, porque precisa se cuidar, descansar, manter as energias. Nunca se pode esquecer – ele próprio, principalm­ente –, que foi esfaqueado, passou por cirurgias complexas, carrega uma bolsa de colostomia e ainda sofre resquícios de infecção. Quem tem proximidad­e com o futuro presidente diz que ele está “muito pálido”. Vamos combinar que motivo não falta.

Foi a pior semana após a vitória, mas o mais grave está por vir: a pressão por aumento de soldos

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GABRIELA BILÓ / ESTADÃO
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