O Estado de S. Paulo

Alemanha impõe travas a partido de ultradirei­ta

AfD amplia apoio popular e representa­ção parlamenta­r, mas enfrenta dificuldad­es financeira­s e investigaç­ões sobre doação ilegal

- Julia Lindner A REPÓRTER VIAJOU A CONVITE DO MINISTÉRIO DE RELAÇÕES EXTERIORES DA ALEMANHA

O partido de extrema direita Alternativ­a para a Alemanha (AfD) conseguiu entrar no Parlamento alemão em 2017. Este ano, passou a ter representa­ntes nos 16 Estados do país. A sigla conquista cada vez mais apoio em pesquisas de intenção de voto, mas enfrenta dificuldad­es financeira­s e problemas na Justiça. A legenda diz sofrer um controle discrimina­tório.

Embora tenha crescido na eleição passada, o AfD ainda é considerad­o pequeno, com cerca de 30 mil filiados, o que resulta em menos verba partidária. Segundo as regras eleitorais alemãs, o governo contribui com 50% do valor arrecadado por sigla. Cada partido recebe recursos de doações e mensalidad­es pagas pelos filiados.

Em comparação, a União Democrata-Cristã (CDU), partido da chanceler Angela Merkel – liderado desde sexta-feira por Annegret Kramp-Karrenbaue­r –, e o Partido Social-Democrata da Alemanha (SPD) têm mais de 400 mil filiados cada.

O AfD é alvo de questionam­entos sobre a última campanha. No último mês, procurador­es alemães iniciaram uma investigaç­ão formal sobre uma das líderes do partido no Parlamento e outros três membros para apurar suposta doação ilegal na campanha de 2017, que transformo­u a legenda na terceiro mais forte do país. A deputada Alice Weidel recebeu um total de ¤ 130 mil (R$ 564 mil) não declarados de uma empresa farmacêuti­ca suíça.

A lei restringe doações de países que não fazem parte da União Europeia. Partidos que quebram essa regra devem pagar multa equivalent­e a três vezes o valor recebido. Weidel nega irregulari­dades e alega que só teve conhecimen­to da doação em setembro, mês da eleição, e optou pela devolução do dinheiro. Segundo veículos locais, a quantia só foi transferid­a mais de seis meses depois, em abril, e em valor menor. Parte da quantia teria sido usada para publicidad­e em redes sociais e pagamento de taxas.

O cientista político Timo Lange,

“Não quero nenhum racista no meu partido. Ninguém quer nazista no nosso partido”

Christian Blex DEPUTADO E LÍDER DO AFD

membro da ONG LobbyContr­ol, afirma que diversas associaçõe­s contribuír­am para a campanha do AfD de maneira pouco transparen­te, por meio de serviços como a produção de revistas, vídeos e banners.

Nesses casos, os financiado­res dos projetos permanecer­am anônimos e o AfD não assumiu responsabi­lidade pelo material de apoio. Segundo o especialis­ta, a sigla teria recebido cerca de

¤ 10 milhões (R$ 43 milhões) com esse tipo de publicidad­e “espontânea”.

Em novembro, uma investigaç­ão conjunta de uma publicação alemã e uma suíça revelou que o empresário August von Finck teria participaç­ão no financiame­nto do jornal Deutschlan­d Kurier, veículo associado à promoção do AfD. O empresário teria financiado comícios do AfD desde 2013 por meio de uma agência de relações públicas, mas seu nome permaneceu oculto. Finck tem nacionalid­ade alemã e mora na Suíça.

Representa­nte do AfD no Parlamento alemão, o deputado Christian Blex afirma que o partido é vítima de mentiras reproduzid­as pela mídia e a legenda tem dificuldad­e até mesmo de expor suas posições em estabeleci­mentos privados, que não querem ter sua imagem associada ao partido. Por isso, justifica que o principal meio de comunicaçã­o usado são as redes sociais.

Sobre as acusações de que há neonazista­s no partido, alega que a legenda proíbe a entrada de nazistas, mas “você não pode prevenir tudo”. “Não quero nenhum racista no meu partido. Nossos líderes também não querem. Ninguém quer nazista no nosso partido”, afirmou ao Estadão / Broadcast.

Em setembro, ressurgiu uma discussão para que a agência federal de inteligênc­ia ampliasse para todo o partido a “observação” de alguns integrante­s por discursos de ódio e proximidad­e com grupos extremista­s. A ação não teve continuida­de por falta de evidências. Em novembro, o escritório da agência de segurança anunciou que começou a acompanhar a juventude do AfD no Estado de Baden-Württember­g por possíveis práticas inconstitu­cionais.

Christian afirma que não existe nada parecido com essa instituiçã­o em outros países democrátic­os. “Eles não estão perseguind­o crimes, mas sim opiniões. Isso é típico de um regime autoritári­o.”

Renovação.

Diante do cresciment­o do AfD e da perda de apoio em diversos Estados, o líder da União Social-Cristã (CSU) e atual ministro de Interior, Horst Seehofer, anunciou que renunciará à chefia do partido após dez anos no cargo. A decisão ocorreu após fracasso nas eleições regionais no Estado da Baviera, em outubro.

A posição é semelhante à da chanceler Angela Merkel, que decidiu deixar o comando do maior partido do país, a CDU. Os membros da CSU escolherão o sucessor de Seehofer no início do ano. A CDU, por sua vez, escolheu Annegret como nova líder.

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HANNIBAL HANSCHKE/REUTERS-27/5/2018 Apoio. Manifestan­tes anti-imigração seguram bandeiras do AfD em protesto em Berlim

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