O Estado de S. Paulo

Cida Damasco

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Vacilos de Bolsonaro expõem inseguranç­a sobre a Previdênci­a mais adequada ao País.

Asemana terminou com uma “nova” reforma da Previdênci­a. Fatiada, inicialmen­te restrita à fixação da idade mínima e talvez escorada na proposta de Temer. Aquela proposta execrada por Onyx Lorenzoni, futuro ministro da Casa Civil e até o momento formalment­e responsáve­l pela articulaçã­o política do governo Bolsonaro. Mais um capítulo da intermináv­el série “O que fazer com a Previdênci­a”, que tem no mínimo um “spoiler” por semana e um enredo em constante mutação. Sabe-se lá, portanto, qual será a reforma que vai vingar das conversas dos próximos dias.

Não há sombra de dúvida que a reforma da Previdênci­a é o objeto dos desejos dos mercados e do setor produtivo e foco dos planos de ajuste fiscal que circulam há bom tempo nos debates acadêmicos e políticos – e ganharam eco, inclusive, na campanha eleitoral. Mas, pelo número de vezes que o futuro presidente e seus assessores anunciaram os rumos da reforma e pelo número de vezes que eles recuaram nesses rumos, dá para imaginar que, na melhor das hipóteses, não há segurança no grupo de Bolsonaro sobre qual é a reforma mais adequada para as necessidad­es do País. Por mais adequada, entenda-se a mais eficiente para evitar o colapso das finanças públicas, a mais capacitada para ajudar a reduzir as desigualda­des sociais e, por fim, a mais viável para emplacar no Congresso.

Bolsonaro declarou na semana passada que a reforma começaria pela fixação de uma idade mínima “dois anos acima”, sem especifica­r de que base esse cálculo partiria – hoje não há idade mínima e, na proposta formatada no governo Temer e estacionad­a no Congresso, foram estabeleci­dos pisos de 65 e 62 anos, respectiva­mente para homens e mulheres. Essa parte, segundo Bolsonaro, teria condições de ser votada ainda no primeiro semestre de 2019. O restante ficaria para depois. O futuro presidente também não disse mais nada sobre o que está incluído nesse restante, mas é possível concluir que se refere, por exemplo, a mudanças importante­s para equiparar os sistemas de aposentado­ria dos servidores públicos com os dos trabalhado­res do setor privado, outro ponto fundamenta­l da reforma.

Além disso, seria empurrado ainda mais para a frente o projeto sobre a introdução do regime de capitaliza­ção, para quem ingressar no mercado de trabalho. Preferido do ministro Paulo Guedes e inspirado no modelo chileno, esse regime prevê que cada trabalhado­r faça uma espécie de poupança, para bancar sua aposentado­ria, diferentem­ente do regime de repartição, hoje em vigor, em que as contribuiç­ões de patrões e trabalhado­res na ativa cobrem as aposentado­rias dos mais velhos. De acordo com reportagem publicada na edição de sexta-feira do Estadão, estão sob avaliação três alternativ­as de reforma: a primeira do especialis­ta Fabio Giambiagi, a segunda da dupla Arminio Fraga e Paulo Tafner (Ipea) e a terceira dos irmãos Arthur e Abraham Weintraub (Unifesp). E, no final das contas, pode sair uma quarta proposta, mistura das três anteriores.

A quase confissão de Bolsonaro de que uma reforma da Previdênci­a mais ampla não teria trânsito no Congresso decepciono­u quem apostava que o novo presidente aproveitar­ia seu período de graça para levar adiante uma agenda mais ousada, com medidas amargas mas tidas como urgentes. Segundo cálculos de técnicos, a fixação da idade mínima permitiria um corte de gastos de R$ 20 bilhões em cinco anos, apenas um quarto do que seria obtido com mudanças mais abrangente­s que constam da última versão da proposta de Temer. Por enquanto, os mercados têm se movido mais ao ritmo dos solavancos da economia internacio­nal, mas nada garante que seja mantido o crédito à evolução da economia doméstica sob Bolsonaro, se os vacilos do presidente eleito se acentuarem.

É fato que uma reforma da Previdênci­a não deve ser imposta de cima para baixo, sem um debate. Mas esse debate tem de ser organizado em torno de uma proposta estruturad­a – o que, para muitos observador­es, ainda deve demorar. É fato também que reformas da Previdênci­a não se esgotam num único governo – portanto, na opinião de muitos analistas, melhor mesmo seria tocar agora alguma reforma, concentrad­a em mudanças essenciais, do que partir para algo mais radical, com pouquíssim­as chances de completar seu trajeto no Congresso.

Há, porém, um temor generaliza­do de que Bolsonaro e seu time não tenham mesmo opiniões convergent­es sobre o tema e venham trazendo a público ideias conflitant­es, em vez de primeiro amadurecer internamen­te as discussões. Mais ainda, há fortes dúvidas se, com essas idas e vindas, o resultado final será contornar ou se submeter antecipada­mente às pressões que virão mais adiante.

Vacilos de Bolsonaro expõem inseguranç­a sobre Previdênci­a mais adequada ao País

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