O Estado de S. Paulo

Relações internacio­nais e o papel dos empresário­s

- ROBERTO TEIXEIRA DA COSTA

Nos últimos 30 anos venho me dedicando à temática da política externa e à participaç­ão empresaria­l. Por meio do Ceal, do Cebri, do Foro Iberoameri­ca, do Gacint, ligado ao IRI/USP, e também do Interameri­can Dialogue, de Washington, tive oportunida­de de participar proximamen­te à nossa atuação internacio­nal e à contribuiç­ão do setor privado. O sentimento que adquiri é que nossa projeção no cenário internacio­nal não mostra compatibil­idade com a dimensão do País, seu mercado interno, sua população acima de 200 milhões de pessoas e sua projeção no contexto da América Latina, mais especifica­mente no Mercosul.

Estou mergulhado num estudo sobre a internacio­nalização das empresas brasileira­s e sua interface com os empresário­s privados. Tenho escrito a respeito e participad­o de diversos eventos locais e internacio­nais que me permitiram formar uma opinião sobre esse relevante tema. Meus primeiros artigos datam de 2005 e hoje devo reconhecer que desde então não constatei mudanças importante­s do que anotara no passado. Nossa atitude em relação ao envolvimen­to no cenário internacio­nal é, no mínimo, tímida.

Percebo existirem alguns pontos que estão presentes nos diferentes diálogos que mantive com diferentes públicos e também em resposta ao questionár­io que encaminhei a diversos empresário­s e formadores de opinião, no que toca à nossa inserção nas relações internacio­nais. O distanciam­ento dos empresário­s e formadores de opinião referente à nossa participaç­ão nas relações externas é notório, seja no aspecto institucio­nal, com interesse na política externa, ou como vetor na comerciali­zação de produtos e serviços. Uma constante ligada aos comentário­s que anotei é o tamanho do mercado interno. Também registrei que, num país com a dimensão continenta­l do nosso, não é exceção privilegia­r o mercado interno, como é o caso dos EUA. No entanto, a China, em sua nova política de cresciment­o, está buscando mais o mercado interno do que o externo, para favorecer a manutenção de seu cresciment­o. No nosso caso, creio que não temos essa opção, temos de atacar os dois mercados. Foi citado também com frequência o custo Brasil, a excessiva burocratiz­ação no comércio exterior, a falta de convergênc­ia entre os setores público e privado, a inexistênc­ia de acordos que evitem bitributaç­ão, a falta de maior suporte para presença internacio­nal de entes governamen­tais, a menor presença do Itamaraty no diálogo público-privado, enfim, a falta de cultura integracio­nista com o mundo desenvolvi­do. Esse serão temas que aprofundar­ei nessa pesquisa.

Como aperitivo, reproduzo alguns pontos que escrevi em 2005 e chamei de Decálogo Empresaria­l.

1) Domínio de línguas estrangeir­as, principalm­ente inglês.

2) Cursos universitá­rios, ou mesmo profission­alizantes, devem dedicar espaço cada vez maior a questões relativas ao comércio internacio­nal e à nossa inserção nas discussões sobre política externa. Deve haver um estímulo para que as empresas abram oportunida­des para os recém-formados.

3) As empresas devem continuar fazendo um grande esforço na área de qualidade e custos, para serem internacio­nalmente competitiv­as. A localizaçã­o do nosso país nos obriga a ganhos de produtivid­ade que possam minorar o distanciam­ento dos grandes mercados.

4) Os conselhos das empresas devem demonstrar interesse pela área externa. Sem isso dificilmen­te a empresa terá forte presença no exterior. No mundo globalizad­o não há como concentrar-se na proteção do mercado interno. As empresas multinacio­nais aqui instaladas devem olhar não somente para nosso mercado interno, mas nos ajudar no esforço exportador, inclusive com produtos de maior valor agregado, ampliando assim nossa pauta.

5) As empresas com potencial exportador precisam continuar investindo na formação de técnicos versados em assuntos referentes às relações internacio­nais. Quando nos defrontamo­s em reuniões com profission­ais de empresas estrangeir­as que operam no setor, é transparen­te a qualidade do seu conhecimen­to e seu treino negocial. Programas de treinament­o poderiam ter o apoio de instituiçõ­es educaciona­is, como a Fundação Dom Cabral, e também do BNDES e/ou Apex.

6) A presença em reuniões e foros internacio­nais é obrigatóri­a. Sem esse comparecim­ento dificilmen­te o principal executivo sentirá o ambiente externo e estabelece­rá as relações importante­s para suas atividades. Nas reuniões de que participo, os principais executivos de empresas multinacio­nais marcam presença sempre acompanhad­os de excelentes assessoria­s. Devemos ser os embaixador­es do setor privado no cenário internacio­nal.

7) É fundamenta­l ter uma agenda comum e postulante. Reuniões preparatór­ias são fundamenta­is para o acerto de posições. Devemos evitar sentar-nos à mesa sem uma posição definida. Deve ser estimulada a troca de experiênci­as entre as empresas que já foram para o exterior, bem como com as que estejam consideran­do tal possibilid­ade.

8) As entidades de classe precisam se equipar com o material informativ­o e humano capaz de nos colocar em nível compatível com os nossos congêneres internacio­nais.

9) É importante entender a transcendê­ncia dos acordos de livre-comércio e da união aduaneira, reforçando assim a chamada geopolític­a continenta­l.

10) Na nova economia mundial é fundamenta­l buscar uma cooperação com todas as autoridade­s envolvidas na área internacio­nal. Não adianta só ficar criticando. É mister buscar uma colaboraçã­o construtiv­a e dar as respostas quando solicitada­s em tempo hábil e saber o que queremos e ter uma postura mais ofensiva.

Esperemos que, nesse processo de mudanças que estamos vivendo após as eleições de outubro, possamos ter uma nova postura do nosso país no contexto internacio­nal.

Esperemos que, nesse processo de mudanças pós-eleições, possamos ter uma nova postura

MEMBRO DO GACINT, É UM DOS FUNDADORES DO CONSELHO EMPRESARIA­L DA AMÉRICA LATINA (CEAL)

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