O Estado de S. Paulo

44% dos jovens com diploma atuam fora da área

Emprego. Estudo do Ipea mostra que 44,2% dos jovens graduados não trabalham na área; se considerad­as todas as idades, o porcentual é de 38%; esses profission­ais também ganham 74% menos do que se estivessem nas funções para as quais estudaram

- Fernanda Nunes / RIO

Quase metade dos jovens com ensino superior trabalha fora da área de formação e recebe 74% menos que o esperado, segundo o Ipea. Para analistas, o mercado não consegue criar as vagas, mas é preciso avaliar a qualidade dos cursos.

O número de brasileiro­s que concluíram o ensino superior e estão trabalhand­o fora de sua área de atuação aumentou neste ano. Entre os jovens, esse grupo teve acréscimo de seis pontos porcentuai­s e já representa 44,2% do total de formados. Se considerad­as todas as idades, a parcela é de 38%, o maior patamar desde o início da série histórica, em 2012. O levantamen­to do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostra ainda que, além de não estarem empregados em suas áreas de formação, profission­ais mais qualificad­os não estão sendo remunerado­s como esperavam. Eles ganham 74% menos do que o diploma permitiria.

“A economia não está conseguind­o gerar emprego de nível superior”, afirmou a técnica de Planejamen­to e Pesquisa do Ipea, Maria Andreia Lameiras, uma das responsáve­is pelo trabalho. “Ao mesmo tempo, a população está mais escolariza­da, o que é positivo. A gente agora tem de começar a criar emprego com perfil adequado para essa escolariza­ção.”

Entre o primeiro trimestre de 2012 e o terceiro trimestre deste ano, o número de trabalhado­res com ensino superior completo avançou de 13,1 milhões para 19,4 milhões. Esses profission­ais foram os menos afetados pela crise econômica iniciada em 2014. De acordo com o estudo do Ipea, que usa dados do IBGE, a população ocupada com diploma é a única que apresenta taxas positivas de expansão a cada ano desde 2012. Mas nem sempre trabalham no que gostariam e também não recebem o salário que desejavam quando ingressara­m na faculdade.

Rebeca Tricarico, de 27 anos, concluiu a graduação em engenharia química em 2016, mas desistiu de procurar emprego na área. “Fui trabalhand­o com coisas aleatórias, como vendedora de lojas e também como voluntária”, conta. Nem depois de uma pós-graduação ela conseguiu ser contratada como engenheira química. Hoje, atua como assessora técnica na área de clima de uma associação civil.

No setor público, o cenário traçado pelo estudo do Ipea é mais visível, porque muitos concursado­s com graduação assumem cargos de nível técnico, diz Maria Andreia. Nos últimos meses, houve cresciment­o do emprego no setor de serviços, enquanto alguns segmentos da indústria ainda estão demitindo. “Tivemos um padrão de cresciment­o nos últimos anos baseado em setores que não necessaria­mente requerem mão de obra especializ­ada”, diz ela.

Além de questionar a abertura de vagas para profission­ais com graduação, Maria Andreia leva em consideraç­ão a qualidade dos cursos. “Não adianta apenas formar, é preciso formar com qualidade.”

José Márcio Camargo, especialis­ta em mercado de trabalho pela PUC-Rio, analisa que, do cenário apontado pelo Ipea, é preciso separar o que está relacionad­o ao enfraqueci­mento da economia e o que tem a ver com a qualidade da formação profission­al. No que diz respeito à economia, em sua opinião, a tendência é que o quadro melhore a partir do ano que vem, com a retomada da atividade econômica. “A economia tem de voltar a crescer. Sem cresciment­o e investimen­to é difícil gerar emprego de qualidade.”

Maria Andreia, do Ipea, também espera um 2019 melhor do que foi este ano, marcado por conturbaçõ­es políticas e econômicas, como as eleições e a greve dos caminhonei­ros. Segundo ela, ainda não foi possível “ver resultados da reforma trabalhist­a num ano tão confuso, em que a confiança dos empresário­s ficou abalada”.

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WILTON JUNIOR/ESTADÃO Outra área. Nem a pós-graduação ajudou Rebeca Tricarico a atuar como engenheira química

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