Morre quinta vítima; em diário, atirador cita perseguição.
Pernambucano Heleno Alves tinha 84 anos; polícia apreendeu anotações em que autor do ataque menciona outros massacres
Morreu ontem a quinta vítima do ataque a tiros na Catederal de Campinas, o aposentado pernambucano Heleno Severo Alves, de 84 anos. O atirador, Euler Fernando Grandolpho, de 49 anos, vivia recluso, reclamava de vizinhos e teria mania de perseguição, segundo apurou até agora a Polícia Civil. Em anotações pessoais do atirador apreendidas pelos investigadores, há ainda referências ao massacre de Realengo, em 2011, no Rio, e à chacina em Fortaleza neste ano.
A dona de casa Damiana Alves, de 76 anos, não se conforma com a morte do marido, o ex-pedreiro Heleno Alves, na chacina. “Logo cedo, ele pegou o rosário, o livro de orações e disse que ia rezar, mas perdeu o circular. Falei que era para não ir, que tem coisa que vem por bem, é um aviso.”
Damiana conta que estava vendo TV quando ouviu falar da tragédia. “Quando puseram as imagens, já vi meu marido caído. No dia 25, íamos fazer 63 anos de casados. Criamos 9 filhos e temos 24 netos e 18 bisnetos. O que pediam, ele fazia.” A família vive em Indaiatuba, na região de Campinas.
O também aposentado José Eudes Ferreira, de 68 anos, e sua mulher Maria de Fátima, de 63, visitam a catedral todo mês. “Sacavam o dinheiro (da aposentadoria) e passavam na igreja para agradecer. Dessa vez, fizeram diferente: foram à igreja primeiro”, contou o genro Donizeti Soares, de 61 anos.
Ferreira foi sepultado ontem. Maria de Fátima acabou baleada na coxa. Abatida e chorando, conseguiu ir ao velório de cadeira de rodas. “Deve voltar ao hospital. Os médicos vão decidir quando operam”, disse o genro.
“O templo de Deus foi duplamente violado. Sim, templo sagrado que é a pessoa humana, ferida de morte como foi. E o templo sagrado desta igreja, nossa Catedral, que se tornou cenário de violência. Hoje estamos aqui em grande número para suplicar a Deus perdão, misericórdia, paz e manifestarmos uns aos outros a solidariedade de nossas orações”.
Perseguição. Grandolpho morava em um condomínio de alto padrão em Valinhos, cidade vizinha à Campinas. Vivia com o pai, responsável por sustentar o filho, que estava sem emprego.
O Estado foi ao local na tarde de ontem, mas um segurança disse que a família havia deixado a casa desde a noite anterior. Anteontem, a policia apreendeu um celular, um notebook e um bloquinho e anotações de Grandolpho.
Em um dos papéis, ele escreveu: “Passei com meu cão em frente uma construção ao lado da casa q os moradores têm
Monsenhor Rafael Capelato
CELEBRANTE DA MISSA ONTEM NA
CATEDRAL, EM HOMENAGEM ÀS VÍTIMAS
uma veterinária e uma delas gritou com ‘as paredes’: ‘E aí Ceará’, sobre o massacre dias atrás. Hj (sic), 31/1/18, passei por lá e falei alto com o celular desligado na orelha: E aí Realengo’.” Diz também que “viados” estariam “ouvindo minha casa” e o perseguindo havia mais de dez anos. “No começo cometiam crimes com a maior naturalidade. Agora estão em pânico, espalharam pela cidade o q (sic) está preste a acontecer.”
Segundo José Henrique Ventura, delegado do Departamento de Polícia Judiciária São Paulo Interior 2 de Campinas, “uma primeira avaliação indica que as anotações são desconexas”. “Por enquanto, não há nada que possa indicar o motivo do ataque”.
Investigações apontam que Grandolpho era “solitário”, “introspectivo” e tinha mania de perseguição. Desde 2008, registrou uma série de boletins de ocorrência. Em alguns, disse ter sido seguido por carros. Em outro, alegou que um desconhecido tentou derrubá-lo da bicicleta. Nos BOs, declarava profissões diferentes. Em 2008, era mecânico. Em 2011, publicitário. Em 2012, estudante.”
“Ficava muito tempo recolhido, saía pouco, e não tinha muitas relações com amigos ou namorada”, disse Ventura. No celular encontrado na igreja, a maioria das discagens era para o 190, da PM. Conforme a polícia, ele ligava para reclamar de barulhos dos vizinhos.
Em seu perfil no Facebook, tinha só oito amigos e parentes eram impedidos de entrar no quarto dele. Estava sem emprego desde 2014, quando pediu exoneração do Ministério Público Estadual, onde era auxiliar de promotoria de Carapicuíba, na Grande São Paulo, Grandolpho vivia do dinheiro do pai. Para investigadores, parentes disseram que ele teria depressão e havia passado por um Centro de Atendimento Psicossocial (Caps). “Não sabemos ainda se foi para consulta ou tratamento”, disse Ventura.
A Polícia Civil ainda investiga a origem da arma usada no atentado. As munições de calibre 9 mm deflagradas seriam antigas e não constaria o número do lote nos projéteis. Grandolpho não tinha porte ou posse de arma autorizado pelas Forças Armadas ou pela Polícia Federal. A principal suspeita é de que a pistola tenha sido roubada de algum colecionador ou praticante de tiro esportivo e depois repassada ao atirador. “A família ficou surpresa em saber que ele tinha arma”, disse Ventura.
Enterro. Seguranças impediram a entrada de curiosos no sepultamento do atirador ontem à tarde. Parentes próximos não falaram com a imprensa. “Todos foram pegos de surpresa”, disse uma tia. Ele ficou mais recluso após perder a mãe e um irmão, de acordo com a mulher.